AD SENSE

domingo, 5 de dezembro de 2021

Sobre o amor e a consolação - Pétalas



Na dor devemos consolar, e confortar. No ódio, devemos perdoar.
Não, nunca é fácil, nunca foi, mas tanto a dor quanto o ódio, são barreiras que travam a vida em sua plenitude, que rompem o fio de prata entre a vida e a eternidade, que enterra a esperança, e que conduz ao esquecimento.

Confortar não é a cura, mas a companhia, o abraço, as mãos estendidas e o caminhar junto, enquanto a cura não vem, enquanto a jornada não se encerra.

Perdoar, não é aprovar o mal feito, mas jogar água fria no calor da ira, para que se fechem as comportar do destempero. Perdoar é seguir em frente sem o cadáver da ira nas costas. É libertar-se do que nos ata ao que nos ofende. Perdoar não é concordar, mas não dar lugar ao lenitivo, a fim de que este  aplaque  a dor do embate, e abrir as janelas do tempo, para que entre e nos acompanhe em suas asas.

Não perdoamos o mal feito, mas o que deixou-se enredar pelo desejo de fazer o mal, e por fim, o executou. Perdoamos a condição humana, de humanos atos, para que façamos perceber o contraste entre o divino que cria e a criatura que destrói. Não fomos lançados ao mundo, vindos do nada, mas fomos moldados pelas mãos, e soprados pela boca do que É, acima de tudo. Somos a imagem e semelhança, do Tudo, e assim, Tudo em nós que somos nada, torna-nos em tudo habilitados para sermos plenos, ainda que aparentemente insignificantes.

 "Ama ao teu próximo" não é uma opção. É uma condição. É uma orientação positiva, sem ser impositiva. É uma necessidade do outro que deve ser considerada como alternativa de viver saudável, não no sentido físico, mas mental e espiritual.

Em hebraico, "Ahavá", se traduz por: doar-se, independente de afeto envolvido. Amar não é bem querer, mas quer o bem. Amor não é a sobremesa. Às vezes, pode ser a casca dura da noz a ser rompida. Porém,  romper a casca é porque outro necessita  do conteúdo. Já quando a casca de rompe de dentro para fora, acontece a germinação, e a vida se renova.

Amar é deixar-se brotar para que seja quebrada a casca, e a árvore cresça.

Amar não é escolha. É oportunidade.

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sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

O homem que vendia solidão

Solidão? - Perguntou, ensimesmado o caixeiro da loja de roupas, que recebeu uma filipeta, um panfletinho em preto e branco, anunciando a venda de nada mais, nada menos que "solidão". Isso mesmo, essa mesmo que o leitor está pensando aí.
- Mas e alguém compra isso?
- Evidentemente que sim" - Respondeu o filólogo, que oferecia solidão em promoção. Infelizmente, apenas uma por freguês, pois como se trata de solidão, não há um coletivo. Por acaso você sabe qual é o coletivo de solidão?
- Creio que seja "multidão"! - Respondeu o caixeiro, meio desconfiado de que talvez fosse uma pegadinha.
- Pois aí que está" Isso mesmo. Multidão. Ocorre que multidão é algo que descaracteriza a pessoa, compreende? Qualquer um na multidão, desaparece completamente, e assim, fica pior que antes.
- Nunca havia pensado a respeito disso! Respondeu, pensativo o caixeiro. E como funciona isso?
- Ah, não é tão simples, mas é um recurso para que o indivíduo se torne novamente um indivíduo, e não uma estatística, um número, uma sombra. A coisa funciona assim: Nesse tempo em que vivemos, onde cada louco contamina outro doido com sua loucura, fazendo com que dois loucos multipliquem seus disparates e desta forma, teremos uma multidão de loucos. Assim como acontece em uma pandemia, por exemplo. Um louco avisa o outro, e ambos se enroscam na loucura coletiva, e tornam-se alvos, presas fácies dos dominadores, que capturam doidos com redes, sabe. Redes de mentiras, rede de intrigas, rede de fofocas, redes e mais redes, até que estejam todos dominados, e por estarem em bandos, perdem sua individualidade, não são mais ninguém, ainda que amontoados com outros milhares de ninguéns. Compreende?
- Não!
Veja bem, vou dar um exemplo: Se você caminha entre muitas pessoas, e se todas elas falarem ao mesmo tempo, você conseguirá entender o que falam?
- Pois então! Aqui está a chave da questão. As pessoas precisam ouvirem suas próprias vozes, ouvirem seus nomes, conversarem com quem as ouça, e ninguém melhor que nós mesmos para ouvirmos o que dizemos. Assim, se você for capaz de caminhar sozinho, ainda que na multidão, você voltará a ser você e mais ninguém.
- Mas e por que as pessoas não fazem isso?
- Porque perdem suas vontades, pelo medo, pela falta de esperança, pelo exagero de informações que receberam, e saturaram a credibilidade em tudo. Pois é aqui que eu entro, e vendo para elas o meu projeto de "Solidão Responsável!"
- E como funciona:
- Vendo à você a pergunta "coringa", para todas as respostas, que é uma pergunta padrão, capaz de afastar as pessoas negativas de sua presença, e assim, você tem possibilidade de caminhar livre por entre elas, sorrindo, enquanto choram, sereno, enquanto gritam, altivas, enquanto se dobram ao desânimo.
- E tem garantia isso?
- satisfação garantida, ou recebo em dobro o que você pagou, em espécie.
- Não estou precisando ainda, mas por favor, embrulha pra viagem, pois vou ligar a tevê, e posso precisar disso logo, logo.
- Pois não! Débito ou crédito?
- Faz no carnê?
- Infelizmente não. Carnê pressupõe um monte de parcelas, e isso descaracteriza o negócio. Solidão é tudo, é o nosso lema. Vai querer uma sacolinha?
Não tenha medo. A verdade será sempre verdade, independente dos fanáticos que tentam constrangê-lo com suas próprias crenças do que seja a verdade.
Aquilo que é verdade para alguns, e não para outros, não se torna em verdade absoluta apenas porque entopem-lhes os ouvidos com fatos e opiniões na intenção de demover-lhes as crenças.
isso acontece na política.
isso acontece na religião.
isso acontece em tudo.
Pelo fato de que temos e emitimos reflexões, não nos coloca na posição de donos de nossas verdades ou de verdade alguma. Apenas diz que exercemos nossa liberdade de construirmos o conhecimento dos fatos pelo contraditório das opiniões.
O que passar disso, é lavagem cerebral.

