AD SENSE

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Kikito - o "deus do bom humor" acordou azedo


Imagem: Institucional Prefeitura de Gramado

Eu digo a vocês, respondeu ele; se eles se calarem, as pedras clamarão.... Lucas 19:40.

"Então falou Deus todas estas palavras, dizendo:

Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão.

Não terás outros deuses diante de mim.

Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.

Não te encurvarás a elas nem as servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos, até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam.

E faço misericórdia a milhares dos que me amam e aos que guardam os meus mandamentos."

Êxodo 20:1-6

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Eu conheci, e convivi com Elisabeth Rosenfeld, e estive próximo à ela nos dias em que modelou o primeiro "Kikito", uma peça moldada com uma mistura de cimento Portland, com cimento branco, sobre uma armação de ferro de construção e arames retorcidos. Este é o conteúdo da divindade, e de ferro e calcário é todo o seu ventre e coração. Nada mais.


Já sua alma, essa sim, é retratada pela efígie de um sol no lugar da cabeça, que lembra o deus romano "janus" (daí o nome do mês de Janeiro, que tem uma face voltada para o passado e outra para o futuro)., sobre um corpo humano feminino, mas ao objeto foi dado um nome masculino, e uma identidade exclusiva de pessoa dotada com alegria, caracterizada pelo permanente sorriso em ambas as faces. 


Desta forma, não foi dada ao Kikito, a possibilidade de resignar-se diante das variáveis da vida, e em algum momento de reflexão, chorar por quem dobram os sinos. Nasceu assim o primeiro "deus" sem vontade própria, pois até mesmo as divindades dos panteões pagãos pelo mundo afora, são dotadas de humores, que variam da bondade, à extrema crueldade.

O "deus do bom humor" de Elisabeth era um objeto para enfeitar um jardim, assim como os anões de porcelana, ou o velho carrinho de mão com flores plantadas dentro dele.

Elisabeth já não existe mais, e até mesmo suas lembranças se dissipam na memória dos que adentram os anos pela vida afora, ao encontro do descanso que não deixa ninguém à espera. Quando tiver que chegar, ele vai chegar. Menos pro "Kikito", o "deus da boa fama" que Gramado venera.


Ao longo dos anos, semelhante à outro personagem da mitologia, isto é, a ciência do imaginário, da mentira bem contada, o Rei Midas, que transformava em ouro tudo em que tocava, e que teve por consequência ver sua própria filha transformada em uma estátua de ouro 18k, de pureza 99,999, Gramado também soube beneficiar-se dos poderes "divinos" do "Kikito", e a velha estátua mal desenhada, com coração ausente, e fez cintilar com abundância, as ruas e casas de um Olimpo serrano, cujos deuses se esbofeteiam pelo privilégio do primeiro devoto de cada manhã, e se refestelam, ao entardecer, pelo visco da baba que escorre por suas sarjetas, destinadas à abençoarem as águas dos arroios que levam todos os dejetos devolvidos pelas bênçãos gastronômicas aos devotos da divindade que sorri, ao profundo e misterioso mar das vaidades.


O "deus do bom humor", no entanto, tornou-se um deus infeliz, pois o "smile", precursor dos "emojis", que sempre sorri, e apenas sorri, hoje continua a sorrir, ainda que não se saiba a razão, quando seu trono foi derribado (não, eu não errei, é deribado mesmo, com "I") à outro ser coroado, que não tem boca para sorrir, mas tirou o sorriso de milhões de pessoas, cujos lábios finos do "kikito" não foram capazes de salvar.

O "deus do bom humor" tomou lugar de destaque diante do Pavilhão Nacional de primeira ordem, no dia em que é celebrada, com dor e descaso, a independência da nação, cujo D-s, é "O Senhor", e ainda que retirando a divina ordem de não celebrar culto, nem prestar louvor à deuses estranhos, continua sorrindo, ou talvez rindo, da credulidade vazia de quem se estriba nele para alcançar sucesso.


O "deus do bom humor" acordou azedo, mas não mal amado, posto que em sua homenagem se erguem panteões e monumentos, e que à entrada do grande templo a céu aberto em seu louvor, ladeiam as bandeiras da pátria e da cidade, demarcando para as gerações que talvez virão, que este lugar é mais que um conglomerado de pessoas vivas, mas é a terra do berço de um deus que nasceu morto, mas ainda assim sorri.

