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quarta-feira, 26 de abril de 2023

A Ditadura, Os Estudantes, Gramado, e Eu

Foto: Silvano Haas (Entrega do Troféu Ilha de Laytano, e o dia do meu primeiro discurso à todos os alunos, no Cine Embaixador, Dezembro de 1976) Sou o primeiro, assentado, à esquerda. Ao meu lado, Nailor Balzaretti, Professor Francisco, ao seu lado, não sei quemm é, Dante de Laytano, Irma Peccin, Marilia Daros Franzen, Esdras Rubim, de pé, o Diretor José Staudt, e dormindo, lá no canto oposto, Romeu Dutra.

Pois confesso o que já é amplamente despercebido: esta é a primeira vez que eu escrevo sobre os tempos de Movimento Estudantil em Gramado, e meu estado de coisas neste ambiente sinistro e maravilhoso.

Meu intróito neste ambiente da política estudantil começou lá por 1976, quando cursava alguma coisa entre o Ginásio e o Científico, não lembro direito, e isso nem importa também, mas o que interessa é que minha turma na escola noturna era bem pequena, uns dezoito ou vinte alunos no máximo, gente boa demais, amigos até hoje (os que ainda perambulam pela vida), onde não éramos amigos apenas, mas quase irmãos mesmo, tamanha a amizade do grupo.

Foi nesse tempo, que o Grêmio Estudantil Machado de Assis estava em processo de organizar a eleição para o comando da entidade, e nesse tempo, os Grêmios Estudantis eram o último redutos da juventude para extravasarem sua ânsia pela política nacional, posto que era proibido aos estudantes a manifestação na política partidária, e nesse tempo, os Diretórios Acadêmicos Universitários estavam fechados pelo governo militar, e a UNE estava lacrada e cercada por soldados armados até os dentes, à espera de algum "fura-fila" que ousasse romper o lacre e entrar na sede da entidade, e enfiá-lo num camburão para levá-lo a um passeio pelos porões do DOPS (Delegacia da Ordem Política e Social, o departamento de repressão e em muitos casos, senão a maioria, tortura e pau-de-arara mesmo), para uma nada gentil conversa com algum delegado cercado com umbando de sádicos, que não tinham a menor ideia a respeito dos debates políticos que perseguiam, mas tinham a força e o prazer de divertir-se com os gritos dos torturados. Assim, os estudantes universitários trancavam suas matrículas nos cursos, e se matriculavam no Ensino Secundário, para arregimentarem prosélitos, e disfarçadamente manterem o movimento estudantil vivo.

Foi nesse ambiente que eu comecei. Eu não era e nunca fui ativista político. Não sabia nada da política nacional, além do que ouvia pelos amigos, geralmente em rodas de piadas, onde o estúpido era o general de plantão no poder, e a piada girava em torno de ideologia política, as mesmas de anos anteriores, onde só se trocavam os personagens. Este era meu conhecimento da política, nada mais. Não fazia a menor ideia do que fosse o movimento estudantil, e muito menos tinha pretensão de envolver-me com isso. Porém, como sempre fui comunicativo (alguns antagonistas davam o nome de "inxerido e petulante". Vá lá que seja, assim eu era, e por ser inxerido e ansioso por pertencer ao grupo, já que eu era péssimo no futebol, fator que favorecia o fortalecimento de amizades, e por ser um perna de pau, eu não era convidado para formar time com ninguém, e por isso e outras coisas mais, tornei-me um excluído social. Então, a única forma de entrar em uma porta quando não abrem pra você, é meter o pé e entrar assim mesmo. Isso te torna inxerido e petulante. Que seja.

Como dizia, o Grêmio Estudantil nesse tempo, estava sendo movimentado para a eleição, e era sempre a chapa da situação quem vencia, porque seus integrantes faziam parte, tanto dos movimentos esportivos da cidade, quanto da elite política, que os motivava a que se mantivessem no comando da juventude de cabresto. E fui então procurar o então presidente da entidade, um sujeito maluco de atar em poste, cujo prazer era vestir-se de Papai Noel, próximo ao Natal, e sair com uma vara de vime de dois metros de comprimento dando varadas nas pernas da piazada, por onde passava. Esta era a liderança da juventude política deste tempo e lugar.