Levante-se, meu herói!
Filho, já brilha o primeiro raio
dos muitos que cairão após a noite
eis que é manhã, quase a chegar
e eu preciso que me levantes.
Há fogo a acender, café por passar, o pão para assar
o leite quente para beber, o açúcar, o queijo
para o desjejum da manhã.
Levanta-te, filho, porque preciso de um herói em minha casa.
nada mais que isso, não um general, não um escrivão, não um desembargador que nos desembargue a dor
nem um doutor que nos entregue e bula
não o deputado, o senador, o governador, o vereador
nem o ator, nem o doutor
apenas tu, meu filho, com tua coragem insana
com tua voz silente
contra a dor tirana
que pisoteia nas gentes.
Levanta, filho, é manhã
busca o poeta que dorme
apesar de tanto barulho
levanta o menestrel calado
levanta o ator calado
levanta pelos que calam
levanta pelos que falam
levanta pelos que morrem
levanta pelos que vivem,
ainda que morram de novo
esperando depois voltarem
corroídos, combalidos, caídos, sofridos
mas que voltem vivos
voltem livres e não mais cativos
voltem porque lembram
do que é sentir saudade,
voltam apenas por vontade
por liberdade
pela ânsia de voltar.
Levanta, filho, da escuridão do medo
caminha desde cedo pelas vias que te esperam
caminha livre, não te demores em chegar
ainda que não haja mais para onde voltar,
ainda assim, volte
pelo prazer de voltar.
Triste mundo que precisa de heróis
tristes heróis que não tem mais mundo
triste é ser triste sem saber o porquê
triste é saber
que não saber é a ordem
não é é útil conhecer
de que importa viver
se viver não é viver?
levante, meu filho, e abrace a aurora
recolha o amanhecer
guarde os raios da vida
para libertá-los janela afora.
Abra as janelas e deixe sair a luz da esperança.
deixe a esperança viver.
Levante-se filho, porque preciso de um herói em minha casa,
preciso de um herói no mundo
minha casa é o mundo.
(Pacard)
As crises manifestam três tipos de pessoas:
As que sabem o que está acontecendo.
As que tem opinião sobre o que acontece.
As que ouvem as duas primeiras, e perdem o juízo.


Aconteça para te aconteçam os que em ti se espelham
Como o vaso, que ele fazia de barro, quebrou-se na mão do oleiro, tornou a fazer dele outro vaso, conforme o que pareceu bem aos olhos do oleiro fazer.
Jeremias 18:4

Do mesmo modo que milhões, talvez, bilhões de pessoas, tenho atravessado, primeiro, perplexo, depois, irado, desesperançado, resignado, os primeiros dias em que temos lutado com incontáveis demônios ocultos pelo diminuto tamanho, mas que como os seres espirituais da trevas, que tiram a nossa paz, sem que possam nossos olhos vê-los, também estes minúsculos seres sem alma, fazem tombar ricos e pobres a cada instante, reduzindo as forças e o ânimo das autoridades, e do mundo em geral.
O que dizer? O que fazer?

A palavra é RESILIÊNCIA, a capacidade de retomar o que foi machucado e refazer sua essência, para moldar nossa existência. Afinal, que história teremos a contar aos nossos herdeiros? Quem fomos nós, no meio da calamidade? Fomos os que sentaram a chorar pelo que foi perdido, ou os que se erguerem a reconstruir uma nação, um mundo, uma existência?
Se eu não for por mim, quem o será? Mas se eu for só por mim, que serei eu? Se não agora, quando? (Hilel)

O dia de chorar foi ontem. O dia de pensar é hoje. A hora de recomeçar, é agora. Aquele projeto guardado no canto envergonhado dos sonhos, traga pra fora. Aquela palavra de conforto e ânimo, entre tantas críticas e acusações, faça acontecer. Aquela vontade de escrever seu livro: O que te impede? Aquele tempo para fazer melhor, senão agora, quando será? Aquele que te ampara, senão D-s, mas humano, não é você mesmo? E quando a te amparar para que não caia, senão já?
Caminhe em frente. Caminhe só, pois os mini demônios te negam companhia, mas vá. Olhe para o GPS, não o que te denuncia às autoritárias, mas o que te mostra onde quer estar no amanhã, e diga: Comece a navegar, pois a vida tem pressa. Eu tenho pressa e preciso acontecer.
(Pacard)

terça-feira, 23 de novembro de 2021

A"Casa de Maria Elisa" - - "Te quebro uma perna se tu contar!" em GRAMADO de priscas eras

Maria Elisa Dias Cardoso

Nasceu em Gramado, no dia 28 de julho de 1911, em uma casa que ficava onde mais tarde veio a ser a sede do Instituto Balneo e Lodoterápico, ou Motel Balneário, na Avenida Borges de Medeiros, cujas terras, à época, pertenciam à sua mãe, maria Francisca, filha de Tristão de Oliveira.