Não é exagero, mas eu mesmo já vi uma pessoa rezando diante de uma dessas estátuas, que ficava defronte ao Palácio dos Festivais, à época, chamado de Cine Embaixador. Fiquei escandalizado com a cena. 

Ai, pobre de mim, se soubesse , que aquele símbolo fosse se tornar a pedra de tropeço do portal que abre as bênçãos prometidas aos que guardem as orientações do Decálogo, que falam de honrar os pais, respeitar a propriedade alheia, não macular o leito de outra pessoa, não produzir "fake news, não misturar água com açúcar no vinho, não exagerar na verdade, mas como conhecerão todas estas Leis, se já à primeira, que faz reconhecer que O Criador do Universo seja louvado por uma estátua que se ri?

Haverá um dia, num longínquo futuro, onde arqueólogos encontrarão suas estátuas junto à outras e concluirão que houve uma civilização, com suntuosos palácios, que adorava um deus que sorridente, era chamado de "Kikito".





sexta-feira, 4 de setembro de 2020

As histórias que vivemos, mas só contamos depois

 




História é a parte do tempo que está guardado nas lembranças: nossas e de alguém.

História é o que aconteceu, nunca o que acontece, nem vai acontecer.

História é a parte de nossa vida que guardamos para deixar de testemunha das nossas dores. É o presente escondido para tornar-se vivo no futuro, ao falar do passado.

Nossas dores não as contamos enquanto doem. Isso nos humilha, nos rebaixa. Nos reduz à fracos, a covardes.  Retrata nossa insignificância e nossa pequenez, que em lugar de lutarmos, transferimos a outrem a nossa amargura presente.

Daí perguntar-se: Como vai? E mecanicamente responder: Vou bem!
Mas não vou bem,eu, e nem você se interessa em saber como eu vou. Já tem suas dores, suas amarguras suas frustrações, seus próprios tropeços para levantar-se.

Ninguém está preparado para ouvir nossas frustrações, porque dessa forma, fica na obrigação de devolver-nos a confiança e contar as suas, desnudar a fraqueza, e arrepender-se amargamente depois.

É perigoso confiar, e mais perigoso ainda receber confiança. 
Nos tornamos responsáveis pelos segredos de alguém, e isso é tremendo. 

Não choramos no momento da dor diante dos outros, mas guardamos o choro para contar depois, como história, como testemunho. Mas de que adianta não chorar, se nossos olhos contam outra coisa sobre o que dizem os nossos lábios?

Nos envergonhamos pelo momento de fraqueza, mas nos orgulhamos por tê-lo atravessado, quando estamos longe dele. O tempo é nosso aliado, mas às vezes o tempo é também nosso algoz.

Quão bom seria se pudéssemos acelerar a vida durante a dor, e retardar durante o prazer.

]Quão bom seria que nada nunca doesse. Mas dói, e dor é dor, onde cada um conhece a intensidade da sua. Dor não se compara,e muito menos se atenua comparando à dor alheia.

Saber que crianças morrem de fome na Etiópia, é triste demais. Saber que aquilo que você sente nesse exato momento, mas sente-se agora constrangido por saber que há outras dores, é triste igual, pois não bastasse sua dor, há agora a dor adventícia, impregnada, impondo uma culpa que você não tem, e você perde a coragem de externar aquilo que lhe faz sofrer.

Por isso, não é bom contar sobre seu sofrimento no exato momento em que sofre. Deixe pra depois. Deixa pra contar numa ocasião em que possa rir daquilo que lhe fez chorar. Escondido.

Ad histórias que contamos muito tempo depois que se passaram, tornam-se quase fábulas, memórias românticas, tema de um bom livro de aventuras, onde você passa de frouxo a herói, e a diferença é o tempo de hibernação, de sedimentação, de fermentação, de maturação, ainda que seja em meio à dor.

Agora, o que dói, deixe doer. É apenas dor, posto que depois da dor vem o silêncio, de quem sentiu dor, e do vazio de quem ficou.