Num desses ímpetos arroubos de humildade invasiva, fui procurar o maluco e disse a ele que eu gostaria de ser incluído na próxima chapa, num cargo, tipo qualquer mesmo, para pertencer ao grupo, participar, correr de um lado a outro nos eventos da entidade, enfim, queria estar junto deles, e ele me respondeu, com ar de superioridade:
- "Fica tranquilo, vamos te arrumar um carguinho na chapa (que tinha cerca de 30 pessoas)!!
Ah, como eu fiquei feliz, e fiquei à espera de ser chamado, o que nunca aconteceu.

Entre muitos amigos, eu era (e ainda sou) grande amigo de um sujeito de baixa estatura, de fala mansa, observador, meio debochado, mas um excelente estrategista político, que durante os intervalos das aulas, quando todos ficavam tagarelando e andando de um lado a outro, ele sentava-se, de pernas cruzadas, e lia o jornal atentamente: o Eduardo Barros! Então, cheguei pro Edu e disse que deveríamos montar uma chapa para concorrer, e que ele, Eduardo, deveria ser o Presidente, e que eu o apoiaria, buscando votos dos alunos. Minha esperança era pelo menos ter um lugar no grupo para colaborar, nada mais. Eduardo olhou pra mim com a cara seria e disse:
- "Sim, vamos formar uma chapa, mas o presidente vai ser tu!"
- "Eu?" Fiquei estupefato, aquilo era irreal, eu não tinha a menor condição de vencer uma eleição com mais de mil alunos, um desconhecido, insignificante, pobre, filho de mãe solteira. Nem pensar!
Eduardo insistiu e disse: 

-"Monte a chapa! Escolha alguns membros, poucos, e vaou te inscrever como candidato!"

E assim foi. Mas um dos segredos de vencer uma eleição, é ter aliados, e como a chapa da situação já estava formada, contando com mais de 40 pessoas, naturalmente já haviam escolhido todos os formadores de opinião, líderes, e alunos mais populares, para composição desta chapa, e desse modo, ninguém queria entrar na competição contra eles, e eu ia de pessoa em pessoa, até que finalmente consegui formar um grupo mínimo, com os componentes exigidos pelos estatutos, elegíveis, isto é: Presidente, Tesoureiro, Vice Presidente, e Secretário. E lá fomos nós: Presidente, eu, Paulo Cardoso; Vice, Marlene de Oliveira; Secretária, Edelgarth Ramm, e Tesoureiro, Sergio Teixeira, que era o mais maduro do grupo, e trabalhava em um banco, então ninguém melhor para cuidar das finanças do grupo.

Começamos o périplo pelas salas, pelos corredores, pela calçada da frente, apresentando nossas propostas, mas sem nenhuma esperança de vencermos, apenas pela adrenalina da campanha já estaria bom. Minha avó, muito religiosa, dizia: 

- "Não posso orar para que venças. Mas oro para que tenhas sabedoria!"

Chegou a eleição, e minha pequena turma foi proibida de abandonar a sala para votação, pois estavam em prova. O professor era a favor dos oponentes. Acontece. Perdi 17 votos então. Em outra sala, ao lado, também não recebi nenhum voto, porque a líder de turma era uma freira que me odiava, porque descobriu que eu não era católico, depois que eu havia feito diversas vezes a leitura dos Evangelhos na missa, a convite dela, porque gostava da minha dicção, e aí disse que iria me incluir na liturgia, que eu achei interessante, pois a grande maioria dos meus amigos era católica, eu era amigo dos padres, e não via nenhum problema de estar entre amigos, contanto que não tivesse que fazer coisas contra os meus princípios, as ler um trechinho da Bíblia, por que não? Mas quando contei isso, a freira botou os óculos de ver a verdade e me viu como o anticristo, o que alimento nela ódio infernal e perpétuo. Assim, nesta sala também, não recebi nenhum voto. Tristeza, pois voto é voto. E a terceira sala onde não recebi nenhum voto, foi a sala do meu oponente. Lá também eram unidos, e me deixaram no esquecimento. Então, já perdi cerca de 60 votos nestas três salas. E foi só, pois venci por larga margem em todas as demais salas, fazendo 832 votos contra cerca de 300 do meu adversário. Foi uma lavada! Porém, ainda faltava uma coisa: Compor a equipe de gestão, eu precisava de uns vinte integrantes mais ou menos, e naturalmente, o primeiro convidado foi o Eduardo Barros, que não aceitou, apenas se dispôs a companhar-me como conselheiro. E foi. E como fiz para juntar esse grupo todo? Simples: Matar dois co...(ops, não pode né)brócolis com uma tesourada só! Convidei todos os integrantes da chapa derrotada para trabalheram comigo, e apenas dois não aceitaram, incluindo o candidato a presidente e outro amigo meu, que não sentiu-se confortável em aceitar. Assim, acabei com a eventual oposição, e ao mesmo tempo formei uma equipe experiente para a tarefa.

