AD SENSE

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

O homem que brigou com D-us - Opus 1 (Ensaio)


Todos os nomes dos personagens, exceto menções de personagens históricos, são fictícios*

Professor Esteban Saavedra chegava sistematicamente às sete horas e quarenta e dois minutos na escola, onde lecionava história aos alunos do último ano do Ensino Médio. Dirigia-se à sala dos professores, largava sua mochila com seu notebook, e servia-se de café, recém passado, por Dona Maria Virgínia, que sincronizava o preparo da iguaria, ao som dos seus passos pelo corredor, até à pequena salinha, de onde era atraído pelo aroma que se espalhava por todo o andar da escola.

À primeira xícara servida, ao velho professor, fazia companhia um pote de biscoitos, que passava de mão em mão pelos demais professores que iam chegando ao lugar, para refestelarem-se com café, biscoitos, e umas boas risadas de um e outro professor, que relatava o comportamento deste ou daquele aluno, tecendo conjuras sobre o comportamento, ou dramas familiares revelados ali, como se fosse um grupo de apoio, onde catarses eram despejadas nos poucos e bem aproveitados minutos antes do confronto diário com a turba enfurecida trancafiada entre quatro paredes e vinte e poucas carteiras enfileiradas, onde seus desafios os aguardavam impacientemente.

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Sete horas e cinquenta e cinco minutos, toca o sinal de aviso para que todos os alunos entrem em suas respectivas salas, fato que poderia ocorrer com harmonia e silêncio, pois são apenas vinte e poucos saudáveis estudantes dirigindo-se para mais uma manhã de instrução e conhecimento. Poderia ser ordeira e silenciosa. Poderia.

Faltando um minuto para as oito horas, Esteban abre a porta, e ao ver o estardalhaço que fazem seus alunos, fica parado à porta, com uma mão segurando a mochila, e a outra segurando a maçaneta da porta, e olhando com firmeza, mas sem ira ou qualquer aparência de raiva, para a turba, que aos poucos, percebia que não seria recomendável que mantivessem a resiliência da desordem, mas se aquietava, até que, ao som da segunda cigarra que tocava novamente, Esteban entra e com delicadeza fecha a porta, cumprimentando, a seguir, seus alunos, com um generoso sorriso ao rosto.

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- O Universo tem suas regras, eis a razão pela qual nos mantemos íntegros, apesar da imensa quantidade de meteoros, e raios cósmicos nos bombardeando o tempo inteiro, mas eis que entre essa caótica configuração que se faz parecer com organização mnemônica, embora tudo parece, ao olhar mais acurado, como randômica, ocasional, como é o tempo, e assim é nossa classe: Se parece com um mundo no caos, mas é cosmogônica, ordeira, e civilizada, e de fácil organização, enquanto houverem regras e estas regras forem seguidas, o que acaba de acontecer.

A classe não piscava, e só respirava, para manter a vida pulsando nos corpos estáteis, apenas tentando assimilar o conjunto de palavras diferentes e difíceis, que nem estavam ligadas (é o que achavam) à sua disciplina de História. Mas discutir com um erudito era tempo perdido, e ainda poderiam ter do que rir à hora do intervalo, imitando os trejeitos pomposos do velho professor Esteban.

Esteban era um advogado, que dividia seu tempo entre os tribunais, e a cátedra, e lutava para decidir qual das atividades dominava mais sua paixão. Era como um homem que amava duas mulheres, e não se decidia por nenhuma, antes traía as duas, e traía a si mesmo por essa indecisão. Mas era assim que era. Paixão e dedicação aos réus, paixão e dedicação aos alunos. Ambos precisavam de sua lucidez permanente, pois um único deslize seu poderia deixar que condenassem um inocente, ou tiraria dos bancos de uma universidade, um aluno descuidado com a matéria.

A aula era de história das religiões. E Esteban era ateu. Não era ateu proselitista, pois acreditava no livre arbítrio e no direito de crer em não crer e não crer em crença alguma, exceto a crença da não existência de D-s (Deus). Mas era ateu convicto, e para tornar-se ateu praticante, com ética em suas crenças da não existência de Um Criador, precisava acima de tudo de honestidade consigo mesmo, e deveria entender por que não cria, mas também porque criam em D-s, e por que tinham religiões tão diferentes, e ao mesmo tempo tão iguais, os seus alunos e os demais professores.

Estudara com fervor quase religioso a Torá, os Profetas, os Escritos, da Bíblia Hebraica, ou Antigo Testamento, mas também tinha várias pós graduações nos escritos judaicos do Novo Testamento, mas também conhecia Surata por Surata do Alcorão, o Livro Sagrado dos Muçulmanos, assim como sabia diferenciar entre o Bardo Thödol, do Budismo do Norte, ao Bukio Dendo Kyokai, do Budismo do Sul. Lia também e estudava os mantras com minuciosa curiosidade, do Hinduísmo e suas variadas ramificações, passando ainda pelo Livro dos Mortos do Egito, e para ser mais específico no interesse das aulas, a história do cristianismo, desde Jesus, chamado O Cristo, Messias, passando pelas perseguições romanas, primeiro aos judeus, depois aos cristãos, e depois destes aos judeus, até chegar ao presente, na confusão das religiões que matam e torturam em nome do D-s, ao qual chamam de amoroso. Isso o tornara ateu e fortalecia suas convicções, citando a Bíblia quando dizia, do Livro de Eclesiastes: "No muito saber, há enfado da carne", eram as palavras atribuídas ao Rei Salomão. O Rei com mil mulheres e que transformara seu palácio e o Templo Sagrado, em dois imensos puteiros, onde praticava sua justiça, aterrorizando mães que disputavam a posse de um filho, ameaçando fazer bifes do bebê vivo, e claro, funcionou, e nunca saberemos se ele passaria a lâmina no bebê, ou nas mães delinquentes. Enfim. Salomão não era um bom exemplo para Esteban, e relatos como esse sedimentavam sua fé no vazio Teológico.

A favor do professor Esteban, era que ensinava os preceitos e o entendimento científico do comportamento humano diante de cada religião, era sua honestidade no ensino, e se os cristãos creem que Jesus é D-s, então ee dizia: Segundo a crença cristã, de que Jesus seja D-s, então, vamos tratá-lO com tal reverência, como gostaríamos também de Tratar da crença judaica de que Moisés, Josué, e os grandes profetas da história de Israel realmente falavam face a face com seu D-s, então é assim que trataremos, pois minha crença é apenas minha, e vossa crença é apenas vossa, e o respeito é o que nos iguala como Humanidade, e nos difere dos animais irracionais, isto é, que agem pelo instinto, mas não pela razão.

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- Um cão jamais questionará porque é um cão, por que não é uma lagosta, ou um Iáque do Himalaia. Assim, eu não questiono por que Benjamim frequenta uma sinagoga, ou Abdul vai à mesquita, nem tampouco por que João Pedro reza aos domingos na missa, enquanto Sebastião recebe passes num terreiro de Orixás.