Seja o que for que aperta o peito, segure firme. É mantimento para sua própria história, que alguém um dia vai contar.






O que pensa o eleitor, e o que pensar do eleitor?

Imagem: Nenhum candidato foi mauito massacrado neste ensaio.

O eleitor é um indivíduo sinistro. Sei por mim, pois eu sou eleitor. Não que eu seja, assim, um eleitor profissional, não, não sou. Sou amador nesse negócio de escolher pessoas, e posso provar o que digo, de tanta furada em que já me meti, elegendo cada tipo, que dá vergonha só de pensar. 

Mesmo assim, acho o eleitor um sinistro. Sinistro legal, tenho que reconhecer, pois quem aguentaria os mesmos abraços, as mesmas galinhadas nas reuniões do partido, e as mesmas promessas mentirosas tão comuns nas campanhas, e mais que promessas que caducam em poucos dias, os mesmos discursos decorados, o mesmo narcisismo, e o mesmo aperto molenga de mão viscosa. Então, isso tudo se deve ao carisma que o eleitor tem com o tempo em que vive: a campanha!

Eleitor é louco por campanha, pra fazer bullying com os políticos. Ao contrário do que se pensa, eleitor não odeia políticos. Os adora! E tem sua dose de razão nisso, pois campanha política é tempo de fartura, de promessa de felicidade e fortuna, de esperança em boas casas de saúde, ruas douradas e pavimentadas com pérolas, e escolas onde o ensino é feito em permanentes festas com comida em abundância, e bebidas alcoólicas que não deixam bêbados seus beberrões, nem engordam as guloseimas, aos comensais. Um Éden, é só o que eu posso usar como exemplo, o tempo da campanha.

Campanha é o momento em que os pensamentos afloram, do outro e do um: Eleitor e candidato, ambos entrelaçados em uma mistura de amor e ódio, tapas e beijos, pauladas e pétalas. É o embate entre titãs, onde espremem-se até que pingue a última goita de néctar de cada um, ao que denominam de "voto".

Ah, o voto, esse sim vale a pena, e muito. Votar em quem odiamos, só para termos o prazer de esperar quatro intensos anos, até que o candidato volte à nossa casa, como ar de muxoxo, o que em si já é falso, mas necessário.

O eleitor vê no candidato um saco de pancadas para suas frustrações com a vida política e pessoa. Já o eleitor vê o candidato  como uma válvula de descarga da miséria humana, embrulhada em pacote do poder.

O candidato veste uma capa de herói e uma máscara de santo, e o eleitor vesta um manto de santo, e esconde-se sob uma máscara de complacente. Um e outro não se suportam, mas se amam com invejável intensidade, e só no tempo de campanha é que conseguem ser verdadeiros. Separar amor é ódio e cantarolar odes em louvor aos quais odeia. 

Candidato e eleitor são como dois gladiadores prisioneiros por circunstâncias de pátria e aldeia, que durante os dias comuns, convivem na mesma jaula onde são tratados como feras cativas, e que sua libertação não se dá nos campos livres para que percorram de braços com a liberdade,mas em uma grande arena lotada, onde lutam até à morte, para delírio da multidão, onde estão eles próprios, por seu turno, ovacionando outros que lutam e tombam, em nome do que chamam de democracia.

Não existe democracia alguma. O que existe é o desejo de uns brilharem, onde os outros são o estribo, pescoço, e degrau, e o alto do pódium é um pico sem corrimão, onde apenas uma leve brisa é capaz de mostrar quão frágil é sua força própria. O pódio não é lugar de multidão. É a última instância da solidão.

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Cartoons, Design & Literatura, by Pacard













quarta-feira, 2 de setembro de 2020

No dia em que Apolônio Lacerda ideou uma civilização

Pous foi o acontecido, numa terça feira, logo ao raiar do dia, em que Apolônio Lacerda, que tratado pelo populacho de:  "O Taura do Chinaredo", adentrou-se no bolicho do paraguaio pra se defender de um aguaceiro que chegava. Largou a mala de garupa num canto, e  escorou-se no balcão de Granitina, já carcomido, e fez sinal de "dous dedo" pro Carrapicho, o piazote que  Talarico justou pra caixeiro. Indicava isso  que o rapaizote deveria servir-lhe dois dedos bem medidos da pura do alambique.