Vou pular a parte da gestão, e voltar à política nacional. Pois logo no inicio do ano seguinte, veio o convite da UGES (União Gaúcha dos Estudantes Secundaristas) para que eu fosse com eles, participar de um congresso nacional de estudantes, em Curitiba, e não é preciso dizer que me senti o verme do cocô do cavalo do bandido lá entre aquela militância profissional universitária fantasiada de secundarista, mas mesmo assim, fiz meu discurso, no último dia. Confesso que não lembro de uma palavra que disse, de tanto que eu tremia, porque havia um sujeito rechonchudo, crespo, com óculos tipo fundo de garrava, empunhando um gravador, com microfone apontado pra mim. Não era um estudante nerd que queria repassar as conversar para tirar lições, nem um jornalista, cobrindo o evento. Era um agente da DOPS, com o pé que era um leque para pegar no pulo um incauto que deixasse escorregar uma palavra solta de interesse dos generais.

Conheci, neste encontro, os ex-presidentes da UGES, entre eles um que me tornei amigo e era grande admirador, Alfeu Bisaque Pereira, que tornou-se Juiz de Direito e hoje advoga, lá no interior do Rio Grande do Sul. Outro, de quem me tornei rival, Gilberto Barbosa de Oliveira, o Gica, baixinho e bem falante, um orador aguerrido. E outros de vários estados do país. E para cada grupo de cada estado, um agente da DOPS de tocaia.

Voltando à Gramado, a principal atribuição do Grêmio Estudantil não estava ligada á política nacional ou partidária, embora, endo eu militante da oposição aos militares, sem estar filiado ao MDB, tornei-me o queridinho dos palanques e poucos dias depois houve eleição, onde o candidato deste partido venceu, coincidentemente com o mesmo número (ou muito próximo disso) de votos de diferença do candidato da ARENA, e claro, o guincho das raposas velhas me emboscou, pegou pela vaidade de um menino de 18 anos, ainda deslumbrado pelo fulgor da vitória esmagadora. Tornei-me um ícone da juventude opositora, sendo que, mesmo estando no que chamavam de "esquerda nacional", até hoje eu nem sei o que quer dizer "esquerda ou direita", e nem faço questão de aprender. mas fui rotulado de "esquerdinha, comunista, socialista, gremista (sim, isso eu sempre fui, gremista, etc). E neste rufar de tambores, fui levado para a Secretaria de Turismo, na condição de aspone do secretário (isso eu já contei antes).

Porém, o título de líder dos estudantes não foi benéfico pro meu mandato. Por exemplo: como fazíamos muitos eventos esportivos e sociais entre os estudantes, escolha de rainha, princesas, campeonatos, teatro, etc, cada vez que havia um evento, eu era obrigado a apresentar-me ao delegado de polícia local, mostrar à ele os cartazes, os quais ele olhava contra a luz, dobrava ao meio, examinava com lupa, pra ver se não havia nenhum manifesto comunista criptografado no desenho. Penso que nunca encontrou nada, pois me mantive fora do camburão, cuja sorte de conhecidos meus, fora de Gramado, não era a mesma. Nesse tempo, eu não tinha carteira de identidade. Não era comum tê-la, e meu único documento era a carteira de Presidente dos Grêmio Estudantil, e é com ela que eu ía à Porto Alegre, e uma vez, atravessei um piquete de estudantes que confrontava a polícia de choque em frente  à Assembléia Legislativa, e no bolso, a carteirinha azul... adrenalina pouca é pra fraco, minha gente.

