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domingo, 12 de agosto de 2018

O Bom ou O Melhor - A Anatomia do Bullying


O Bom e o Melhor - A Anatomia do Bulying

Paulo Cardoso* (Palestrante)

Desde menino, talvez pela minha origem pobre e desprovido de pai, mirradinho, fracote, e sem nenhum tipo de talento comum, de natureza  atlética, ou intelectual, aprendi às duras penas, a suportar fracassos continuados, e deles recolher restos de esperança, somados com pequenos atos de generosidade alheia, e desta amálgama de sobrevivência, a construir meus castelos, onde eu era rei, o rei de mim mesmo, e talvez de um reino onde os súditos não tinham nomes. Uns, apareciam em meus sonhos de menino, com rostos de amigos, a quem, em minha generosidade, os havia transformado em nobres. Outros, os meus inimigos, os malvados da vila, eram para meu reino, os vilões, com quem eu batia espada, e sempre os derrotava. Eram trancafiados nas masmorras, e impiedosamente eram submetidos a humilhações, como carregar meus livros, amarrar meus sapatos, ou dividirem suas saborosas merendas com outros súditos, também humilhados como eu era, nos momentos de lucidez, quando não era rei de lugar algum.

Por não ter conhecido meu pai, e na condição de "homem", ainda que com sete ou oito anos de idade, eu não poderia sobrecarregar minha mãe e minha avó com meus pequenos problemas de menino. Desta forma, eu tinha que transformar-me em pai de mim mesmo, para defender a honra da família, isto é,salvar meu couro das surras que tomava dos malvados que moravam perto de mim.

Aprendi também que para pertencer a algum grupo, e caso não tenha sido você mesmo, o mentor, fundador, autor, e presidente deste grupo, você não é nada, ou menos que nada,  mas ainda assim, você tem uma chance de participar daquele grupo, contanto que seja público e notório que você cumpra todas as regras de ingresso e permanência lá dentro da fraternidade do mal. Mas você é forte, e como uma pessoa vencedora e decidida, regras lá fora não interessam mais para que você possa subir no conceito dos malvados. Pescoços de amigos, familiares, e quem quer que seja que cruze seu caminho, tornam-se escadas, degraus, tapetes e alcatifas. Agora você tem a oportunidade de não só entrar no novo grupo, como também vê a chance de crescer ali dentro, de ser importante, de ser chamado pelo nome, e um dia, quem sabe, ser você mesmo o supremos comandante daquele grupo. Você vê a oportunidade de sobrepujar seus medos e seus adversários, e passar da condição de dominado a dominador, porque você está decidido a tornar-se o melhor, o mais ágil, o mais inteligente, o campeão. É aqui que pega a coisa então. Tornar-se campeão.

Somos doutrinados, desde muito pequenos, a conquistarmos nossos prazeres através de disputas. Precisamos, diante da sociedade, da família, dos amigos, e principalmente dos desafetos, provar nossa superioridade, em tudo. Todos os caminhos que nos esperam, não nos querem como segundos colocados. Querem sempre o primeiro, o maior, o melhor, o mais forte, o mais hábil, o mais belo, e até mesmo o mais calado. Mas sempre será o mais. Sempre seremos aquele "mais" desejado, porque também nós temos em nosso íntimo particular que ser o maior, o melhor, é algo natural. Foi neste modelo que o Naturalista Fritz Kahn, seguido por Darwin, decidiu demonstrar que na Natureza, o mais forte é o que vai sobreviver, e assim Darwin desconstruiu o modelo criacionista,onde todos tem o mesmo privilégio, para estabelecer neste lugar, aquele que seja capaz de pisar melhor, de esmagar com mais força, de chegar na frente, e de demonstrar que compaixão e piedade, humildade, serenidade, são apenas demonstrações de fraqueza dos incapazes.

Meus filhos jamais receberam de mim qualquer motivação para disputas inúteis. Jamais motivei qualquer um deles a tornar-se desportista, atleta, ou perseguir títulos que enaltecem apenas o ego, e ainda que a prática de esportes seja saudável para a mente, para a cooperação, para a saúde, e para o companheirismo, sou levado a pensar que ações solidárias em reconstruir uma casa derrubada pela chuva em áreas desfavorecidas, ou transportar alimentos para um asilo, brinquedos para um orfanato, abrigos para os moradores de rua, sejam oportunidades ímpares de aproximação de pessoas com interesses comuns. Sempre entendi que subir o morro para levar comida às viúvas e os desamparados, seja um exercício tão eficaz ou até melhor, do que passar noventa minutos correndo atrás de uma bola, embora eu saiba que o prazer não será o mesmo, tenho que admitir. Subir o morro é muito melhor.

Vejo com tristeza que nem mesmo as igrejas escapam desta tragédia humana chamada "disputa". Não escapam os seus pastores ou seus missionários, da perspectiva de "levarem mais almas à Jesus", conquistarem mais adeptos para suas igrejas, alcançarem mais ofertas para as obras sociais, ou buscarem o patamar mais alto na escala de humildade. Quanto paradoxo!Vejo com decepção pela oportunidade que perdem na formação do bom caráter nos pequeninos, os professores que promovem jogos, ainda que educativos; com os educadores que promovem disputas e oferecem premiações e pontos, favores, benefícios, àqueles que tirarem as melhores notas, aos que se destacarem nas tarefas, ainda que muitos se esforcem, mas não logram êxito, uma vez que cada pessoa tem percepção e capacidade cognitiva diferente. Uns são hábeis em aritmética, enquanto outros desempenham satisfatoriamente as artes. Vejo assim, com preocupação, a transformação das pessoas em "boas" nisso, "boas" naquilo, enquanto que todos querem apenas aprender, entender, e depois fazer aquilo que foram contratadas por seu conhecimento.