Tais terras, compreendiam todo o morro central, desde a área do parque Knorr, ao sul, ao Mato Queimado, ao norte. Desconheço a precisão dos limites das terras, sei apenas que as terras que compreendiam o Morro dos cabritos e adjacências, pertencia à Maria Elisa, e a casa onde nasceu minha mãe, Ester, ficava no lugar onde hoje se encontra o Centro de Eventos. Cheguei a conhecer esta casa, mas a anterior, não mais. A terra foi vendida aos Nelz, e ali onde estava a casa, instalou-se o restaurante, que desenhei e irei descrever mais adiante.


 
Esta casa da imagem, até o momento em que escrevo isso, ainda está de pé, com a única alteração, da pintura, pois Maria Elisa nunca permitiu que sua casa fosse pintada.

Não sei dizer o motivo dessa negativa estética, mas o que ela dizia à mim era que, por morarmos num rancho feio, nunca sofreríamos de inveja ou cobiça, e que nenhum ladrão teria coragem de invadir nossa casa, pois seria bem capaz de condoer-se e ainda deixar algum donativo. Dizia isso, e dava risada, à solta.

As divisões da casa estão entre minhas lembranças

Gramado é uma cidade com características peculiares, e sua distinção remonta à esse tempo, aos dias de minha juventude, nos anos 70. Vivi nesta casa até os 21 anos de idade, e dela saí para casar e buscar outro rumo para minha vida. Porém, apesar de ser simples, feia, quase um rancho, jamais fui discriminado por morar ali, tampouco tive vergonha de levar amigos, ou convidados de outras classes sociais para compartilhar com eles, o cuscuz, os bolinhos fritos, o chá de mate, ou as iguarias rústicas que minha avó, de uma hospitalidade ímpar, oferecia à todos que cometessem a ousadia de passar à frente da casa, sem chegar para dois dedos de prosa, e uma infalível relação de respeito e amizade duradoura.

Em frente à casa, os meus barrigudinhos. Ao alto, a Vila Suíça.

Esta foto de Maria Elisa, foi tirada pela Marília Daros Franzen

A casa tinha três quartos, sala, cozinha, área de serviço, e banheiro. Isso mesmo! A casa tinha um banheiro. Isso era fantástico, pois pouco tempo antes, quando estava instalada em um terreninho de uns cem metros quadrados, onde depois foi construída um dos prédios do Artesanato Gramadense. Lá tinha só uma patente, do lado de fora, e o banho era de bacia, na cozinha, ou no quarto.

Nós morávamos num ranchinho de uns 40 m2 ou menos, num terreno emprestado, entre as terras de nossos primos. Maria Elisa, ou para os íntimos, "Tia Ilizia", voltou à Gramado, com uma carga viva de três filhos e um neto, e umas poucas "matalotagens", como ela dizia. Gramado, sua terra natal, e acreditem em mim: não é nada agradável voltar à terra em que nascemos e crescemos, quando saímos em uma condição e voltamos na outra.  Assim que foi. Maria Elisa então, engoliu o choro, arregaçou as mangas,e  foi á luta. Foi trabalhar como lavadora de pratos no restaurante do Motel Balneário, que nesse tempo estava aos cuidados Do Armando e Lourdes Rost, ou do Adelino e Teresinha (Nininha) Catucci. Não tenho certeza. Isso nem importa. O que importa é que ao voltar pra casa, ao final do dia, levava junto uma lata cheia de comida que sobrou na cozinha do restaurante. Comida boa, Ô. Minha memória olfativa me faz recordar do cheiro de galinha caipira (todas eram caipiras, pois nesse tempo nem se falava em galinha de granja), e manteiga no preparo dos alimentos. O perfume era percebido desde longe. Enfeitava o ar à volta do restaurante. Bailava em nossas narinas como um banquete do céu (embora há quem pregue que no céu não haverá galinha caipira, vá lá que seja, era um tipo de céu de pobre, de quem vê a presença de comida como uma oferta de anjos).

Maria Elisa, nesse tempo, caminhava pela mata, comigo pendurado nela, e colhia frutas, cada qual a seu tempo: Quaresma preta, araçá, cereja, ingá, o que tivesse. Ela deixava as sobras de comida pra mim e meus tios e mãe. E ela comia o que sobrasse, e as frutas do mato. Nunca reclamou. E nem tinha do que reclamar. Éramos ricos. Só faltava dinheiro.