- É este livre arbítrio que aproxima as pessoas, sem que interfira nas crenças de cada uma delas, enquanto em seus ambientes próprios, e que haja um senso comum de convivência e respeito em ambientes que pertencem à todos, e que ponham em prática as boas práticas de seus ensinamentos religiosos, que devem externar o resultado daquilo que entendem por amor ao próximo, este, pregado por todas elas, e esta é a única parte das religiões que me comovem de certa forma.

- Professor Esteban! Levantou a mão um menino que assentava-se ao fundo da classe.

-O senhor já falou com D-s?

Esteban sorriu e ironizou a situação.
- Bem, ainda que eu falasse com Ele, acho que não seria convidado a tornar-me pastor, padre, xamã, ou rabino de seu rebanho - respondeu.

- Mas o senhor já falou com D-s?- Insistiu o menino.

- Não, filho. Nunca falei, E você falou com Ele? (Fez um sinal com o dedo indicador, apontando para cima, movendo-o pra cima e pra baixo, com sarcasmo).

- O senhor acredita que eu tenha falado com Ele, professor Esteban?

- Mas que menino! Responde uma pergunta com outra pergunta!-Riu disso.

- Você responde uma pergunta com outra pergunta, muito inteligente, filho. Você é judeu?

- Apenas os judeus respondem uma pergunta com outra pergunta, senhor professor Esteban?

- Você é o jovem Benjamim, é isso?
- O senhor sabia que meu pai também se chama Benjamim, e dois tios, por parte de minha mãe, também tem esse nome?

- Você não me respondeu a pergunta. Você já conversou com D-s, Benjamim?

- Quem fez esta pergunta não fui eu, professor Esteban?

Esteban deu uma sonora gargalhada e deu início ao plano de aula:
- Página sessenta e dois. Leia, Samira, em voz alta.

- Moisés subiu o Monte à procura de umas ovelhas que havia subido o Monte, e ao aproximar-se de um lado da montanha, viu um fogo aproximadamente de sua altura, envolvendo uma planta seca, uma Sarça, mas apesar de emanar um grande calor, a planta permanecia intacta, e não queimava. Assustado e curioso, Moisés aproximou-se., e do meio do fogo, ouviu uma voz que dizia:
- Moisés! Tira as tuas sandálias, pois o chão que pisas é Terra Santa.

- Muito bem, Samira! Pode assentar-se.

- Benjamim! Você realmente acredita que Moisés estava, de fato, conversando com D-s?

- Talvez sim, professor, porque Moisés ainda não conhecia o D-s Criador do Universo, mas conhecia muitas histórias dos deuses do Egito. Moisés foi treinado, e qualquer manifestação estranha, poderia ser algum deus conversando com ele, pois no Egito, Moisés vira muitas coisas estranhas acontecendo, quando era um aprendiz de sacerdote e príncipe do Egito.

Perceba, professor Esteban, que Moisés nem chegou a perguntar quem era aquele espírito, até que O Próprio D-s se apresentou, e nem se apresentou também como O Criador do Universo, mas começou o relacionamento de mansinho, apresentando-Se como Alguém íntimo com a família de Moisés (D-s de Abraão, Isaac e Jacó). Assim, foi O Próprio D-s quem abriu caminho para aquela conversa, e é como Ele faz sempre, eu imagino.

Esteban cerrou os lábios, abaixou a cabeça e a balançava em movimento vertical, segurando o queixo, e olhando em direção à janela, enquanto escutava o rapaz. Em seguida objetou:

- Então você se contradiz, pois afirmou que Moisés conhecia segredos da manipulação, da mágica, do ilusionismo, das ervas alucinógenas, e outros recursos que alteravam o estado de consciência da pessoa. A própria altitude, o ar rarefeito, não poderia ter levado Moisés a ter aquela visão, e de ter imaginado estar conversando com sua divindade?

- Onde há contradição, professor Esteban? Em primeiro lugar, em nenhum momento D-s disse que estava ali. Ele apenas fez Moisés saber com quem falava, e uma visão, fosse ela física ou não (não vou chamar de real, porque realidade virtual é também uma realidade)era a epifania necessária para indicar o sagrado da situação.
Em segundo lugar, aquela, que o senhor diz ser a possibilidade de uma alucinação fanática, foi seguida de uma sequência de fatos com milhões de testemunhas, e registrada passo a passo como diferente da forma usual, e assim denominada de milagres.

D-s poderia ter se comunicado em sonhos, como fez com Abraão, com Jacó, com José, mas também falava face a face, como com Moisés e outros profetas, mas optou por aquela situação, onde o abiente não esteja cercado de imagens, ou portas douradas, nem pompa e cerimônia. A única cerimônia exigida foi lembra que dentro da casa, não se entra de sandálias, costume que mamãe Rivka nos impõe até hoje, pois a casa é um lugar santo, kadosh, separado do mundo, e os pés que pisam lugares santos tornam-se santificados também. Esrta era a intenção de D-s ao exigir que Moises caminhasse descalço na Sua Presenta, ois era um lugar de Santidade. A presença de D-s em qualquer lugar, traz santidade àquele lugar.

Esteban ouvia tudo calado, assimilando os fatos, e preparando a próxima pergunta, mas lembrou que Benjamin estava monopolizando sua aula, e os demais alunos poderiam se deixar influenciar pelo pequeno teólogo de bermudas, e uns fios de barba dispersos pelo queixo.

- Muito bem, Benjamim! Tome nota disso que você falou em uma redação e deixe na minha mesa até o fim da aula. Quanto aos demais, façam também uma redação, com base no que Benjamim falou aqui nessa aula, e deem suas opiniões a respeito do que foi dito e perguntado. Vocês tem o resto da manhã para debaterem entre sim, em duplas, e apresentarem suas redações, que as lerei em casa, e valerão dois pontos na nota do mês.

.......Segue no próximo ensaio

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quinta-feira, 24 de setembro de 2020

Falar corretamente, ou agir de modo correto - O que voce escolhe?

 


Quem acompanha meu trabalho desde certo tempo, sabe que eu gosto de brincar com as palavras, fazer trocadilhos, e errar propositadamente em textos bem humorados.

Sabem ainda, os meus leitores, que em algumas oportunidades, os meus textos são um pouco mais complexos, e faz-se necessário uma segunda ou até terceira leitura, para que o sentido amplo possa ser compreendido.

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Já houve até quem reclamasse que meus textos, são muito extensos. 

É possível que sim, mas certamente não são os mesmos leitores que  fazem das letras, o seu conforto, ao sabor da quietude, o seu tempero dos dias. 

Eu devo respeitar suas preferências, e indicar à estas pessoas, aquelas tirinhas de "cartoon", do rodapé de jornais (se é que alguém ainda leia jornal), embora estas, às vezes, por serem inteligentes demais, nem sempre são completamente compreensíveis. 

Bem, em última hipótese, no "Pinterest", há bilhões de imagens sem texto algum. 