Mas querem saber se eu senti os efeitos da ditadura na minha vida? Ah, como senti! Por não pertencer à elite do comando econômico local, ao ser eleito, fui cooptado por empresários ligados aos militares, que me ofereceram empregos dos sonhos, com salarios dos sonhos, mas havia uma condição: eu deveria "mudar a camiseta", aderir ao partido deles! Ora, diga isso a um jovem aclamado pelos seus, no auge da glória de vento, para que el se torne um traidor de suas ideologias e de seus amigos, e espera a resposta que terá. Não aceitei! Certo, então. Nunca fui preso, mas nunca mais tive oportunidade de um bom emprego,de bom estudo, de uma carreira. Claro que tive bons empregos, fiz carreira em outra direção, mas sem dever favor nenhum aos que me perseguiam. Tomei conhecimento, muitos anos depois da exist~encia de um "Caderno Preto", onde constava a lista de pessoas com quem não se podia fazer negócios, e a pessoa abriu o caderno, mostrou o meu nome, riscou ele, porque naquele momento eu havia entrado nos interesses do grupo, aind que fosse por capacidade profissional e não ideologica e não tive que me ajoelhar, mesmo proque as pessoas eram outras nesse tempo e o passado foi guardado no passado, mas ninguém me contou sobre o livro. Eu vi!

Um dia, alguém me perguntou: 

- "Paulo, por que tu nunca "deslanchou" em Gramado? (Deslanchar, era circular nas rodas altas , enriquecer, coisas assim). Respondi: Porque tenho caráter e não negocio com meus princípios!

sábado, 8 de abril de 2023

Os vazios de nosso envelhecer - Os desafios do Século XXI


Amadurecer é como fogo em madeira verde: Muita fumaça e pouco calor. Os anos passam, e assim, como a lenha verde, que evapora toda a água e transforma-se em brasa, também a maturidade acontece, e nossas ações são desejadas, porque podemos servir com toda força que mescla juventude e experiência. Os anos passam, e assim como a lenha que é brasa viva, nossa utilidade é necessária para o desenvolvimento da sociedade. E por fim, poucas brasas, aconchegando-se na cinza, para perdurar seu calor, é o que resta do calor que um dia derreteu o aço. Então, as primeiras gotas de chuva açoitam as cinzas e acertam as brasas, que sublimam em um vapor branco e suave, que em nada lembra a densa nuvem das primeiras chamas, lá no princípio da vida adulta.

É no envelhecer que se percebe que ser ignorado já não importa mais. Já não se luta mais por espaço no mundo. Já não se desejam mais conquistas, fama ou poder. Basta a quietude das manhãs, quebrada pelo vento e pelo trinar do passaredo. Basta o ruidoso canto do crepúsculo retinindo nos ouvidos, ora surdos, ora sensíveis a qualquer estampido repentino.

É no envelhecer que se percebe que aquilo que pensamos ser sabedoria, torna-se impertinência para quem, em nosso entender, necessita de conselhos, e que no calor de suas próprias chamas, foge da pretensa sabedoria de quem não foi capaz de driblar a juventude, e como castigo, envelheceu.

É no envelhecer que a solidão torna-se a melhor companhia dos dias, e a dor, a parceira fiel das noites. É no envelhecer que ouvimos o silêncio como se fossem gritos de desespero, ou paradoxalmente, como uma sinfonia lenitiva. É no envelhecer que cada silêncio é organizado e saboreado. 

É no envelhecer que nos tornamos transparentes, translúcidos, irritantemente insignificantes. É no envelhecer que descobrimos que o tempo acelera morro abaixo. O Século XXI é o século dos silêncios encapsulados entre  nuvens quânticas, onde cada ponto que brilha, encerra um ponto que se apaga. O silêncio neste andar dos primeiros passos do século em curso é o combustível para o reflexivo caminhar da solitude anciã.

É no envelhecer que somos capazes de discernir as diferenças entre o que é aventura, e as consequências de aventuras inconsequentes. É nas consequências das grandes descobertas e invenções dos séculos recentes, que chegamos ao Século XXI com a mais completa das incertezas: Quando  nos tornaremos sombras liquefeitas pela sociedade que ajudamos a moldar à nossa imagem e semelhança?