Foi logo adiante disso, creio que uns dois ou três anos à frente, que ela conseguiu comprar um bico de terreno, com, talvez, uns 80 metro quadrados, não passava disso, e mudar a choupana para lá. Melhorou muito. Nesse lugar, a casinha já tinha um sótão, onde dormíamos, meus tios Esaú (a quem minha tia Lina chamava de Izáu, que em hebraico é Izav) Samuel Isaac e eu. Esaú, logo saiu de casa, e foi morar em Joinville, no distrito de Garuva (hoje município), e lá, infelizmente, emprestou nova tragédia à Maria Elisa, ao sofrer um acidente e perder a vida. Jovem, muito jovem, aos 24 anos de idade. Chorei muito com minha avó. Por dez anos, tínhamos hora e dia para o choro. E saber chorar é uma virtude, mas ter com quem chorar, é um privilégio. Isso nos fez determinar a existência de laços perpétuos. Quer ter boas lembranças? Dê risadas com os amigos. Quer ter uma ligação por toda a vida, chore junto. Maria Elisa nunca mais deixou de chorar, mesmo quando abria um largo sorriso, seus olhinhos pequenos mentiam. Ela chorava ao sorrir. Chorava pelo filho e pelo marido, e ao mesmo tempo (vejam só que paradoxo), o sorriso lhe dizia que tinha mais dois filhos e um neto no estoque para investir o coração. Foi o que ela fez.


Maria Elisa era perspicaz, tinha visão de longo alcance, embora houvesse sido cegada em um olho, ao cair sobre um toco de hortênsia, seco. Mas ainda assim, via de olhos fechados. Ensinou-me a comprar livros. Imagine só,. velha perdulária, comprar livros pra quê? De que serve o fato de eu ter lido Os Lusíadas, Capitão Tormenta, ou Dom Quixote? Pra que serviu minhas leituras de Monteiro Lobato, Machado de Assis, José de Alencar, e Jorge Amado? Me digam? Ajudou em alguma coisa eu ter gasto dinheiro na coleção inteira de Hermann Hesse, pra descobrir que ao final da vida ele teria sido um pedófilo, condenado e preso? Mas eu gastei dinheiro, muito dinheiro, comprando livros, por influência de Maria Elisa. Aliás, muito bem lembrado que em 1921, 80% da população brasileira era analfabeta, e que bem nesse tempo, Maria Elisa estudou até o quinto ano do primário. Leram bem o que eu disse? O quinto ano do primário, provavelmente na escola Santa Teresinha (aguardem, pois já está desenhada também). E sabe o que significa uma menina, ter a quinta série do primário, em 1920? Isso era praticamente um mestrado, quase doutorado então. A propósito, Maria Elisa leu mais de 100 (cem) vezes as sagradas Escrituras. Não é exagero. Ela lia duas, quase três vezes ao ano, a Bíblia, de Gênesis ao Apocalipse. E não foi uma nem duas vezes que vi ela deixar pastores e pregadores numa saia justa, por corrigi-los durante uma pregação. Aliás, ela detestava sermão, e saía da igreja quando começava o sermão, em desagrado, pois nesse momento o rito não permite manifestação da congregação, a não ser dizer amém. Minha vó Maria Elisa, nunca disse "amém" para asneiras.





É, Maria Elisa nasceu de família rica, e ainda que o destino lhe reservasse tantas tragédias (Vamos enumerar: Aos 8 meses de idade, no colo do pai, Victor Pereira Dias, teve a ação de um anjo que desviou os estilhados que partiram de uma pistola, no telhado, e atingiu em cheio seu pai, na cabeça; Tornou-se, por isso, filha mais nova, responsável pelos cuidados com a mãe, Maria Francisca de Oliveira, e só se casa por volta dos trinta anos de idade. Com meu avô, Assis Brasil Cardoso. E foi uma enorme coincidência isso, pois ele também casou-se com ela, e no mesmo dia. Mas não quero filosofar muito sobre isso, para não por em descrédito a minha credibilidade enquanto contator de causos, e contar causo exige responsabilidade. É o que eu tenho.

Antes dos 50 anos de idade, ficou viúva, por conta da estupidez de um cretino, no caso, meu progenitor, que matou Assis (que na ocasião prestava serviços de sogro ao meu pai), numa briga de foice (literalmente), mas poupá-los-ei dos detalhes. O fato é que Assis, o Assisão, com seus 1,95m, ou coisa que o valha, foi levado às pressas ao Hospital Santa Teresinha, em Gramado, a 80 km de onde moravam, e lá, expirou.

Mas, ainda seguindo a trilha da dor, Maria Elisa, então, por volta dos 55 anos, perde o filho do meio, Esaú. Por conta dessa dor, ela instituiu uma linha de pensamento que pregava aos casais: "Não tenham poucos filhos! Tenham muitos filhos, pois, se perder um, a dor é menor." Não é como eu penso, mas é sobre ela que escrevo, então era assim que pensava. É assim que é a vida para alguns. Assim foi para Maria Elisa.

Ela via longe, barbaridade, como via longe. Eu, na tenra idade das traquinagens, tinha certo afeto pelo uso do martelo e suas complexidades construtivas, e viva catando um prego torto pelos cantos, para enfiá-lo nas paredes da casa. Era útil, mas não servia pra nada, exceto ampliar a área de ferro enriquecido pelas paredes. Foi então que Maria Elisa deu-me um dinheiro, e encarregou-me de ir até à madeireira dos Cardoso, na Rua Theobaldo Fleck, onde meu primo Geremias de Moura, era o gerente, e comprar uma tábua de pinheiro, que media 5,40m de comprimento, por 30cm de largura, e uma polegada de espessura, que foi serrada em cinco partes, colocadas no carrinho de mão, e assim, atravessei a cidade, não sem passar na loja do Argemiro Moschem, e comprar martelo, prego, serrote, e outras ferramentas. Tudo pago à vista. Tudinho.