Deitando um tantico pro "santo", mas lambendo os dedos pra não desperdiçar a pura, ergueu o "martelinho" e deitou goela abaixo, com uma careta própria de quem bebeu coisa forte, mas não se crama porque era abencoada. e só depois disso foi que revirou os zóio pra bombear quem estava ali.

Na ponta do balcão, escorado, de corpo presente, encontrava-se um xirú, com uma "oito baixos" dipindurada no tiracolo, já quaje lambendo o fundo do caneco, de adonde era servida a cerveja gelada. Logoa atrás dele, meio que "incuído num canto, amoitado num cepo de picá cavaco, o Churumela, piazote dus catorze, coisa assim, mascava devagarito um pastel engordurado, que era pra durar bastante. E numa mesa, do outro lado, uns oito ou nove, se largavam no truco, num gritedo que dava gosto de se vê.



Olhou pra todos os lados, virou-se pro bolicheiro, fazendo sinal de interrogação com os zóio, meio que perguntando: "Mas e daí?", o que também talarico devolveu com um "dar de ombros", como que dizendo: Sei lá! 

Acomodou-se noutro cepo, á entrada, para bombear o movimento do entra-e-sai do bolicho. Ninguém interessante pra uma prosa. Ora entrava o Setembrino, fio do Cóta, outra hora a Vicentina, muié do Bastião Zarôio, que ia entregar os ovos e pastéis fritos pra venda, enfim, um entra-e-sai contínuo. A chuvarada (acharam que eu esqueci da chuvarada?) era um aguaceiro de verão, e logo passou. O sol raiou lá fora, mas dentro do bolicho, nada de novo. e ninguém pra assuntar com o Apolônio, que à certa feita, esparramou o bigode, e falando de modo audível ao bolicho e ao mundo, berrou:

- Pous andei contando a parentagem, e sabe que deu gente? Barbaridade! Como hay parente nesse mundão véio, que côsa seria!

- Hay povo, sim senhor - emendou Talarico.

Quem tem tanto parente assim deve ser muito importante - disse Apolônio, olhando cm atenção pro toco de paiêro entre os dedos.

- Pous decerto, respondeu mecanicamente Talarico. E cntinuava a polir as canecas na pia. Só negaceava por cima dos óculos embaçados, virando a cabeça, quando Apolônio falava.


-Lá na familia, semo: Eu, a muié, onze fio, treis cusco, dois gato, umas trinta franga, cinco galo, um tatu mulita que temo criando, um papagaio, a sogra, quatro cunhado... (Apolônio dizia isso, olhando para um mural imaginário, e contando nos dedos de uma só mão, repetindo dedo pra economizar na contagem)... E continuou:

- Mâns chê! Se agregá a bicicréta, o ancinho, a foice, o enxadão, e a patente nos fundos do rancho, isso dá uma civilização, praticamente!

E largou um belo sorriso. Só ele, pois o resto da indiada não entendia nada de civilização, só entendeu a parte do capungo deatrás da casa, e da contagem da familia. Mas deu de ombros, e continuaram, todos, no que faziam de antemão.

- Povo já tem de chega. Falta só um idioma!

Mas credo! Pra que falar tão difícil naquela hora? Nem candidato ele era? Ou era? Não, não era.

Pediu que embruiásse uma rapadura, e uns caramélo pros piá, e saiu porta afora, matutando sobre o que havia ingenhado.

Ao chegar ao rancho, foi logo pendurando a cordeona num toco cravado na parede, e quis se mostrar pra muié, falando no novo idioma da civilização que ele criara. Ergueu o braço, cuspiu no canto da sala, e lascou:

- Xaramanguela tetrubaca, sapopenga xaramunhéca tralalá! (Eu te saúdo, fia da minha sogra! Que alegria1)

Pra sua surpresa, a patroa respondeu no mesmo tom:

- Vai tú, jaguara! Tu e tuas china, cachacêro!

Apolônio achou melhor não perguntar pela tradução. Ajuntou o pala, e saiu de fininho, como assobio de papudo, e foi dormir no paiol, naquela noite.