Pinterest, eu penso que seja talvez, o maior álbum de figurinhas que existe. Vale a pena. E nem precisa ler as legendas. Basta deslizar o mouse e clicar em cima, que uma puxa outra até que o sono se torne insuportável.

Mas também sabem que quando quero eu brincar ou ironizar com alguma situação, eu escorrego ladeira abaixo propositadamente do vernáculo, e levo o escracho ao texto,  para que note-se distintamente que estou brincando, e raramente alguém vê o contrário.

Como tenho leitores e amigos virtuais de todas as classes, eruditos, ou simplórios (no bom sentido), eu tomo o cuidado de evitar direcionar algum texto de forma chula, invasiva, ou debochando dos erros alheios, pois quem é que não comete deslizes na gramática de vez em quando? 

Esse texto aqui, mesmo, talvez seja objeto de crítica textual ou gramatical de alguém versado nas letras, e venha mostrar-se à tal pessoa, eivado de erros. 

Paciência. É assim mesmo a vida. Erramos e acertamos, mas sobretudo, buscamos estabelecer duas coisas, quando escrevemos, pois nem sempre o que escrevemos tem endereço no envelope, e muitas vezes, o endereço é pessoal, à nós mesmos. 

Escrevemos como desabafo, como observação do cotidiano, ou simplesmente pelo prazer de escrever.

Eu tenho, ao longo do meu crescimento intelectual e pessoal, tomado o cuidado em mais que escrever de modo correto, viver e agir, de forma ilibada, não para vender uma imagem de santo, mas para deslizar pela vida de maneira mais prazerosa.

Viver além das palavras é uma forma de escrever no espírito com letras que só o íntimo possa ler, e o íntimo é, em última instância, o gestor do caminhar e do viver.

Assim, escrevo o que penso e penso no que vivo. Aos sábios, faço-me ouvidos, e aos tolos, cubro os olhos para que não vejam, e os ouvidos para que não ouçam, assim como amarro os pés, e ato as mãos, para que não caminhem nem abracem tais criaturas, porque aprendi, pela vida, a errar sozinho. 

Para cometer deslizes, não preciso que me empurrem. Basta escolher não caminhar, quando sei que não nasci com raízes, mas com pernas.

Basta escolher ouvir o que é bom e proveitoso, quando meus ouvidos são seletivos e podem servir-se das mãos para que os encubram e os protejam de ignomínias.

Para ser mau, basta não ser bom. Para ser bom, sim aí está o grande desafio que é viver sob constantes escolhas.

Falar corretamente é falar com naturalidade, e não fingir conhecimento com palavras ao vento. 

Agir de modo correto é agir pelo que somos diante dos outros, como se estivéssemos sós.

É um jeito de ser, viver e pensar. Cada um viva o seu próprio, que o mundo já fica um pouco melhor.

Que falem nossas palavras o que diz o nosso comportamento. Ser correto é mais que escrever certo.

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quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Antes que venham os maus dias - O entardecer de todos nós

 



Lembra-te também do teu Criador nos dias da tua mocidade, antes que venham os maus dias, e cheguem os anos dos quais venhas a dizer: Não tenho neles contentamento;
Eclesiastes 12:1


Velho é matéria-prima para anedotas...sobre velhos! 

Há muitas, e em todas elas os velhos são satirizados, e também satirizam a si mesmos, em assuntos como: disfunções ligadas à senilidade (caduquice), impotência sexual atrelada à incontinência urinária, o uso de acessórios vestuários, e claro, o "politicamente imbecil modo de falar incorreto", onde diz que não se diz mais "velho", mas "Idoso"; "melhor idade", mas velho nunca. 

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Inventaram regras fracionadas, pois a palavra "velho", antes indicava algo ou alguém, com idade além daquilo que era estabelecido como "novo", ou seja, um antônimo, apenas.

Então, por que já não se pode mais chamar de velho, se há um antônimo que o equipare? 

Nesse caso não seria também proibido chamar algo ou alguém de novo? Deveria ser, pois é ofensivo chamar de novo o que pode ser chamado de "diferenciado". 

É proibido chamar de estúpido àquilo que que deve ser chamado de "inepto". 

É casuístico chamar qualquer coisa pelo modo que vinha sendo chamado desde que tal verbete tenha sido adicionado ao uso da palavra que se quer para designar um qualificativo, ainda que pejorativo da pessoa. 

Isso é ser velho.

Interessante que essa conduta, é nova. Isso mesmo. Nova! 

Não começou essa imposição de um novo vernáculo senão nas duas últimas décadas, ou pouco mais.

Até bem pouco tempo atrás, isso nos idos de minha juventude, os anciãos eram respeitados, e a história dos costumes relata a importância que tinham dentro da comunidade, eles, os velhos, que também eram conhecidos por serem sábios. 

Nós ansiamos demais, e essa demasia nos distanciou daquilo que é puro, daquilo que é  necessário.

Ansiamos pela vida, que corre mais depressa que nós e nossos passos, até que chega o tempo em que a vida começa a frear, e é o tempo quem acelera à nossa frente, ansioso, impaciente, com pressa de chegar a algum lugar.

O tempo não é bom para com os velhos. 

Apressa-os constantemente, e por ser tempo, e não gente, não raciocina direito, que o tempo só existe por causa do Homem. 

Assim, quando o Homem se extinguir, não haverá montaria para as horas, e as horas serão sepultadas junto com aqueles a quem apressaram.

Antes que venham os maus dias, façamos então, um concerto com nossos olhos, para que vejam o maior número de coisas, que um dia não verão mais: as flores, o céu, a noite, o mar, os rios, as estrelas, e as pessoas que caminham a largos passos à nossa volta, e também aqueles cujos largos, nossos passos caminham à volta delas.

Façamos um acordo, antes que venham os dias maus, com nossos ouvidos, para que ouçamos as vozes e as melodias, os cânticos, e as sinfonias, e o riacho que murmura ao longo de nosso caminhar.

Antes que venham os dias maus, aconselhemos nossas mãos, a que encaminhem os braços, aos calorosos abraços de outros braços, e neste entrelaço, promovamos encontros de corações, um juntinho do outro, e o outro do um, aquecidos pelo pulsar dos encontros.

Antes que venham os dias maus, façamos com que nossas pernas levem os pés à intensas e distantes caminhadas, em busca de horizontes, onde jorram as fontes da eternidade que nos espera.

Antes que venham os dias maus, sejamos simplesmente, bons, e nada mais. Apenas bons. Apenas felizes.

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Enquanto entoarem canções





















O cântico sempre foi um modo de comunicação da alma, um protocolo espiritual de abrir os corações. As Sagradas Escrituras, especialmente nos seus primeiros livros, a Torá, ou como é conhecido pelos gregos: "Pentateuco", atribuídos a Moisés, não foram escritos para serem lidos mentalmente, como fazemos hoje, no silêncio e na quietude, mas para que fossem cantados em alta voz, pois são um composto de ensinamentos, e não se ensina nada enquanto calados, mas falando em alta voz, e com certa harmonia melódica. Assim eram ensinados ao povo, e passados de geração em geração (ledor vador, em hebraico).