Tempo de cabeludo

Chegando em casa, ela disse: Pronto. Agora isso tudo é seu. Construa um armário. Pura verdade! Eu fiz um armarinho de cerca de 30x30x1,50, que consumiu exatamente dois quilos de prego. Sabe como é, segurança em primeiro lugar.

Muito de priscas eras, com minha mãe

Maria Elisa jamais me censurou pelas maluquices que empreendi. Ela apenas dizia: "Meu filho! O importante é ter um raminho de vida pra ter o que comer e onde morar!"

Eras menos priscas um pouco, o varão que vos tecla

O tempo andou, e fomos morar naquela casa no terreninho em cima do morro. Subimos na vida. Isso foi lá por 1964, ano em que ingressei na escola, no Santos Dumont (que também já está desenhado e se D's permitir, terá uma matéria muito especial). Foi também nesse tempo que Elisabeth Rosenfeld começou a construir a casa onde morou o restante de seus dias. Ali ao lado. Que privilégio teve ela em conhecer Maria Elisa. E a recíproca é verdadeira. Assim, maria Elisa ganhou o seu primeiro emprego formal, com carteira assinada. Lavava lã. E pouco tempo depois, aposentou-se por invalidez, pelo olho perdido em serviço. ganhou também uma pensão pela perda do filho, e assim teve certa paz até o seu último sorriso, segurando a mão do "nenê" dela, a quem chamava, enquanto bebezinho de: "Meu dilique!", o Samuel Isaac. (Ainda contarei alguma barbaridade que sei sobre ele. Só não faço isso agora, porque estou negociando uma propina pra não contar o que sei, e outra pra não inventar o que não sei).

Esta foto do casamento de Maria Elisa, reuniu a elite do vilarejo. A foto está muito apagada, pois existe uma foto em bem melhor qualidade, que foi solicitada por uma parente, para fazer cópias, e nunca mais foi devolvida. Então, uso a que tenho.

Minha mãe, Ester, formou-se professora, em 1968.

Nesse tempo, minha mãe Ester Cardoso, já professora, dava aulas em escolas do município. E eu, ainda solteiro, levava a vida, sonhando com possíveis viagens à lua, abraçado na Mary Poppyns, e tomando cuidado para não ser mordido pelo tigre que eu imaginava existir perto de casa.

Maria Elisa e Joanão

CPI de Maria Elisa

Maria Elisa descendia de judeus, Cristãos-Novos, aqueles judeus "convertidos", na marra, pelos guardiões do "Santo ofício", vulgo, "Inquisição". Tinha uma memória fantástica. Era capaz de nominar e enumerar nomes de casais, paternidades, e situar cada um deles, desde sua origem: França, Portugal, Alemanha, Jerusalém, e foi assim que pude montar, junto de meus primos, nossa árvore genealógica, que nos remete à nomes como; Gamaliel, Hilel, Ezequias, e Salomão.  Até uma vovozinha que tivemos, denominada "Índia carijó", por volta do século 17. Essa é a parte que me desgosta, pois não deixaram pra mim nem um tesourinho, um biscoito que fosse, nada.

Eu e Decio Basei, meu primo

Mas o fato de ter essa ascendência judaica, a transforma em alguém que muito especula sobre as coisas, as pessoas, pois é bem próprio dos descendentes de judeus, em terras estranhas (Gramado era uma terra muito estranha, ainda é), e procuram descobrir tudo sobre o interlocutor, para compreender o grau de confiabilidade que possa passar. Aqui mora o segredo de um bom interrogatório: Maria Elisa obrigada a vítima a entrar em casa, sentar, e contar sua vida, enquanto ela, Maria, preparava bolinho frito, chá de mate, ou cuscuz, ou feijão mexido, enfim, qualquer coisa que distraísse a atenção do réu, me este despejasse tudo o que sabia, enquanto sentia o cheiro das guloseimas, e desatava a falar no modo automático. Contava tudo.

Em 1972, Samuel Isaac e Ester, formandos em Contabilidade, no Cine Embaixador. Ao centro, maria Elisa

Nessa casa, Maria Elisa plantava couves, favas, e uns temperinhos. Eu colaborava e plantava árvores. Do mato. caminhava pelos matos e voltava com mudas. Lá plantei cereja, goiaba serrana, guaco, camélias, e outras perfumadas e frutíferas. Tem até hoje um enorme Cedro (ou Cajarana, nunca soube o que era ao certo) que eu plantei.

Minha mãe, Ester Cardoso

Bom humor

Maria Elisa ria à toa. Era debochada, e não perdia uma boa piada. Contava causos, ah como contava causos, barbaridade. Quem me dera ter quem ouças uma pequena parte dos causos que ela contava, contados por mim. Peguei dela o gosto por contar causos. Como esse que estou contando.

Esse era o tamanho da família em 1968

Minha mãe e Samuel, estudavam à note, e daí a casa era nosso território, de Maria Elisa e eu. Ela começava contando uma lambança (fofoca) com a seguinte frase: "Te quebro uma perna se tu contar, mas vou te vender pelo preço que paguei!" E contava. Também contava fábulas. Barbaridade, como ela sabia fábulas, lendas portugueses (como a Velha do Poronguinho, por exemplo). Contava as fábulas conhecidas, mas com nomes portugueses arcaicos: "Gata Borralheira", era a "Maria do Borráio", Cinderela, Rapunzel João e Maria (estes permaneciam) tinham nomes adaptados. E não poupava detalhes nem tinha o tal do "politicamente chato". Dava nome aos bois e às tetas da giganta, servidas como iguarias ao gigante, pelo João Pequeno (um Pedro Malazartes português). Nas fábulas dela, o macaco era rival do tigre, e assava os picuá do bichando, dando pros filhotes do tigre comerem. Sim senhor. ela contava isso. Contava fábula atrás de fábula, mas olha que interessante: Com a mesma versatilidade, contava a historia da Bíblia, sem omitir nem emendar nada. E eu nunca fiz confusão entre fábula e fé. Sempre separei as coisas. Ela me ensinou isso. O humano falho pode coexistir com o divino perfeito, sem tornar-se maçante.

