Comentei em um vídeo , noutro dia, que Gramado desconhece sua identidade cultural. Ninguém me contestou.
E já que por presunção, eu talvez estivesse certo, vou continuar, então, neste raciocínio da falta de conhecimento acerca da identidade de Gramado.
Já comentei sobre a identidade étnica ou familiar.
Você sabe quem você é? Sabe de onde veio? Sabe quem são seus bisavós paternos e maternos?
Já sentou para conversar com seus avós sobre os ancestrais de sua família? Já sentou para contar aos seus filhos acerca de sua historia pessoal?
Seus filhos conhecem sobre aquele dia que você foi salvo de algum perigo assustador? Ou seus netos conhecem a história de como você e sua esposa ou esposo se conheceram?
Quem não sabe de onde vem, também não sabe quem é. Quem não sabe quem é, não saberá pedir informações sobre o caminho que deverá seguir, quando estiver perdido no meio da multidão ou em um cruzamento de muitas ruas. Corre o risco de ver o dia passar, a noite chegar, ver as luzes se apagarem, sem que você não tenha se movido de seu lugar.
Corre o risco de não ter saído de sua zona de conforto, mesmo que desconfortável ela seja, pois quando estamos perdidos, até o desconforto é melhor que a incerteza.
E pra que? Para chegar ao fim da vida de boca aberta, escancarada, como dizia o maluco, esperando a morte chegar?
Para descobrir que sua cabeça não se articula mais com a mesma facilidade, e quando percebe, a artrose tomou conta de seu pescoço, impedindo que se volte para os lados, ou olhe para o passado, buscando lembranças, porque percebe tarde demais que as lembranças que construiu não são as suas lembranças, mas apenas aquelas que a mídia vomita em sua memória sem que você perceba, até que devagarinho, tombando como tomba uma árvore (hoje não estou original, desculpem-me Raul e Éxupéry)vai escoando pelo ralo do esquecimento.
Quem é você? Quem são seus pais? Quem são seus avós? você descende de alemães ou italianos? Eram portugueses os seus pais, os seus antepassados? Em qual navio chegaram?
Não! Estas perguntas não são para você, não. São para os seus filhos, para os seus netos. São para os que escolherão teu asilo, e disputarão os bens que tu amealhou, para garantir uma vida digna aos que te sucederiam.
Eles chegaram. Chegaram, e você não os viu passar. Chegaram, e dançaram na sua frente, quando crianças, mas você estava ocupado demais construindo o futuro deles na caderneta de poupança. Chegaram e passaram, dançaram e cantaram. Te abraçaram e te beijaram, mas você não viu.
Quem é você, Gramado? Assim falando, até parece que estou falando com uma pessoa e não com um amontoado de prédios que desenham silhuetas no entardecer, e poluem de belas imagens os websites das agências de viagem pelo mundo afora.
Chamo você, leitor, de "Gramado", porque a minha Gramado das lembranças é uma Pessoa, formada por um conjunto de outras pessoas, que olhavam para todos os lados e se banhavam nas cachoeiras que se espalhavam pelos caminhos atapetados de fontes borbulhantes e águas cristalinas.
Quando te chamo de "Você", Gramado, não vejo um coletivo, mas uma única pessoa, que apenas tem nomes diferentes em casa casa onde vive, nas ruas por onde passa.
Gramado! Quem é você? Uma cidade de turismo que se perdeu no emaranhado do sucesso, ou uma cidade bem sucedida que se emaranhou no esplendor do turismo? O que é você? uma cidade plena de gastronomia para engrandecer as barrigas, ou uma cidade de enigmas para enriquecer as mentes?
Por quem brilham as tuas luzes? Brilham por ti, que as acendeu, ou brilham por aqueles que te haverão de suceder no cintilar contínuo de estrelas que podes apagar todas as manhãs?
Quem é você, Gramado? Que historias contarão os teus filhos, e depois deles, os filhos dos teus filhos, pelo emaranhado do tempo, que teimas em perder todos os dias?
Ah, Gramado, que recolhes água em cestos de vime, e apenas te molhas, mas nada ajuntas. Gramado que não sabe mais quem é. Não lembra mais de onde vem, e não tem a menor ideia para onde vai.
Eu sei que nem sempre pensar é agradável. Pensar às vezes incomoda, porque quando pensamos, construímos catedrais de nuvens, onde o sopro da brisa pode derrubá-las, e todos os dias temos que começar tudo de novo.
Mas mesmo assim, vale a pena pensar. Pensar onde Gramado quer chegar. O que Gramado quer ser. E pensar não é tarefa que terceiriza. Penso eu e deve pensar também você. Ou vai deixar que pensem por você aqueles que te dispensam você toda vez, depois que foram eleitos?
Penso que não. Penso que podem eles motivá-los a que empunhem bandeiras com suas siglas a que gritem seus nomes pelas ruas, mas não podem frear suas ideias, nem pisar em seus pensamentos, porque são eles próprios quem devem submeter-se às tuas ideias, às tuas lembranças, aos teus sonhos.
Ainda há tempo de pensar. Pense nisso.