Nos tempos medievais, o relato de fatos distantes, ou mesmo locais, eram cantados e contados, de forma burlesca, ou dramática, pelos menestréis, que tocavam seus instrumentos de corda e sopro, e assim, amealhavam uns tostões, além de disseminarem as notícias, fossem verdadeiras, ou fantasiosas (hoje seriam fake news), pelos vilarejos, e pelas cidades maiores, pelos seus burgos e praças, de taberna em taberna, de prostíbulo em prostíbulo, ou até mesmo dentro das igrejas e catedrais, ali, naturalmente, de forma mais formal e respeitosa.

As canções eram divididas de dois modos apenas, nesse período: Canônicas (sacras), ou profanas. Ou eram aprovadas para serem entoadas pelos coros monofônicos gregorianos, ou como canções românticas, melodiosas, ou alegres, regadas à vinho e comilanças pelas noites frias da velha Europa.

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Deste modo, as histórias passavam de ouvido em ouvido, até que em determinado tempo, alguma boa alma as escrevesse e as eternizasse em livros, para deleite das futuras gerações.

As canções sempre fizeram e ainda fazem parte do cotidiano da cultura popular ou aristocrática. Cada lugar, cada povo, cada grupo social tem as suas melodias, os seus versos, um modo cancioneiro de expressar seus sentimentos e contar suas histórias, ou de proliferar suas opiniões, seja de modo sentimental ou irônico, através do humor.

As canções louvam políticos e heróis, assim como criticam e até espezinham personagens de agrado ou desagrado popular.

As canções tem o poder de fixar mais rapidamente as ideias e expressar de modo artístico, aquilo que discursos ou palavras não o fazem. São as crianças quem cantarolam os versos que calam vozes, ou levantam revoluções. São as canções que conduzem povos à marcha e congregam multidões no chamamento às lutas. Não há movimento sem canções, nem há canções que não motivem prosélitos, se falarem aos corações.

São as canções que fazem pulsar as massas e até calar baionetas. São os cânticos quem quebram a dureza de corações fechados. Enternecem mães e adormecem filhos.

Faltam canções, onde a palavra seja mais importante que a batida e a estridência dos instrumentos. Faltam poemas cantados e cantigas poéticas. Faltam menestréis e sobram coronéis. Faltam dedos e sobram anéis. Faltam vozes e sobram algozes. Faltam sentimentos e  crescem tormentos. Falta a sublimidade de vozes ao vento, de brisas, alentos, em lugar de tormentos e tormentas. Faltam poemas e faltam quem os leia. Faltam palavras e sobram jargões.

Enquanto entoarem canções, se calarão os canhões. Enquanto crianças cantarem, adultos haverá para ouvi-las. Enquanto adultos ouvirem das crianças, canções, a esperança fará coro pelas ruas e praças, e em todos os lugares. 

O Livro Sagrado fala de um cântico de libertação, sobre o mar de vidro, o Cântico de Moisés.

Enquanto se cantarem canções, haverá eternidade para ouvi-las, e anjos para formarem o coro.

Enquanto cantarem canções, haverá paz.





terça-feira, 22 de setembro de 2020

A festa do Belarmino - Um causo de arrepiá os mondongo

 


Belarmino abraçava os noventa anos já. Tava no lucro da vida, embora aos cinquenta, achava que chegaria aos cento e vinte, mas chegando aos cento e cinco, estaria de bom tamanho.

Belarmino era muito querido por seus parentes, quase todos, mas vou relatar apenas dos que lhe queriam bem, que eram muitos. Enchia uma mesa. De quatro pessoas.

Mas como em toda família, quando se tratava de comer, aparecia parente de todo lado, mais os agregados, que traziam seus próprios parentes, e, bem, aí era uma festa de galpão, com aquelas mesas de tábuas compridas, apoiadas sobre cavaletes.  Mais os cantinhos espalhados, onde a piazada se abancava, então, sim, o somatório ia longe. Então, Belarmino era muito bajulado em suas festas de Aniversário. 
Belarmino era de origem lusitana, açoriana, dos Moreira Rodrigues, por parte de mãe, e Gumercindo Souza por parte de pai. Casou-se por arranjo com uma tedesca, mas criada na Itália, e embora de origem germânica, tinha todos os apetrechos carcamanos, e assim foi criada a sua prole, numerosa e muito, muito tagarela, da espécie que fala com os ombros, com as mãos, com as orelhas, com o corpo inteiro, e muitas vezes, ainda conseguem um corpo emprestado para falarem ainda mais. Todos ao mesmo tempo. Em plenos pulmões.

Belarmino requeria cuidados, como uma cuidadora, equipamentos de oxigênio, cápsulas de ozônio para evacuação, e aqueles apetrechos que botam nos véios, que eu nem sei dizer o nome.

A festa estava muito animada, muito boa, com todos falando ao mesmo tempo, os tedescos, com trejeitos carcamanos. (É aqui que eu pergunto: por que eu contei que eram tedescos, com trejeitos de carcamanos? Não poderia simplesmente dito que eram carcamanos e pronto? Poderia, mas desse modo, eu ganhei quase um parágrafo inteiro e ficou interessante o causo).

Macarrão, talharim, espaguete, brusqueta à bolonhesa, polenta, radicci, e muita sobremesa, vinho, laranjada pras gurizada, e muita, muita parola (prosa), num movimento contínuo de mãos e dedos, braços e corpos (alguns emprestados pra caber tanto assunto),e muita cantoria.

Nomeio da tarantela, Belarmino levanta a mão, com muito esforço, estica o dedo fino e repuxado, arregalando os olhinhos vivos, para o alto, e esboça um gemido rouco...

- uhh..uuhhhmmm..uuhhh!

A barulheira cessa imediatamente, refletem, e um grita:

- Oxigênio pro Nono Belarmino!
- Espaguete pro nono Belarmino!
- Vinho pro nono Belarmino!
- o NONINHO TÁ FEDENDO!

- Uhh..uhh..uuhmmm! - Repetia Belarmino

E enfiavam:
- Oxigênio pro Nono Belarmino!
- Espaguete pro nono Belarmino!
- Vinho pro nono Belarmino!

Belarmino fazia um ar de alivio, e a balburdia recomeçava.
Tarantela, Mérica, Mérica, Quando se pianta la bela polenta...tchatchapum, tchatchapum..e outras canções movimentavam a festa. E Belarmino num canto, de olhinhos arregalados, olhando tudo.

Novamente, Belarmino ergue a mão e:
- Uhh..uhhhm..uhhh

- Oxigênio pro Nono Belarmino!
- Espaguete pro nono Belarmino!
- Vinho pro nono Belarmino!