Não que tenha relevância alguma, mas essa turma de amigos e colegas do Artesanato Gramadense. O pinguço do meio era Samuel Isaac. Pronto, falei.
Airton Brombatti (In memorian, Remi galgaro, Samuel Isaac, Paulo Wiltgen, e fazendo cocô, Ivo Niclotti (Gringo)

Mesmo que nunca havia entrado em sua casa, mas feia que velha, conhecia Maria Elisa. Uma ida ao centro (morávamos no centro, mas era mais ao centro ainda), era uma epopeia, pois parava ou era parada uma a uma das pessoas que encontrava para trocar uns dedos de prosa. Era conhecida por todos e sabia da vida de todo mundo. Isso me favorece agora, quando escrevo as memórias de Gramado.

Quase me tornei pastor. esta foto era exigida para enviar ao seminário. Fui aceito. Mas me apaixonei, e a teologia ficou pra posteridade.

Sobrinhos, primos, amigos de priscas eras, todos tinham um compromisso existencial de visitá-la de tempos em tempos. Todos, sem exceção. Conheci a parentada toda lá em casa. Casa velha e feia. Sem pintura. Que acolhia uma riqueza imensurável, chamada de Maria Elisa. "Tia Ilizia", para todos.

Religião

Maria Elisa nasceu católica. Era afilhada do major José Nicoletti, intendente do 5º Distrito de Taquara. Neta do Tristão de Oliveira, e Leonor Gabriel de Souza. Ainda na juventude, por influência de seu tio, José Francisco de Oliveiro, vulgo "Zé Tristão", toda a família dela, tornou-se luterana (IELB), para desgosto de seu avô, Tristão. Mais tarde, João Victor, seu irmão mais velho, descobriu, numa localidade em Rolante, próximo de Taquara, uma família que "guardava o Sábado e não comia porco", mas eram cristãos. Como Em casa, tinham esse costume, de abster-se de carnes impuras, segundo mandamento bíblico, embora não compreendessem bem isso, pois liam na Bíblia que assim deveria ser, mas sua religião (tanto luterana quanto católica), não faziam tal exigência. Isso os incomodava. Assim, quando descobriram a tal religião, imediatamente se converteram ao adventismo, ajudando a criar, junto com outros prosélitos locais, um pequeno grupo, mais tarde transformado em igreja. teremos uma ilustração também desta igrejinha, desmanchada em 1968, e construída no atual endereço, à rua São Pedro, em frente à extinta Ortopé.

Cabelos

Parece exagero, mas Maria Elisa jamais teve seu cabelo cortado. Chegava quase na cintura. Ela tinha um rito diário, ou melhor, duas vezes ao dia. Ao acordar, muito cedo, ela se ajoelhava, e orava demoradamente, e enquanto orava, trançava o cabelo. Uma trança de cada lado. Isto feito, atava as duas tranças em forma de coroa à cabeça, e seguia para as lides do dia. Orava balbuciando, e tinha um roteiro de pessoas pelo bem de quem dedicava suas preces. Nome por nome, iam se perfilando nas palavras, até tecer um longo fio até o céu.

À noite, antes de recolher-se a dormir, repetia o gesto, e de joelho, orava, balbuciando, e desmanchando as tranças. Cuidadosamente, e dormia com os cabelos soltos, livres. Recolhia-se para o seu "Catre véio", como dizia.
Nesta parceria dos primeiros anos de minha infância, à noite, enquanto meu tio e minha mãe iam para a escola noturna, minha vó e eu desatávamos a conversar, e ela, a contar-me suas fábulas, intercaladas com lembranças, e relatos bíblicos. Também, ouvíamos, por um pequeno rádio portátil, nas ondas curtas da noite, os programas de humor da Rádio Globo do RJ, como: A Turma da Maré Mansa, e Balança mas não Cai. Ouvíamos ainda a Rádio Voz da América, e a Rádio Nacional de Moscou. Até o sono chegar.

Minha vó Maria Elisa acreditava na Volta de Jesus. Eu acredito na vinda do Messias, que penso ser O mesmo. Então, quero apresentá-la à vocês todos. Um dia.




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domingo, 21 de novembro de 2021

ARTESANATO GRAMADENSE, de Elisabeth e Erich Rosenfeld em GRAMADO de priscas eras

Artesanato Gramadense

Este lugar e bem mais que uma lembrança arquitetônica, que nem estilo tem, senão algumas caixas de tijolos cobertas com telhas de fibrocimento. A questão não é o estilo, mas o conteúdo, que povoa a memória de quem passou por lá, e a falta de memória de quem não o conheceu.