Quando nós, enquanto já sombras inertes projetadas pelas luzes que nós mesmos acendemos e as utilizamos como se fossem nossos próprios brilhos, e por fim, descobrimos que não havia em nós brilho algum, assim como não há corpo em uma sombra, que depende de outro corpo e de outra luz que se projete sobre uma superfície, e nem mesmo esta superfície podemos ser, senão a falta de brilho que desliza se contorcendo entre a planura e depressão do chão que não sente mais nosso peso ao andarmos?

O Século XXI multiplicou os desafios de adaptação aos tempos em quantidade infinitamente superior aos séculos precedentes. A tecnologia tornou-se parte de nosso DNA, o que não traz nenhuma novidade à quem conhece os escritos sagrados do profeta Daniel, que dizia: "Tu, porém, Daniel, cerra as palavras e sela o livro, até o fim do tempo; muitos correrão de uma parte para outra, e a ciência se multiplicará."Daniel 12:4. Assim, o que não é novidade, não deixa de ser espantoso, de causar estupefação, por ver profecias se cumprindo diante de nossos olhos, em nossas casas, em nós mesmos. Somos a geração que sabe, ao mesmo tempo, que dias maus sempre chegam no entardecer da vida, também sabe conviver com a vida digital, aquela vida paralela que se oculta e se mostra atás de pontos luminosos em nossa tela de computador, e as chamamos de "Redes sociais", de portal virtual de acesso às vidas de pessoas que não podemos tocar, abraçar, sentar para tomar um mate (ou café, ou suco, ou água, ou dividir uma fatia de bolo, um biscoito, um pão), mas podemos conhecer-lhes a alma, os sentimentos, podemos compartilhar orações, desejos, disseminar a raiva, odiar o ódio, ou fazer valer a nossa vontade. Ainda que sejamos velhos, somos vivos e podemos viver cada centelha de vida que carregamos em forma de corpo, de alma, de sentimentos.

O Século XXI em sua essência é exatamente igual ao Século X antes do cristianismo, ou ainda antes, alguns séculos ou milênios, porque também por este mesmo mundo, perambulavam pessoas que tinham fome, sede, amor, compaixão, ódio, ganância, medo, ou coragem. Casavam e tinham filhos. Lutavam suas lutas e morriam suas mortes, e no seu entardecer eram reverenciados como sábios, e isso sim, perdemos, porque o multiplicar das ciências popularizou e capilarizou a sabedoria falsa, chamada de conhecimento, de ciências, de entendimento. Essa é a única diferença de nós com aqueles que viveram muito tempo antes: O tempo que tinham livre tornava-se o sol que amadurecia o conhecimento, e assim, digerido lentamente, era transformado em sabedoria.

Sabedoria não é dominar o átomo ou a pólvora, mas saber empregar um e outro conhecimento para o bem maior, o bem estar de cada ser vivo, de cada ser pensante, rastejante, ou emissor de oxigênio, metano, ou carbono, a saber, dos Homens, dos animais, dos vegetais, e até mesmo dos minerais, que juntos sustentam o ciclo da vida.

O Século XXI está passando tão rápido, e ainda nem esfriou o perfume do século XX. Os ventos ainda nem dissiparam os olores da morte, das guerras, da fome, das pestes, antes, fizeram de tais odores, sementes que brotam e rebrotam a cada dia, hoje, com o domínio do saber que fertiliza tudo, para o bem e para o mal.

O Século XXI voa para trás, mas para nossa esperança, forma o vácuo que puxa o futuro com mais celeridade, e neste futuro antagônico, que traz ao mesmo tempo, e pelo Mesmo Personagem, a esperança e o desespero, é o lugar onde, no tempo presente, podemos ainda refletir sobre O que Foi, O que É, e O Que Será. Ainda se pode refletir sobre Quem queremos ser nesse abraçar de tempo e de esperança.