E Belarmino relaxava. A situação se repetiu por mais tres, talvez quatro vezes, até que, no silencio incomum, um vizinho grita:
- Belarmino quer falar! Façam silêncio!
Meia hora depois, conseguiram fazer silêncio. Um feito.
- Parla, nono Belarmino!
Belarmino ergue a mão, inclina-se para o lado e diz:
- Eu xó queria...
- Parla noninho!!! - Gritaram todos!
- Eu xó queria....

- Parla noninho! Parla noninho!

- Eu xó queria....xoltá um peidinho!





segunda-feira, 14 de setembro de 2020

A tenda do beduíno - Fábula

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A tenda do beduíno  (Fábula)

Pacard - Escritor

No tempo de Harum Al- Pargath Ibn Al-Farrobh, havia um bondoso sultão, que semanalmente recebia os súditos para ouvir suas petições, e à medida do justo, atendê-las.

Num certo dia, apresentou-se diante dele um beduíno, choramingando, e pedindo que lhe concedesse uma tenda nova, pois aquela onde morava era por demais apertada para si, a esposa, e o único filho, que lá moravam.

Ao ouvi-lo com paciência, o sultão prometeu que concederia seu pedido, mas antes, pediu que ele levasse a sogra para morar com ele na tenda. Desiludido, o homem foi, e fez o que o monarca pedira.

Uma semana depois, voltou, com olheiras profundas e disse:

- Ó sapientíssimo sultão, esplendor do zênite, fulgor da aurora, e enviado dos sete céus, a coisa piorou demais!

 Está bem, disse o sultão. vou dar-lhe a tenda, mas antes, leve seu camelo para viver na tenda onde mora.

O pobre homem quase teve uma síncope, mas foi e enfiou (não me pergunte como) o camelo com a esposa, o filho e a sogra, mais ele, dentro da tenda.

Mais uma semana, e volta o trapo de gente, se arrastando, olheiras pretas, havia perdido um dente, e sujo feito um camelo velho.

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- Ó luz das estrelas, glória das setenta arábias, perfume do sândalo celeste, mimoso da vossa mamãe....não cabe mais nem uma agulha na tenda..estou pensando em morrer até...

- Tenha calma, disse o sultão. volte pra casa e despache o camelo e a sogra e em uma semana volte aqui.

Uma semana se passou, e lá estava um homem de bela aparência, perfumado como as campinas do Líbano , vestido com um príncipe em dia de bodas, saltitante e feliz. Ao vê-lo, perguntou o sultão:

- Meu bom homem! vejo que veio requerer a vossa tenda prometida.

- - Não, não, ó pimpão das setenta e duas virgens do paraíso, bálsamo das campinas do vale, puríssima água refrescante de  Hebrom, saltitar das corças do palácio...minha tenda está tão grande, tão vazia, que pensamos em ter mais um ou dois filhos para preencher tão vultuosa tenda, com a permissão de vossa alteza!


Moral da história: Tá ruim? Aperta mais um pouco, que vai ficar com saudade desse tempo, depois que a tempestade passar.

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À Imagem e Semelhança - Quem somos nós no Universo?

À Imagem e Semelhança 

Quem somos nós no Universo?


Por Paulo Cardoso (Escritor, Palestrante)

E façamos o Homem, à Nossa imagem, conforme Nossa semelhança.

Gênesis 1:26


É uma curiosidade natural de todo ser vivo que pensa, isto é, que raciocina, isto é, o Ser Humano, em desejar conhecer o que não é capaz de ver.

Como temos um par de olhos, voltados para frente, fazemos um concerto com o pescoço, que permite direcioná-los para trás, e assim, tentar encontrar o início da caminhada de nossa vida, para responder às três questões existenciais: 

"Quem sou, onde estou, e para onde vou?"

Um sábio da antiguidade, Hilel, o Ancião, repetiu estas questões, direcionando um caminho para as respostas: 

"Se eu não for por mim, quem será por mim? Se eu for só por mim, o que serei eu? Se não agora, quando?"

Ainda assim, não obtendo respostas práticas, somos levados a fazer outras perguntas sobre o dilema:

"Se fui criado à imagem e semelhança de D's, como poderei descobrir quem sou, se D's É invisível aos olhos?"

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Os Sábios do talmude dizem que D's costuma esconder-se nós, para que O procuremos. Assim como um adulto se oculta de uma criança, para que ela o procure, e ao encontrá-lo, possa externar sua alegria ao vê-lo, e tal alegria é uma via de mão dupla com O Criador e Rei do Universo.

Mas ainda assim, a pergunta: Como é D's, O Criador do universo? Que forma Ele tem? Como podemos imaginar que Quem tudo fez, possa ser resumido à forma humana?

A questão pode ser invertida, nesta leitura. Não é D's quem assume a forma humana para ser compreendido, mas é o Ser Humano que configura D's em sua ilustração mais bela.

Quem vê apenas aquilo que o olho possa mostrar, nada vê, senão como se olhasse o espelho de um lago, que mostra a luz refletida do céu, sem mostrar a profundidade e o mistério de suas águas.

Simulação digital mostra como a teia cósmica se espalha pelo Universo.

Créditos: V. Springel / Max-Planck Insitute for Astrophysics / Garching bei Munchen


Compreender a profundidade da expressão: "À Nossa imagem, conforme Nossa semelhança", pressupõe entender os pormenores da criação, e suas semelhanças nos detalhes, ma geometria, na matemática, das fractais, da sequência da Proporção Áurea, na sintonia das cores  (sete no Arco celeste), com as notas musicais (sete também), com a distância proporcional dos planetas em relação ao sol, com a espiral das galáxias, das ondas do mar, do redemoinho na parte de trás da cabeça (cocoruta), e na recente descoberta dos movimentos helicoidais do espermatozoide, que não balança o rabinho, como se pensava, mas gira em espiral, no movimento helicoidal matematicamente preciso e proporcional das árvores, da concha do mar, da proporção humana, enfim, em tudo há uma relação contínua manifestada de forma física, visível, que não deixa espaço para dúvidas da semelhança com a obra manifesta do Criador do universo.



Mergulhando um pouco mais abaixo (ou acima), vamos encontrar as cores, lembrando que na visão dos profetas, O Trono do Altíssimo, havia um arco celeste com as sete cores, e o Homem foi criado ao final do último instante do sexto dia, e como se despertasse de um sono, amanhece no sétimo dia. Não foi por acaso, como também não é por acaso que cada cor ocupa seu lugar no prisma, e a soma de todas as seis cores, resulta na sétima cor, que é o Branco, a soma de todas as cores, tão perfeita, tão completa, tão complexa, e tão luminosa.


