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sábado, 27 de janeiro de 2024

O Bicho da Goiaba - A dor que adoça



Imagem: AI Bing*

"Amós respondeu: “Não sou profeta e nunca fui treinado para ser profeta. Sou apenas um boiadeiro e colhedor de figos. Mas o SENHOR me tirou de junto de meu rebanho e disse: 'Vá e profetize a meu povo, Israel".Amós 7:14-16 

Ouvi, com certa curiosidade a explicação sobre o que o texto dizia, a respeito do profeta Amós: Fazendeiro e "colhedor de figos", e pensei cá nos meus botões: "Por que o autor bíblico tem a preocupação de encaixar um fato tão insignificante na narrativa? talvez para acentuar sua pobreza? Ou dizer que o profeta tenha sido um agricultor coletor? " Não sei, isto é, não sabia. Então aprendi nessa ocasião que "colhedor de figos era uma função adequada à tarefa de "adoçar" uma espécie de figo selvagem, vendido aos pobres, ou pelos pobres.
O que acontecia era o seguinte: O coletor fazia um pequeno corte em cruz , ou um furo, na parte terminal do figo, a parte oposta ao Pedunculo, a haste que fornece nutrientes à flor, e depois disso, à fruta, até sua maturidade. Tal corte, ou furo, permitia que uma pequena mosca pousasse ali e depositasse seus ovos, e estes, ao eclodirem, geravam penas larvas que cresciam ali à volta da fruta, no espaço entre a casca e a polpa, o que acontece com outras frutas também (o afamado bicho da goiaba é um destes), fazendo com que a fruta produzisse enzimas de proteção, cheias de açúcares, indesejáveis aos invasores, e aqui não me estendo mais na explicação, já que não entendo nada de biologia ou química, mas foi isso o que ouvi. Satisfeito, segui a vida, sem me preocupar com os figos de Amós.
Anos mais tarde, havia duas goiabeiras serranas (Feijoa Selowiana), sendo uma delas plantada por mim, detro do meu terreno, e outra, muito antiga e frondosa, no terreno de um vizinho que tinha ojeriza por crianças e vizinhos, e mais ainda pela ideia de que alguém lançasse um olhar desejoso à qualquer uma das frutas de seu matagal composto de frutíferas, cujos frutos eram apreciados apenas por ele. Porém, um galho muito grande desenvolveu para o meu lado da cerca, porque era aberto e penetrava muita luz solar, o que favorecia a floração e frutificação, o que não ocorria do lado dele, uma vez que era sufocado pelas demais árvores.
A minha goiabeira produzia belas frutas, mas eram bastante ácidas. Já a do vizinho, mas dentro do meu terreno, portanto de minha propriedade o que ultrapassasse a cerca a meu favor, por serem de uma árvore mais antiga, adaptada ao solo, e sei lá por que outras razões, eram mais doces, muito mais doces.
E como sou neto de Maria Elisa, debochada que só, eu via o vizinho grunhindo palavras mescladas com baba de palheiro, algo que me parecia ser um rogo de pragas, algo assim,  e o cumprimentei. Aí peguei uma cesta e comeceu a colher goiabas, no meu lado da cerca, e como sou educado, ofereci umas pra ele, que muito pistola, duzentos por cento putaço, agradecia e saia de perto pra chorar escondido.
Deixa estar, que comedor experiente de goiabas pelos matos, e lembrando das palavras da Bíblia acerca de Amós e seus figos, pensei: "E se o mesmo acontece com as goiabas, já que aquelas que estão caídas, já tem bichos nela, quando se retira as larvas próximas à casca, aquilo que sobra por dentro, é uma polpa quase transparente, perfumada, como um gel e doce, muito doce?" E era mesmo. Passei a procurar estas goiabas dali pra frente.
Mas não termina aqui.
O mesmo, observei com as frutas machucadas que cicatrizam a parte danificada, sem estragar, percebi que tirando com cuidado aquele machucadinho, a parte mais doce da fruta é aquela que cercou a ferida, criando enzimas de proteção (essa parte eu perguntei a um biólogo, que confirmou, que as enzimas são criadas pela fruta e não pela larva). Gostei, e também adotei isso ao escolher frutas. Mas a gota d'água desse ensinamento foi quanto aprendi que devo comprar abacaxi verde, cortar a coroa, lavar bem, e emborcar a fruta dentro de um pote durante tres ou quatro dias, para que os açúcares desçam, por gravidade, disseminando-se pelo restante da fruta. Pensa num abacaxi bem doce e saudável esse.
Daí, descobri, por vivência própria também, que à medida em que as dores da vida, os tropeços e percalços em nossa vida, elas são comparáveis aos machucados da fruta, ao abacaxi emborcado, e ao bicho da goiaba. Sabendo separar a cascas dos invasores, e aproveitar a polpa, a vida torna-se muito doce.
Acontece comigo, o tempo todo.

Pacard
Escritor - Designer

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