Spritzbier - A deliciosa cerveja de gengibre apreciada na Festa da Colônia, em Gramado


Nunca fui tomador de cerveja, por não gostar mesmo. Não posso dizer que uma ou outra vez eu não tenha bicado uma cervejinha preta, se for bem docinha. Paciência. Sei que é uma heresia, entre os apreciadores dos finos maltes, mas fazer o que? A laranjada, pra mim, sempre foi mais gostosa, mesmo que cheia de química.

Mas, como o tempo passa, e tudo muda, eu também mudei: passei a gostar de cerveja, e essa, é amor antigo: a Spritzbier, ou Gengibirra, como os italianos a conhecem. Dessa, falo serio,  eu sento pra conversar e tomar umas duas garrafas, se der no jeito.

Há dois anos atrás, resolvi iniciar um projeto de bebidas probióticas, e descobri que não existiam similares no Brasil, e embora tenha varrido centenas de páginas na internet, não encontrei nenhuma receita que atendesse ao que eu buscava. Assim, investi cerca de duas mil horas, e um certo tanto em dinheiro, contratei consultorias, obtive suporte de químico, biólogo, nutricionistas, e finalmente e cheguei à fórmula desejada, sabor ao alcance dos bons paladares, testes de maturação, e tudo o que faz de uma bebida, uma bebida. Criei a "Energy Flavor", um espumante à base de frutas, ervas sementes, raízes e flores. Encaminhei e recebi registro de marca, fiz rótulos, acertei fornecimento de vasilhame, e quando estava com tudo pronto para colocar no mercado, fui em busca de investidores para o projeto, porque aí era coisa de gente grande. Foi nesse tempo que uma pequena e bem organizada cervejaria que se disponibilizou para produzir minhas bebidas em larga escala, encerrou suas atividades, porque os proprietários encontraram outros planos para seus negócios, e manter uma cervejaria em funcionamento, não era um deles. Nasceu uma grande amizade, mas decidi não dar continuidade ao projeto naquele momento, pois eu também estava em transição pessoal, e resolvi deixar para o ano seguinte. Quando o ano seguinte chegou, trouxe um convidado indesejável à tiracolo, e todos os planos de todas as pessoas no mundo inteiro foram adiado por tempo indeterminado. Cest la vie, dizem os japoneses...ou os gauleses, sei  lá. Mas, vamos ao Spritzbier então. Era disso que eu falava, quando desviei do assunto, sentimentalismo, sabe.

As famílias pobres do interior, da roça, da colônia, como se diz no sul,tinham uma vida bem difícil, e em geral,muitas bocas para alimentarem, mas nem por isso deixavam de lado a alegria e as festas, muitas festas. E festa, sabe como é, precisa ter muita bebida, e como sabem (vocês sabem, não sabem?) bebidas custam caro, a não ser que vocês mesmos as façam, irão gastar rios de dinheiro enchendo o bandulho dos convidados que, sim, vão às festas por causa das bebidas.

Assim, lembrando que quando terminar o isolamento, precisaremos nos humanizar novamente, e então, quem come, vai comer, quem dança, terá talco no salão, e quem bebe, vai precisar muito do banheiro, pois beber é diurético, e quando falo de beber, não, não estou fazendo nenhuma apologia à beberragem largada, sem alcoolismo, e muito, muito sabor e saúde nelas. E foi bem assim que achei que seria uma ótima ideia que eu mesmo tive, sozinho, de criar uma seção de gastronomia regional, onde vamos publicar receitas, entrevistas, dar indicações, e mostrar como a vida simples pode ser sofisticada.

A receita de hoje é a Spritzbier, então. Vamos à ela.


Ingredientes:

100g de gengibre descascado

2 kg de açúcar cristal (tem que indique que se use Demerara. É frescura. Use cristal que dá no mesmo)

3 limões frescos

8 litros de água

5 g de fermento biológico


Modo de preparo

Corte em pedaços bem pequenos e macere o gengibre
Ponha para ferver e marque 15 minutos após começar a fervura.

Coe o suco de limão, e adicione à água ainda quente

Dissolva o açúcar em uma vasilha à parte, com 500 ml de água. Deixe ferver até borbulhar, mexendo sempre.

Adicione a calda com os demais ingredientes, mexa bem, e deixe descansar por 24 horas.