Um novo estudo da Universidade da Califórnia em San Diego (EUA) afirmou que a estrutura do universo é bastante semelhante à estrutura e design de outras grandes redes complexas, como o cérebro humano e a internet. (Fonte: hypescience)

Vamos então falar um pouco desta relação de grandeza e mistério. 
São mapeadas cerca de 200 bilhões de galáxias no Universo conhecido. Está bem, o universo é enorme então. Vamos falar do nosso cérebro, que tem 100 bilhões de Neurônios, e cada 320 neurônios formam uma nova terminação nervosa, isto é, tomam atitude e saem a fazer coisas no pensamento, assim, segundo uma belíssima matéria do repórter da Folha de São paulo, Rafael Garcia, com base nos estudos do Biólogo e Nobel Sydney Brenner, que na década de 1960, já mapeou o cérebro,
MAPEAR A TOTALIDADE de sinapses em um cérebro é uma meta defensável como um passo importante na evolução da neurociência, mas não será fácil. Propostas para investigação do conectoma humano completo tem sido comparadas com o projeto genoma, mas basta olhar para os números para se dar conta de quão mais difícil será esse outro projeto.


Enquanto o genoma humano tem cerca de 3 bilhões de bases nitrogenadas (as “letras” do DNA), o cérebro possui 100 bilhões de neurônios. E enquanto uma célula humana abriga cerca de 20 mil genes, o número de sinapses em um cérebro é da ordem de 100 trilhões.

Em “Connectome”, Sebastian Seung mostra também como a tecnologia para mapear essas conexões ainda é extremamente lenta e trabalhosa quando comparada  às modernas máquinas de sequenciamento de DNA, que hoje operam automaticamente após o preparo de amostras.

Para fazer um mapa em 3-D das conexões entre os neurônios, é preciso “fatiar” um cérebro em lâminas extremamente finas, de 30 nanômetros (30 milionésimos de milímetro). Depois é necessário fotografar uma a uma, com um microscópio eletrônico, e “empilhar” as imagens para reconstruir a forma tridimensional.

O biólogo Sydney Brenner fez isso tudo manualmente na década de 1960 para mapear o sistema nervoso completo verme C. Elegans. Sua equipe, porém, teve doze anos de trabalho para dar conta desse animal microscópico, que possui apenas 302 neurônios e 7.000 sinapses. Para reconstruir as sinapses de um único milímetro cúbico de cérebro humano usando o mesmo procedimento, seria preciso empregar 100 mil técnicos durante dez anos.

Sem avanços na automatização desse processo, ficou claro, jamais será possível mapear o conectoma humano. Mas já há ideias surgindo.

Seung —junto de Jeff Litchman, da Universidade Harvard, e Ken Hayworth, da Universidade do Sul da Califórnia— já começaram a desenvolver tecnologia para preparar as amostras de microscópio automaticamente. Para isso, endurecem um cérebro em resina epóxi e usam um aparelho chamado ultramicrótomo, que possui uma fina lâmina de diamante, para segmentá-lo. A máquina fatia pedaços de cérebro como uma mortadela numa padaria, alinha uma a uma numa fita, e um microscópio vai lendo as imagens, fatia a fatia.

Assim sendo, e para não ser muito extenso, começo a compreender a relação entre Imagem e semelhança, não onde tentamos tornar D-s à nossa imagem e semelhança, para compreendê-lo, mas compreendendo que é no inverso desta leitura, que nós somos a Imagem e semelhança de D-s.

Não estou com isso dizendo que o desenho do mapa do universo, que ilustra o início desta matéria seja uma visão de D-s, mas que ilustra a compreensão da relação do Homem com o Universo onde habita, e não estão errados os cabalistas que dizem que o universo é um organismo único, e que o Homem espelha este Universo em sua própria estrutura física e psíquica. Sem contar aí a questão espiritual.

Mas não, o universo não é D's, e nem nós o somos. Somos criaturas, interdependentes e interligadas. Somos poeira do Universo, mas isso não nos torna seres vindos do espaço. Nós somos o espaço, e poeira da Terra, que por sua vez, é poeira das estrelas, que por sua vez, são formadas por fótons, prótons, e elétrons, iguaizinhos á nós.
O Universo não é D's, mas ´da uma vaga ideia de Sua infinitude, poder, e sabedoria;

E a parte que mais nos interessa, é seu Amor, e nos ter criado tão parecidos uns com os outros. Flores, animais, furacões, estrelas, galáxias, e o vazio da Massa Escura, que representa 95% deste Universo. O resto é 5%, e disso, não conhecemos senão o dia e a noite, que nos despertam e acolhem, permitindo que acreditemos que somos alguma coisa de importante neste cenário misterioso.

D's (Deus)*

Fontes: Clique nas imagens e links da matéria


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segunda-feira, 7 de setembro de 2020

um 7 de Setembro inesquecível de minha infância em Gramado


Foto: Arquivo pessoal (Samuel Isaac Cardoso (tio), Ester Cardoso (mãe) e Maria Elisa Dias Cardoso (Avó)´e eu.

 Éramos uns poucos, em uma vila de pobres, aquietando-se ao lado da área central da cidade, onde pulsava a vida cidadã deste lugar.

Nossa pequenina escola de vila também, uma, assim chamada, "Brizoleta", acomodava cerca de uns 40 alunos, divididos por classes em dois turnos, onde somavam-se uns e outros, à classe escolar de uma única professora primária, ela própria também, com pouco mais que isso, em seu currículo escolar.

Uns e outros, sentávamos lado a lado em classes, hoje denominadas "carteiras", onde cada classe acomodava dois, ou mais alunos, dependendo do tamanho da classe. 

Eram móveis compridos, com bancada e assento acoplados, e nesta classe, assentavam-se crianças de séries independentes, dentro da mesma aula, ouvindo a mesma professora, e assim, desenvolvíamos uma audição seletiva, enquanto ela instruía os alunos da classe mais ou menos avençada do que a nossa.

Foi neste formato que estudei até a quarta série do primário, pois a quinta série escapou de minha biografia, como óleo escoa dentre os dedos de quem o sustém, porque fiz o "Exame de Admissão ao Ginásio", e como um deboche do destine, eu consegui passar. Deboche mesmo, porque desconstruiu toda a minha formação escolar depois disso, e por fim, ao início do segundo ano do Científico, hoje EnsinO Médio, eu abandonei a escola. Tornei-me então um semi-analfabeto profissional.

Voltemos aos tempos, para que o causo prossiga.

Eram realizados os desfiles cívico-militares, quase do jeito que acontece hoje em todos os lugares. Milhares de crianças, com idade dos seis aos dezoito anos, vestindo uniformes engomados, finos, desenhados para os dias quentes do ano, eram perfilados para deleite das autoridades civis, militares e eclesiÁsticas (assim começavam os discursos), que se espremiam em uma tribuna improviSada, de onde eram um pouco mais elevados do que a plebe que marchava em passos mancos, e dali podiam rir dos infelizes impúberes, que tremelicavam de frio, para que o branco amarelado das camisas dos uniformes pudessem contrastas com as semi-desnudas acrobatas, fantasiadas de bailarinas, que com pequenos bastões enfeitados de fitas verde e amarela, saltitavam acrobaticamente na condução do cortejo.