No início dos anos 60, chegaram à Gramado, os alemães, imigrantes, Elisabeth e Erich Rosenfed. Ela, artista plástica, premiada, e ele, funcionário de uma Cia. Alemã de tecnologia. Eis o que relata Dr. Ricardo Rosenfeld, neto do casal:


"Oi Paulo. Minha avó-drasta, 2a esposa de meu avô, nasceu em 20/10/1907, na cidade de Flensburg. Batisada com o nome de Elisabeth Redlefsen Schaberg. Quando casou com meu avô ficou apenas Elisabeth Rosenfeld. Abraço."

Eram proprietários das terras. Na localidade do Caracol, inclusive onde fica a Cascata, e venderam, comprando a terra de Gramado, que tinha cerca de 100 metros de frente, talvez mais, por cerca de um quilômetro, no sentido norte. Havia mato, arroio, cascata, campo, aclives e depressões, e sobre o alto de uma colina, construíram a casa, que se vê, aos fundos. 

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Elisabeth, tinha um Fusca branco, e Erich, passeava com seu elegante Simca Chambord, pela cidade, além de seu inseparável cachimbo, que denunciava sua presença simpática, por onde passava.

Elisabeth era muito brincalhona, e adorava passar trotes, no dia primeiro de abril. Era generosa, e conheço relatos e testemunhos de pessoas a quem ela estendeu a mão, até mesmo financeiramente. Adorava contar histórias, especialmente as histórias vividas por pessoas de suas relações, que vieram para o Brasil, fugindo dos horrores da guerra. Eram pessoas cultas.  Lembro de um piano de meia cauda, preto, que foi vendido para um médico local, e substituído por outro de quarto de cauda, muito lindo, que ficava na sala da casa.

Elisabeth Rosenfeld

Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Logomarca do Artesanato Gramadense. 
Cortesia de Cezar Augusto Nerys de Oliveira


Ao Tear, Elisabeth Rosenfeld, e atrás, à direita, Ilse Bohn
Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Eu desconheço a razão, mas estas são algumas dentre as raras fotografias que mostram Elisabeth, e não é por falta delas, pois bem recordo que ela gostava de fotografar e ser fotografada no seu cotidiano. Enfim, uma lástima, que tenha se sublimado nos espólios, o remanescente material e memorial destas pessoas e lugar. Apelo então `minha, e de outrem, memórias, para alguns pitorescos.
Sou bastante grato aos netos de Erich e Elisabeth, meus queridos amigos desde a infância, Ricardo e Mônica Rosenfeld, por cederem estas imagens.

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Gramado era já visitada por pessoas de diversos lugares, especialmente Porto Alegre, e São Paulo. Não posso deixar de mencionar que o Instituto Balneo Lodoterápico, da família Nelz, contribuiu para a internacionalização da cidade. Mas sobre estes, falarei em outro capítulo.
1 - Lucinda Parissenti
2 - Manoelina
3 - Nelda Pante
4 - Elisabeth Rosenfeld
5 - Remi galgaro
6 - Nelson Tegner
7 - Luis Brombatti
8 - Carmen Tegner
9 - Irene Grade
10 - Luis Parissenti (João canela)
11 - Erich Rosenfeld
12 - Iraci Gross
13 - Iracema Lüdtke
14 - Marlene Bohn
15 - Elvira Nienow
16 - ...???
17 - Ivo Schaumlöeffel
18 - Ivo Niclotti
19 - Fioravente Brombatti
20 - Valmor Benetti (Flechinha)
21 - Lucinda Bohn 
22 - Nelsi Pimel (Morena)
23 -Marlene Bohn
24 - Ilse Bohn
25 - Eronita Galgaro
26 - Sebastiana de Oliveira
27 - Irani Gross
28 - Rita
29 - Nailor Benetti
30 - Gelson Oliveira Rodrigues (Pelé)
31 - Dinah Teresa Rodrigues dos Santos
32 - Teresinha Pimel (Zita)
33 - Elida de Moura
34 - Lucide Pimel
35 - Lucinda Bohn
36 - Irma Rossa
37 - Nadi Rodrigues dos Santos
38 - Angelina Muraro

Quando começou, Elisabeth tinha um pequenino atelier na garagem do chalé onde morava. Logo, percebeu que precisava ampliar suas possibilidades criativas, e construiu um pequeno atelier (aliás, foi a primeira vez que ouvi palavras como: Mosaico, Atelier, e Artesanato). Neste atelier, contratou um especialista em fornos, um tal de Olímpio, e com ele, veio um assistente, o Nelson Tegner. Olímpio terminou a tarefa, e foi embora. Mas Nelson ficou, e ficou tanto tempo, que muitos anos depois, bem de vida, já, comprou a propriedade particular onde moraram Elisabeth e Erich (ou Erico) Rosenfeld.
O negócio de cerâmica não prosperou, pois já havia uma amiga de Elisabeth, uma senhora egressa de um campo de prisioneiros pelos nazistas, chamada Wanda Duczynka (Não sei se é assim que se escreve), ceramista, e nunca irei saber, mas quero presumir que Elisabeth não quis promover concorrência com a amiga.
Amigos, aliás, não faltava aos Rosenfeld. Logo, foi construída a casa maior, e o chalé, passou a ser a casa de hóspedes, onde os Rosenfeld recebiam artistas, eruditos, de Porto Alegre e São Paulo. Alguns também da Alemanha. 
Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Foto à esquerda, acima: Orlando Alves de Moraes
Foro à  esquerda, abaixo: Samuel Isaac Cardoso (Desconheço quem está à sua direita, atrás)
Foto acima à direita, sentido horário: Angelina Muraro, Elvira Nienow, e Maria Elisa Dias Cardoso. Atrás, de pé, Samuel Isaac.
Foto do meio: Ilse Bohn
Foto menor, abaixo: Reconheço Maria Elisa, Elvira e Samuel. Não identifico os demais.