segunda-feira, 3 de abril de 2023

Pétalas - Pacard

1 – Os Ventos
Sempre ouvi dizer que a sabedoria morava junto ao silêncio, e resolvi então buscá-la.
Levantei bem cedo, pois o primeiro silêncio anda junto da aurora. Andei no rumo do sol e perguntei à brisa que me acompanhava:
- Conheces a sabedoria?
- Dela ouvi falar!- Respondeu-me. 
- Por que a buscas nesta hora do dia, em que melhor é vagar sem saber onde chegar?
- Porque sei que a posso encontrar e desejo dela sorver graça para minha vida – argumentei esperançoso de pudesse forçar o vento a me conduzir a um ponto de partida.
- Ventos não andam em busca de abstrações! – Disse-me, com ar de melancolia. Somos a abstração que se pode sentir sem tocar. Somos a metáfora de D-us, porque não nascemos onde nos possam dar nome. Não andamos por caminhos pré-estabelecidos, e desaparecemos sem que nunca tenhamos sido tocados. Somos como o espírito vivo, embora caminhemos como a morte.
Ninguém nos pode guardar. Sabem quem somos só depois que passamos. Somos o passado como vozes do presente. Nos podem ouvir, até mesmo há quem procure traduzir nossas canções, mas frear nosso curso não há quem consiga.
Somos o acalanto dos órfãos. Somos o bálsamo dos que queimam. Somos sopro de  D-us dando vida. Somos a própria vida.
Enquanto o sol mais alto surgia, devagar como o tempo, a brisa desapareceu. Aborrecido por não ter minha pergunta respondida, retirei-me dali, arrazoando com meus pensamentos, trôpego pela embriagante musicalidade da manhã, foi quando percebi que tivera minha primeira lição: "A sabedoria é como a brisa mansa. Vem, anda junto e se vai. Dela ficam em poucos, as marcas. Dos que se deixam acarriciar por sua suavidade, como que pelos dedos da brisa nas folhas das árvores".

2 – As árvores
Continuei a caminhar e encontrei uma grande árvore. Já alto o dia, queimavam-me os raios do sol altivo e imponente, como um velho mestre a impor disciplina ao aluno displiscente. Sentei-me à sombra e com jovial ociosidade fitei o cintilar entre as folhas, como se o olhar do velho professor buscasse me encontrar entre as frestas de meu esconderijo.
Era uma castanheira, frondosa, forte, abraçando em círculo com seus braços longos tudo o quando pudese abraçar, como uma mamãe pássaro a envolver seus pintos sob pequeninas asas, mas que se multiplicam de tal modo que nenhum deles perde seu aprisco acolhedor sob a mais intensa chuva ou causticante sol.
Ao lado da castanheira, uma araucária alta, coroada de belas copas ostentando pinhas e balançando uma a uma como troféus por sua imponente forma.
Pousou entre as folhas da castanheira um pequenino pássaro. Quase ao meu lado. Arredio, ligeiro, atarefado em observar tudo ao seu redor como um guradião atenta para o perigo que ronda seu tesouro.
- Conheces a sabedoria? – Perguntei ao pardal.
- Como ela é? Tem forma? Sabor? Cor? Pousa em que árvore? Constrói ninhos? Encontra sementes para seus filhotinhos? Banha-se nas fontes e bebe nas folhas? Quão alto voa? Brinca nos ares e voa em bandos? Procura o sul sem repouso em vôos sem descanso? Canta ao amanhecer e repousa com o crepúsculo? Foge dos predadores com astúcia? Etc, etc, etc?
Disse isso e voou dali pousando nos galhos, longe das folhas espinhentas da araucária.
Fiquei estarrecido com tantas perguntas, e enquanto ainda tentava assimilar a primeira delas, acompanhei instintivamente o ir e vir daquele passarinho, até que ele voasse para tão alto e eu não o visse mais.
Assim como chegou, se foi, sem me responder. Apenas fiquei observando o balançar das folhas de ambas as árvores pela brisa que passava, e acompanhar pássaros que iam e vinham, pousando numa e outra árvore. Na castanheira, entre as folhas. Na araucária, sobre os galhos.
Saí dali e contineu a andar. Foi quando percebi que a sabedoria estivera comigo outra vez e eu não havia percebido.
Concluí que como as árvores também podem ser as pessoas: assim as pequenas como as imponentes. Naquelas, cujas folhas pendem para o chão e se deixam soprar pela brisa, outras se podem achegar e construir seus ninhos. Embora imponentes e altivas, suas folhas sempre estão voltadas para baixo, humildes. As demais, cujas folhas também são voltadas para cima, são espinheiros, que não permitem a ninguém se aproximar. Tornam-se intocáveis e inatingíveis.
Olhei para trás, e pareceu-me por um instante ter visto olhos cintilarem entre as folhas que arrazoavam com o vento e os pássaros a respeito da sabedoria.