As bandas, uma por vez, de forma descompassadamente desafinada, marcava o descompasso dos marchadores, que eram apresentados ao palanque oficial, como troféus de tributos, iguaizinhos aos que se faziam em Roma, no aparato de prisioneiros oferecidos à César e para o refestelo dos soldados ensandecidos pelo cheiro de vitória, sangue e vinho, recompensas de guerras.

Mas nem tudo era frio e tremor de queixos, pois, lembro como se ontem fosse o ocorrido, de um Sete de Setembro especial, onde todas as crianças, de todo o município, foram recompensadas, com deliciosos e abundantes lanches para almoço, e o melhor ainda viria à tarde, com a exibição absolutamente gratuita de um filme dentro do Cine Embaixador (ainda não me conformo com o nome de "Palácio dos Festivais" que deram ao lugar).

Nos espremíamos no chão, para que todos ficasse, acomodados, e o filme começou. Lembro sim, lembro bem do filme: "Cindy, a Trapezista", ou algo no gênero, um filme do Zé Colmeia e sua esposa, digo, namorada, a ursinha Cindy, que foi capturada por um circo, e obrigada a pedalar um monociclo em uma corda bamba muitos metros acima do chão.

Lembro dos curta-metragens de abertura, mostrando a exuberância das flores de Gramado, belíssimas papoulas alaranjadas, que atapetavam os canteiros da rua principal, alcatifando nossas lembranças por perfumes e a suave música de orquestra e saxofone que preenchia todos os lugares escondidos de nossas memórias.





Era Sete de Setembro, e celebrávamos a festa da pátria. Não nos envergonhávamos de chamar nossa terra de pátria. Nem de sonhar-se dentro dos cenários imaginados pelos ilustradores do filme, que traziam até nossas memórias mais doces, a suave melodia de uma primavera, lá e cá, que precisamos trazer de volta urgentemente.

Navegar é preciso, dizia Camões.]

Sonhar é mais que preciso, dizia a vida que nos chamava para seus perfumes.







Kikito - o "deus do bom humor" acordou azedo


Imagem: Institucional Prefeitura de Gramado

Eu digo a vocês, respondeu ele; se eles se calarem, as pedras clamarão.... Lucas 19:40.

"Então falou Deus todas estas palavras, dizendo:

Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão.

Não terás outros deuses diante de mim.

Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.

Não te encurvarás a elas nem as servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos, até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam.

E faço misericórdia a milhares dos que me amam e aos que guardam os meus mandamentos."

Êxodo 20:1-6

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Eu conheci, e convivi com Elisabeth Rosenfeld, e estive próximo à ela nos dias em que modelou o primeiro "Kikito", uma peça moldada com uma mistura de cimento Portland, com cimento branco, sobre uma armação de ferro de construção e arames retorcidos. Este é o conteúdo da divindade, e de ferro e calcário é todo o seu ventre e coração. Nada mais.


Já sua alma, essa sim, é retratada pela efígie de um sol no lugar da cabeça, que lembra o deus romano "janus" (daí o nome do mês de Janeiro, que tem uma face voltada para o passado e outra para o futuro)., sobre um corpo humano feminino, mas ao objeto foi dado um nome masculino, e uma identidade exclusiva de pessoa dotada com alegria, caracterizada pelo permanente sorriso em ambas as faces. 


Desta forma, não foi dada ao Kikito, a possibilidade de resignar-se diante das variáveis da vida, e em algum momento de reflexão, chorar por quem dobram os sinos. Nasceu assim o primeiro "deus" sem vontade própria, pois até mesmo as divindades dos panteões pagãos pelo mundo afora, são dotadas de humores, que variam da bondade, à extrema crueldade.

O "deus do bom humor" de Elisabeth era um objeto para enfeitar um jardim, assim como os anões de porcelana, ou o velho carrinho de mão com flores plantadas dentro dele.

Elisabeth já não existe mais, e até mesmo suas lembranças se dissipam na memória dos que adentram os anos pela vida afora, ao encontro do descanso que não deixa ninguém à espera. Quando tiver que chegar, ele vai chegar. Menos pro "Kikito", o "deus da boa fama" que Gramado venera.


Ao longo dos anos, semelhante à outro personagem da mitologia, isto é, a ciência do imaginário, da mentira bem contada, o Rei Midas, que transformava em ouro tudo em que tocava, e que teve por consequência ver sua própria filha transformada em uma estátua de ouro 18k, de pureza 99,999, Gramado também soube beneficiar-se dos poderes "divinos" do "Kikito", e a velha estátua mal desenhada, com coração ausente, e fez cintilar com abundância, as ruas e casas de um Olimpo serrano, cujos deuses se esbofeteiam pelo privilégio do primeiro devoto de cada manhã, e se refestelam, ao entardecer, pelo visco da baba que escorre por suas sarjetas, destinadas à abençoarem as águas dos arroios que levam todos os dejetos devolvidos pelas bênçãos gastronômicas aos devotos da divindade que sorri, ao profundo e misterioso mar das vaidades.


O "deus do bom humor", no entanto, tornou-se um deus infeliz, pois o "smile", precursor dos "emojis", que sempre sorri, e apenas sorri, hoje continua a sorrir, ainda que não se saiba a razão, quando seu trono foi derribado (não, eu não errei, é deribado mesmo, com "I") à outro ser coroado, que não tem boca para sorrir, mas tirou o sorriso de milhões de pessoas, cujos lábios finos do "kikito" não foram capazes de salvar.

O "deus do bom humor" tomou lugar de destaque diante do Pavilhão Nacional de primeira ordem, no dia em que é celebrada, com dor e descaso, a independência da nação, cujo D-s, é "O Senhor", e ainda que retirando a divina ordem de não celebrar culto, nem prestar louvor à deuses estranhos, continua sorrindo, ou talvez rindo, da credulidade vazia de quem se estriba nele para alcançar sucesso.


O "deus do bom humor" acordou azedo, mas não mal amado, posto que em sua homenagem se erguem panteões e monumentos, e que à entrada do grande templo a céu aberto em seu louvor, ladeiam as bandeiras da pátria e da cidade, demarcando para as gerações que talvez virão, que este lugar é mais que um conglomerado de pessoas vivas, mas é a terra do berço de um deus que nasceu morto, mas ainda assim sorri.

Não é exagero, mas eu mesmo já vi uma pessoa rezando diante de uma dessas estátuas, que ficava defronte ao Palácio dos Festivais, à época, chamado de Cine Embaixador. Fiquei escandalizado com a cena. 

Ai, pobre de mim, se soubesse , que aquele símbolo fosse se tornar a pedra de tropeço do portal que abre as bênçãos prometidas aos que guardem as orientações do Decálogo, que falam de honrar os pais, respeitar a propriedade alheia, não macular o leito de outra pessoa, não produzir "fake news, não misturar água com açúcar no vinho, não exagerar na verdade, mas como conhecerão todas estas Leis, se já à primeira, que faz reconhecer que O Criador do Universo seja louvado por uma estátua que se ri?