Ser bom, é desejável. Ser ainda melhor, é alcançável por todos, mas ser "o bom", ou "o melhor", é uma façanha que exige mais que esforço, e em muitos casos, dobra e quebra em pedaços a própria ética durante a formação do caráter. Esta é a anatomia do Bulying: Ultrapassar o outro, mesmo que dentro das regras. Eu passo essa. Não preciso ser o melhor, nem melhor que ninguém. Preciso apenas ser melhor do que eu mesmo fui ontem, e amanhã, do que sou hoje. O que passar disso, não vem de Deus.

quarta-feira, 21 de março de 2018

Entre nós e o mar



Eu moro num lugar privilegiado,aliás sempre morei, e até mesmo nasci num lugar assim, pois só o fato de ter nascido na Serra do Pinhão, na costa do Rio das Antas, e sair de lá vivo, já foi um privilégio imensurável. Pois é assim que é.  Não suficiente em morar em um lugar com tantas belezas, O Altíssimo estendeu sobre mim a generosa possibilidade de instalar minha pequenina e quase insignificante empresa, o meu empório, no alto de um edifício, no sétimo andar, que tem uma vista privilegiada e reflexiva. Privilegiada, porque tenho um raio de visão de cento e oitenta graus de uma parte central de Florianópolis,tendo em minha tevê de mil polegadas uma vista impressionante deste panorama. Daqui vejo, ao mesmo tempo, além do cemitério, o maior mangue urbano do mundo, o moro das tevês, o bairro da Agronômica e por fim, o mar.

Embora a foto de capa desta reflexão mostre a imagem, quero descrever um pouco daquilo que a imagem mostra dentro do que não mostra, mas faz-me pensar: a vida, a morte e as recompensas. A partir de minha janela,em primeiro plano, avisto o maior cemitério de Santa Catarina, o cemitério do Itacorubi, que parece uma cidade planejada vista do alto, e nas entrelinhas,  não deixa de ser, pois nos cemitérios, especialmente aqueles históricos, mais antigos e imponentes, é  possível reconstruir-se todas as etapas da história da arquitetura e dos costumes religiosos de um povo. Cada lápide conta uma vida,  e em cada rosto na porcelana pequenina fixada sobre a tumba, há  um olhar que busca o infinito, a eternidade, uma resposta silenciosa. 

O cenário a seguir é a recompensa pelo preço de examinar a morte antes de aportar à vida,as montanhas, a cidade, e o mar. Isso faz-me lembrar Jerusalém, onde, olhando em direção ao Monte das Oliveiras, há dois cemitérios: Um cemitério árabe, junto dos muros da cidade, escorrendo pelo vale do Cédron, assim descrito pela Wikipedia:

"O Vale do Cédron (em hebraico: נחל קדרון, em árabe: وادي الجز, "escuro") é um vale próximo de Jerusalém, descrito pela Bíblia como tendo grande significado. Também é chamado de Vale da Torrente do Cédron, devido a um fluxo continuo de correntes de águas por ocasião de enchente repentina nos meses de inverno chuvosos. Atualmente o nome dado à sua parte inferior, Uádi en-Nar ou Wadi al-Joz ("uádide fogo"), indica que é quente e seco na maior parte do tempo.

O Vale do Cédron se estende ao longo do muro oriental de Jerusalém, separando o Monte de Templo do Monte das Oliveiras. Continua ao leste pelo Deserto da Judeia, em direção ao Mar Morto. O assentamento israelense de Kedar está situado num cume sobre o vale. O bairro de Wadi al-Joz recebe o nome de árabe do vale.
O Vale é o local de muitos túmulos judaicos, inclusive o Pilar de Absalão, a tumba de Bene Hezir, e o Túmulo de Zacarias. Certa vez, a água da Fonte de Giom fluiu pelo vale, mas foi desviada pelo Túnel de Ezequias para prover água a Jerusalém. Atualmente permanece sem água mesmo no inverno."

Por que escolhi estas duas imagens para esse ensaio? Porque há um modelo de pensamento a ser construído dentro desta geografia, aparentemente sinistra, lembrando que se do lado da cidade, escorre, como disse, o cemitério árabe, descendo até o vale, já espelhado, subindo pelo Monte das Oliveiras, há outro grande cemitério, este do povo judeu. Então, se estivermos do lado do Monte das Oliveiras, olhando em direção à Cidade Santa,  assim como aqui, estando de minha janela, a olhar para as montanhas, a cidade e o mar, antes tenho que ver as pedras lapidadas e polidas daqueles que se encontram no meio do caminho. Esta visão faz-me lembrar que para chegar ao êxito, antes devo lembrar que no meio do caminho sempre existe a possibilidade do fracasso, uma vez que a morte foi o grande fracasso do Homem desde a sua criação. Percebo que para chegar a Jerusalém, que é o símbolo da promessa de vida, o caminho da morte está à minha espera, e devo atravessá-lo,mas como fazê-lo, sem perder-me no emaranhado sinistro que me separa do meu objetivo? 

A resposta é unica para todos os casos: Andando pelo caminho que corta a morte ao meio e encurta a distância à vida.  Compreendendo as palavras do Messias, que, olhando para Jerusalém disse que era O caminho, a Verdade e A Vida. Da morte para a vida há um único caminho chamado verdade, ao passo que da vida para o vazio há um largo campo chamado morte. Ainda assim, não há problema algum em contemplar este campo, na certeza que ele é apenas um obstáculo, mas que há um mar, uma montanha, uma cidade e uma Jerusalém para nos receber depois da jornada.
Shalom

O que faz a tua mão direita....

Evitem fazer alarde quando ajudarem alguém, não fiquem contando vantagem diante das pessoas, para  que sejam admirados e elogiados; aliás, s...