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José Lewgoy, Caçador de Nazistas em Gramado - Sequência do caso do Encouraçado Graff Spee*


José Lewgoy - Ator brasileiro, gaúcho, Judeu, e apaixonado por Gramado

Publiquei, há algum tempo atrás, a história sobre os inomináveis energúmenos que intentaram prestar uma homenagem ao nazismo, criando um monumento com uma parte do casco de um encouraçado alemão que afundou na costa brasileira, mas que pela obviedade do absurdo, teve a ideia abortada, e nunca mais falou-se no assunto.

A grande questão é: Por que Gramado seria um suposto reduto de simpatizantes desta monstruosa ideologia nesse tempo, e ninguém ter tomado conhecimento disso então?

Ora, porque assim como a Alemanha inteira acolheu a barbárie do Shoah (Martírio, Holocausto), com os sentidos amortecidos pelos duiscursos patrióticos de um monstro, alimentado e sustentado por outros monstros, percebe-se que sua especialidade é esconder um elefante dentro de um carrinho de mão, e ninguém perceber que o peso do carrinho excede à normalidade do volume. Assim também, as coisas que se faziam, eram geralmente às sombras, como foi o caso do casco do encouraçado (leia aqui) que ause virou munumento à estupidez.

Mas a história continua, e também esta chegou à mim por um velho amigo, que optou pelo anonimato, que relata a presença de agentes da Mossad, o serviço de inteligência de Israel, e do Instituto Wiesenthal, que caçava criminosos de guerra pelo mundo inteiro, tendo, inclusive, uma célula em Porto Alegre, que por sua vez, tinha ampla intimidade com Gramado, permitindo auxiliar com discrição na busca destes criminosos. 

Relata uma fonte que um destes agentes, ou colaboradores do Instituto Wiesenthal (ou da própria Mossad), teria sido o ator José Lewgoy, fato que não foge do contexto, uma vez que Lewgoy era apaixonado por Gramado, conhecia bem as pessoas e os lugares, e não seria de estranhar que tenha mesmo participado desta atividade, no período em que era assíduo local. Não há relatos de sucesso ou não em sua atividade, até porque estas prisões, geralmente, não aconteciam à luz do dia, para evitar batalhas jurídicas e para que não fossem alertados outros que poderiam estar próximos.  Para conhecer um pouco mais sobre os métodos empregados nestas caças aos criminosos nazistas, vale a pena assistir o filme: "Operação Final", na Netflix, onde a Mossad descobre que o carrasco Adolf Eichmann está foragido na Argentina, com outro nome, e vivendo como um pacato cidadão do interior.

Conheci, certa ocasião, uma família, proveniente de uma cidade na fronteira do Brasil com o Paraguai, e numa conversa descontraída, a moça, de aparência indígena, filha adotiva de um casal de alemães, contou-me que era filha adotiva do médico de Hitler. Não sei dizer se era do médico que atendia pessoalmente o monstro (o tal que injetava uma mistura de bosta humana com esperma de cavalo no satânico führer), ou de Mengele, que anos mais tarde apareceu morto em Praia Grande, interior de São Paulo. Esse fato apenas acrescenta a forte presença de fugitivos nazistas na América do Sul, o que é de conhecimento geral. Apenas demonstro aqui, que uma pequenina cidade com aparência alpina, invadida por turistas, não ficaria imune, tanto aos próprios, quanto aos simpatizantes locais, que de uma forma ou outra, se infiltraram nas tomadas de deciões políticas e sociais da comunidade. Claro, que isso é elucubração minha, pois, com exceção da história do casco do encouraçao, das corujinhas iluminadas, e do que percebi nas conversas com Hunsche, o resto é vaga imaginação de quem conta histórias, e preenche os vazios com possibilidades. Eu não creio em bruxas, mas que elas acham que existem, ah, acham sim!

Bella Ciao e Modelo Econômico de Crescimento - Táticas e Estratégias que modelam o Pensamento Político

Imagem: Bing IA Pacard - Designer, Escritor, e Artista, que tem nojinho de políticos vaidosos* "E sucedeu que, estando Josué perto de J...