Dissolva o fermento em 100 ml de água e deixe dissolver por 15 minutos. Depois, adicione à calda, que estará morna ainda, provavelmente. Mexa bem tudo

Coe a calda e coloque em uma bombona de água mineral limpa. Deixe descansar por 3 dias. Tampe a bombona com um plástico, para evitar contaminação.

Deixe em lugar escuro e com temperatura ambiente.

No sétimo dia, engarrafe, coando novamente. 

Engarrafe, usando garrafas PET. Ao encher, deixe cerca de 3 cm abaixo do gargalo da garrafa,para permitir que tenha espaço de fermentação.

Guarde em geladeira ou em local escuro e fresco. 
Mais três dias, estará pronta sua deliciosa spritzbier. Pode ser guarda até 30 dias em geladeira. A partir disso, ela se tornará mais amarga, e começará a formar uma pequena quantidade de álcool, insignificante, mas não perderá suas propriedades probióticas.

Tome cuidado ao abrir, pois a fermentação poderá deixar uma certa quantidade de pressão, e ao abrir, pode derramar, por isso, abra sempre dentro da pia.

Sirva gelada, e organize o acesso ao sanitário, pois é diurética, no primeiro dia, e no segundo dia, se beber demais, pode ser um pouco laxante, mas nada que te faça passar vergonha.


Bon Apetit, dizem os argelinos (lógico, na Argélia ainda se fala francês, ué).


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sábado, 25 de julho de 2020

Véio de Alguel

Funny old man - Finished Projects - Blender Artists Community

Porfírio andava cismado com o isolamento. Não podia sair de casa, não podia matear com a cumpanherada, nem dar um tapa num talagaço com os amigos da bocha, nada. E ademais, os pila se iam como mijo perna abaixo quando se passa da medida na cerveja. Tinha que pensar em alguma coisa, pois nem tinha pensão do istituti pra receber, nem guardara uma reserva pros dias de penúria.  Paciência haja, mas fazer o quê?

Foi num desses dias, ouvindo as nutícia, onde o repórti contava que pela tal de infernéte, dava de vender e alugar de tudo um pouco.  A côsa parecia promissora, e foi aí que Porfírio engenhou a ideia de alugar véios.

- Mas e quem é que alugaria um véio, Porfírio? -  Perguntou Carsulina, enquanto passava um café cheiroso.

- As pessôa, cumadre! As pessôa! A cumadre indéie cá comigo ancim: Os guverno vão caborteá os véio, que vão acabá morrendo cuáje tudo, ancim, em lote. E o mundo vai entrá numa carestia de véio, porque véio é de percizão das pessôa, só que só vão se interá disso dispôis que adubarem o campo santo com tanto de véio que ainda vaí pra lá. Então, os moço vão se dá conta de que vai fartá concêio, vai fartá contadô de causo, e o mundo vai sisquecê de tudo o que aconticeu em priscas eras, e lhe digo mais: isso não vai pará, inté que os moços não vão sê mais moço, e não vão tê causo pra contá pros outros moço que nasceram. E o mundo vai repetir todas as bandaiêra que já tinha feito antes, porque não vai tê véio pra ralhá com eles, nem dá os concêio de que percizam. É aí que eu entro, como meu emprendimento de aluguel de véio.

- Mãns, e como o amigo vai qualificá os véio pra podê botá preço nas mercaduria?

- Pous é aí que entra a serventia de sê véio, cumadre. Elabore comigo ( ele ouviu isso de uma entrevista com uma psicóloga, e gostou da expressão: "elabore comigo!") ancim: véio pode ralhar com os jovens, peidar quando tiver vontade, levantar o volume da tv, pra que saiam da sala, experimentar a comida com a colher que mexe na panela, contar trinta vezes a mesma história..no mesmo dia, discutir até amanhecer sem perder o sono, nem a vontade de parar, e se a pessoa concorda, aí ele contra-argumenta tudo ao contrário, só pra continuar discutindo, e ainda ter o amparo de lei, se tiver necessidade de fincar uma bengalada na canela dum desaforado. 

- Mãns ainda não vi a serventia da côsa, filho, retorquiu Carsulina.