Haverá um dia, num longínquo futuro, onde arqueólogos encontrarão suas estátuas junto à outras e concluirão que houve uma civilização, com suntuosos palácios, que adorava um deus que sorridente, era chamado de "Kikito".





sexta-feira, 4 de setembro de 2020

As histórias que vivemos, mas só contamos depois

 




História é a parte do tempo que está guardado nas lembranças: nossas e de alguém.

História é o que aconteceu, nunca o que acontece, nem vai acontecer.

História é a parte de nossa vida que guardamos para deixar de testemunha das nossas dores. É o presente escondido para tornar-se vivo no futuro, ao falar do passado.

Nossas dores não as contamos enquanto doem. Isso nos humilha, nos rebaixa. Nos reduz à fracos, a covardes.  Retrata nossa insignificância e nossa pequenez, que em lugar de lutarmos, transferimos a outrem a nossa amargura presente.

Daí perguntar-se: Como vai? E mecanicamente responder: Vou bem!
Mas não vou bem,eu, e nem você se interessa em saber como eu vou. Já tem suas dores, suas amarguras suas frustrações, seus próprios tropeços para levantar-se.

Ninguém está preparado para ouvir nossas frustrações, porque dessa forma, fica na obrigação de devolver-nos a confiança e contar as suas, desnudar a fraqueza, e arrepender-se amargamente depois.

É perigoso confiar, e mais perigoso ainda receber confiança. 
Nos tornamos responsáveis pelos segredos de alguém, e isso é tremendo. 

Não choramos no momento da dor diante dos outros, mas guardamos o choro para contar depois, como história, como testemunho. Mas de que adianta não chorar, se nossos olhos contam outra coisa sobre o que dizem os nossos lábios?

Nos envergonhamos pelo momento de fraqueza, mas nos orgulhamos por tê-lo atravessado, quando estamos longe dele. O tempo é nosso aliado, mas às vezes o tempo é também nosso algoz.

Quão bom seria se pudéssemos acelerar a vida durante a dor, e retardar durante o prazer.

]Quão bom seria que nada nunca doesse. Mas dói, e dor é dor, onde cada um conhece a intensidade da sua. Dor não se compara,e muito menos se atenua comparando à dor alheia.

Saber que crianças morrem de fome na Etiópia, é triste demais. Saber que aquilo que você sente nesse exato momento, mas sente-se agora constrangido por saber que há outras dores, é triste igual, pois não bastasse sua dor, há agora a dor adventícia, impregnada, impondo uma culpa que você não tem, e você perde a coragem de externar aquilo que lhe faz sofrer.

Por isso, não é bom contar sobre seu sofrimento no exato momento em que sofre. Deixe pra depois. Deixa pra contar numa ocasião em que possa rir daquilo que lhe fez chorar. Escondido.

Ad histórias que contamos muito tempo depois que se passaram, tornam-se quase fábulas, memórias românticas, tema de um bom livro de aventuras, onde você passa de frouxo a herói, e a diferença é o tempo de hibernação, de sedimentação, de fermentação, de maturação, ainda que seja em meio à dor.

Agora, o que dói, deixe doer. É apenas dor, posto que depois da dor vem o silêncio, de quem sentiu dor, e do vazio de quem ficou.

Seja o que for que aperta o peito, segure firme. É mantimento para sua própria história, que alguém um dia vai contar.






O que pensa o eleitor, e o que pensar do eleitor?

Imagem: Nenhum candidato foi mauito massacrado neste ensaio.

O eleitor é um indivíduo sinistro. Sei por mim, pois eu sou eleitor. Não que eu seja, assim, um eleitor profissional, não, não sou. Sou amador nesse negócio de escolher pessoas, e posso provar o que digo, de tanta furada em que já me meti, elegendo cada tipo, que dá vergonha só de pensar. 

Mesmo assim, acho o eleitor um sinistro. Sinistro legal, tenho que reconhecer, pois quem aguentaria os mesmos abraços, as mesmas galinhadas nas reuniões do partido, e as mesmas promessas mentirosas tão comuns nas campanhas, e mais que promessas que caducam em poucos dias, os mesmos discursos decorados, o mesmo narcisismo, e o mesmo aperto molenga de mão viscosa. Então, isso tudo se deve ao carisma que o eleitor tem com o tempo em que vive: a campanha!

Eleitor é louco por campanha, pra fazer bullying com os políticos. Ao contrário do que se pensa, eleitor não odeia políticos. Os adora! E tem sua dose de razão nisso, pois campanha política é tempo de fartura, de promessa de felicidade e fortuna, de esperança em boas casas de saúde, ruas douradas e pavimentadas com pérolas, e escolas onde o ensino é feito em permanentes festas com comida em abundância, e bebidas alcoólicas que não deixam bêbados seus beberrões, nem engordam as guloseimas, aos comensais. Um Éden, é só o que eu posso usar como exemplo, o tempo da campanha.

Campanha é o momento em que os pensamentos afloram, do outro e do um: Eleitor e candidato, ambos entrelaçados em uma mistura de amor e ódio, tapas e beijos, pauladas e pétalas. É o embate entre titãs, onde espremem-se até que pingue a última goita de néctar de cada um, ao que denominam de "voto".

Ah, o voto, esse sim vale a pena, e muito. Votar em quem odiamos, só para termos o prazer de esperar quatro intensos anos, até que o candidato volte à nossa casa, como ar de muxoxo, o que em si já é falso, mas necessário.

O eleitor vê no candidato um saco de pancadas para suas frustrações com a vida política e pessoa. Já o eleitor vê o candidato  como uma válvula de descarga da miséria humana, embrulhada em pacote do poder.

O candidato veste uma capa de herói e uma máscara de santo, e o eleitor vesta um manto de santo, e esconde-se sob uma máscara de complacente. Um e outro não se suportam, mas se amam com invejável intensidade, e só no tempo de campanha é que conseguem ser verdadeiros. Separar amor é ódio e cantarolar odes em louvor aos quais odeia. 

Candidato e eleitor são como dois gladiadores prisioneiros por circunstâncias de pátria e aldeia, que durante os dias comuns, convivem na mesma jaula onde são tratados como feras cativas, e que sua libertação não se dá nos campos livres para que percorram de braços com a liberdade,mas em uma grande arena lotada, onde lutam até à morte, para delírio da multidão, onde estão eles próprios, por seu turno, ovacionando outros que lutam e tombam, em nome do que chamam de democracia.

Não existe democracia alguma. O que existe é o desejo de uns brilharem, onde os outros são o estribo, pescoço, e degrau, e o alto do pódium é um pico sem corrimão, onde apenas uma leve brisa é capaz de mostrar quão frágil é sua força própria. O pódio não é lugar de multidão. É a última instância da solidão.

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Laodicéia é aqui - A hipocrisia que rasteja pelas igrejas

  "A igreja de Laodicéia é mencionada no livro bíblico do Apocalipse como uma das sete igrejas da Ásia Menor. Ela recebe críticas sever...