Não se deve confundir "impertinente", com "incontinente", embora, muitas vezes, residam no mesmo corpo, e compartilhem o mesmo caráter, maus, mas nem sempre. Ansioso, talvez. Agradável, nunca.
O impertinente é um ansioso em terceiro grau, um sofredor missionário, que tem como missão, levar aos outros, as suas angústias.
- Tem uma nuvenzinha tímida no céu, e não há vento. Podemos passear um pouco, tomar uma fresca! - Comentou o enfermeiro.
- Não se engane! Nuvens assim carregam mau agouro! - Disse João Marmota.
- Não chove hoje! Vamos tomar a fresca - berrou Bracatinga, já procurando o chapéu, com a ponta da bengala.
- Eu acho que não vou, e acho que também vocês não deveriam meter o nariz fora de casa hoje.
- Meta-se com sua vida!
- Já que ninguém me escuta, levem umas galochas e um agasalho!
- No verão, a trinta graus?
- Pode cair uma saraivada de chuva de granizo!
- Aí a gente volta pra dentro!
- A roda da cadeira pode enguiçar!
- Num passeio de concreto, a dez metros da varanda?
- ...Que pode desabar com o temporal!
- Mas quem foi que disse que vai chover? Até a nuvenzinha já se foi. Céu azul, de brigadeiro!
- Foi chamar outras nuvens. Essas efemérides tem parte com "demônho!"
- Velho caduco! Fique aí então!
- Já estão me excluindo, estão? Discriminação racial?
- Você é caucasiano, e nós também! Quem discrimina gente da mesma origem?
- Agora querem se igualar a mim? É isso que querem? Me arrastar pro buraco com vocês? No meio da chuva? Querem que eu pegue uma "pontada" e morra?
- Tu é doido. Tá um calorão, e o céu tá azul, já falei!
- Isso até que chova! E o céu tá muito baixo! Pode dar temporal.
-Eu desisto!
- Desiste? justo agora que eu tinha me preparado pra dar um passei, tomar uma fresca? O que foi agora? Não me querem junto? Digam na minha cara!
- Tá com a corda toda no azedume, ô...
- Leve algo pra comer o passeio, e uma ferramenta pra consertar a roda da cadeira.
- Por caridade! Nós só vamos aqui na frente do asilo, a dez metros da varanda, pela calçada, e não tem degrau!
- E por que não fizeram um degrau? Querem que a gente ande numa lombada e se esborrache debaixo de uma diligência?
- Não existem mais diligências, nem cabriolés há muitos anos, Marmota!
- Era só o que faltava. Então o senhor Dom Pedro vai ter que andar a pé, com essa lacaiagem toda atrás deles?
- Dom Pedro já morreu, João!
- Chega! Eu não falo mais com vocês! Gente mentirosa! Do Pedro nem doente estava quando soube a última notícia dele.
- E onde foi que você soube dele, Marmota?
- Na aula de história, na terceira série, com dona Jurema.
- Para! Calça tua pantufa e vai olhar filme de bangue-bangue na tevê.
- Vou mesmo, antes que comece a trovejar e eu tenha que desligar o aparelho. Acha mesmo que vai chover?
- Não sei, tenho ouvido muito falar disso na última hora. Pelo sim, pelo não, vou pegar um guarda-chuva.
- Leve também um casaquinho, que depois do granizo, pode cair a temperatura.
- Enfermeiro! Traga meu capote de chuva, e um naco de rapadura. Se chover, posso me entreter mascando um docinho.
- Vamos cancelar o passeio, Seo Bracatinga! O tempo fechou e acho que vai chover.
- Que tempo maluco. Não faz nem meia hora, o céu estava tão azul, e só tinha uma nuvenzinha no firmamento.
- Mas estava muito baixo. Eu disse, eu falei, eu avisei! - Emendou João Marmota lá de dentro, que tinha ouvido de tuberculoso e escutou toda a conversa.
Em breve* (Continua após a Publicidade)
- O senhor estava certo, Seo João! Melhor tirar uma pestana. Vamos colocar a fralda, por causa da sua incontinência.- Que pestana? Vamos sair lá fora e tomarmos uma fresca.
- Não dá, João! Talvez chova!
- Que nada, Bracatinga! o Céu está azul e só tem uma pequenina nuvem no firmamento, sem vento nenhum!
- Eu mereço. Tudo de novo! - Choramingou baixinho, o Enfermeiro.
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