- Pous acôsa tá em carregá um véio consigo, quando percisá fazer uns mandados em alguma repartição, onde os atendente são meio levados da casquêra, relapsos, e se botá a boca neles, é desacato ao servidô público, o que dá cadeia. Pôus nesse causo, o véio fáis as honra, e despeja o verbo nos maleva, e por ser véio, não chamam os puliça, e pra que o véio não vorte de novo, eles resolvem os pobrema ligerinho.
É só pagá os onorário do véio, e tocá pro buteco ganhar o resto do dia numa mesa de isnuque ca cumpanherada.

Carsulina deu uma baforada no cachimbo de taquara, e ria, ria, ria.


Se ocê gosta de recebê paiassáda, e também côsa céria, me persiga no facebuque ou no zápelape.

https://www.facebook.com/dpacard

(48) 999 61 1546


quarta-feira, 8 de julho de 2020

E se der tudo certo? - A teoria do seixo no sapato


O que significa dizer que algo é uma Pedra no sapato? - Dicionário ...


Imagem: internet
"Esteja preparado para os dias difíceis", diziam os antigos. Durante toda a vida, somos alertados para as consequências das falhas. Tornamo-nos especialistas em expectativa de fracasso. Somos mestres em espremer o tubo de pasta até ver o fundo saindo pelo bico. Temos plano para todas as falhas, e até nome ele tem: Plano "B". Mal nos preparamos para o plano "A", já sabemos que se der tudo errado, o plano "B" é a saída. Pois é. Mas, que plano vamos seguir se, por uma fatalidade, o plano"A" funcionar, se o tempo todo trabalhamos pelo sucesso, esperando pelo fracasso?

Acho que este é o caco de vidro entre o sapato e o piso vitrificado, que range tão alto, mas não passa de um grão de areia que se apegou à nós, ao ter sido pisado. Temos grãos de areia por tudo onde passamos, que incomodam mais os ouvidos, do que o chão que é pisado.

Outro incômodo grande é um pequenino, quase milimétrico seixo, dentro do nosso sapato. Não é uma grande pedra na nossa cabeça, nem uma montanha que temos que subir. É apenas um seixo, entre o pé e o sapato. Pequeno, mas que governa nosso caminhar. Determina o modo que devemos pisar, e se não for removido dali, nossa caminhada terminará em breve tempo.

Não são as grandes coisas que nos assustam, mas as pequenas que se colocam em lugares estratégicos de nossa vida. Os Homens aterram lagos, constroem represas, dominam rios e até o mar, em alguns trechos. Enganam as profundezes, com pequenas embarcações que flutuam, planam sobre as ondas, e usam o mar como caminho. No ar, constroem gigantescas aeronaves, capazes de transportar de um lado a outro do mundo, a terra removida das montanhas. Tudo isso o Homem é capaz de fazer. Tudo é calculado, medido,  preparado para grandes vitórias. Exceto o grão de areia entre o sapato e a porcelana, ou o milimétrico seixo entre o pé e o sapato. Estes não foram e nunca serão dominados.

Assim, se tudo der certo, se as montanhas forem aplanadas, os outeiros nivelados, ainda assim, restará o que não vemos, mas sentimos, mas só sentimos quando não há mais montanhas a galgar, nem mais mares por dominar, porque teremos novamente o domínio sobre o que é menor, e seremos nós, os gigantes incomodados pelo que é menor, infinitamente menor que nós. Como um vírus, por exemplo. A pedra do nosso sapato, a areia sob nossos pés, mas que nos fazem lembrar do quanto pensávamos que éramos fortes, e descobrimos quão estúpidos nos tornamos.

E se der tudo certo, ao final de tudo? Aí passaremos a procurar grãos de areia e seixos, e novamente vamos nos esquecer quem somos: Os que desmancham montanhas, atravessam o Universo, mergulham nos mares, que matam crianças, que roubam dos pobres, e perguntam, por fim: Onde foi que os outros erraram?


Bella Ciao e Modelo Econômico de Crescimento - Táticas e Estratégias que modelam o Pensamento Político

Imagem: Bing IA Pacard - Designer, Escritor, e Artista, que tem nojinho de políticos vaidosos* "E sucedeu que, estando Josué perto de J...