Elisabeth comprou um Tear de madeira para tecer tapetes de lã, que era comprada dos fazendeiros de São Francisco de Paula, mas a lã chegava suja, da mesma forma que era tosada, assim, precisava ser lavada, e era minha avó, maria Elisa, quem fazia esse serviço.


Esta é uma imagem de internet, mas os teares eram bastante similares à estes

No terreno dos fundos da casa, um imenso gramado, bem cuidado, que terminava numa mata e esta estendia-se até à rua dos Abraão, que hoje, liga o Bairro Moura ao Dutra.
O cidadão ao fundo, era o Seu Joanão, um preto velho que tinha carregado sotaque de italiano. Uma criatura de doçura e mansidão, que jamais vi igual. Sempre sorrindo, conversava com simplicidade, e cuidava daquele jardim como se cuida de uma criança. Seu Joanão tinha um filho adotivo, Alcindo Portulan, que foi marceneiro no Artesanato Gramadense.


O tear foi a sensação da vizinhança, que se amontoava à porta do pequenino atelier, já ampliado, para acomodar a engenhoca, jamais vista por aquele povo (eu também era daquele povo). Uma especialista, vindo de São Paulo, Dona Carla Blum, foi encarregada de montar o tear, e treinar pessoas para a nova atividade do já afamado atelier de Elisabeth Rosenfeld.
 O trabalho era reconhecido, e a cada dia apareciam mais pessoas dos arredores, oferecendo seus préstimos serviçais à “Dona Rosenfela”, como diziam os mais símplices, que tinham um certo brilho no olhar, ao vislumbrar um emprego, um aprendizado para os filhos, e um futuro mais digno para a família.
E o Artesanato só crescia. O estacionamento, externo, cascalhado, ficava abarrotado de carros, com placas de Porto Alegre, Caxias do Sul, Novo Hamburgo. Os negócios prosperavam, e Elisabeth descobriu um modo de permitir que seus colaboradores também prosperassem.

Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Elisabeth não era envolvida em política, mas era bem relacionada com a alta sociedade civil e militar.
Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld

Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld

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Lavação de Lã

Minha avó, Maria Elisa, lavava e secava a lã, de modo muito rudimentar, no inícios, nas priscas eras do Artesanato Gramadense. Nem sei se chamava assim naquele tempo.
Atrás dela, "Seu Joanão", um Preto velho, que tomava conta do jardim. Pensa numa alma generosa e gentil: era ele. Era Negro, mas tinha sotaque carregado no italiano, pois foi filho adotivo de italianos da colônia


Elisabeth então contratou pessoas com certo refinamento, para colocá-las à frente do atendimento aos visitantes. Tais colaboradores, Elisabeth recusava-se de chamar de “vendedores”, mas os chamava de “Recepcionistas”. 

As pessoas recebiam nas fábricas, o seu salário, e era tudo. Os Rosenfeld inovaram, pelo menos lá. Os colaboradores recebiam religiosamente a cada quinze dias, uma parcela do salário, e recebiam ainda, um adicional, um prêmio coletivo pelo desempenho do grupo, ao que chamavam de “Gorjeta”. Assim, enquanto existiu o Artesanato Gramadense, sob a direção dos Rosenfeld, e ainda depois, pelo casal Rubim, pagava os melhores salários da categoria na cidade.

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De tempos em tempos, era oferecido um churrasco coletivos, extensivo às famílias, e mais que uma confraternização, todos recebiam prêmios por merecimento.

Estes eventos eram oportunidades culturais, ao que, ao longo do crescimento, e da construção de mais prédios, formando quase uma vila, Elisabeth construiu um, em especial, que chamou de “Teatrinho”. Todas as unidades recebiam nomes, mas o “Teatrinho” era um teatro em miniatura, com direito à coxia, palco, e auditório.














A Torre
Era costume, que as casas tivessem uma despensa de alimentos, reservada para conservas e estoque de cereais, bebidas e outros alimentos menos perecíveis, antes da popularização dos mercados, e dos congeladores domésticos. Assim, compotas e doces de frutas, conservas em vinagre e sal, ou mesmo secos, eram guardados em locais menos acessíveis, ao dia a dia da lida na cozinha.

Elisabeth tinha um lugar assim. Ficava no porão da torre da caixa d’água, que tinha um quartinho onde eram guardadas ferramentas de jardim, e no chão, um alçapão discreto, dava lugar ao porão, onde estava guardado um tesouro de especiarias e guloseimas.

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Foram os netos dos Rosenfeld, Ricardo e Mônica, meus amiguinhos de infância, quem me enveredaram para o mundo da bandidagem, que ingressei para o mundo do crime, cujo alvo era o porão das compotas. Traçávamos muitos planos, uso de máscaras, lanterna, mapas, para efetuarmos a abordagem aos calabouço onde eram feitas prisioneiras as latas e os vidros de conserva, que ansiavam por sua libertação, pelos valentes cavaleiros da comilança. Na verdade, isso foi feito apenas uma, talvez duas vezes, pois o serviço de contraespionagem e a segurança do complexo, denunciaram nossas investidas, após descobrirem vidros abertos, e comprovarem por especialistas, que ratos não tinham tecnologia para abrirem “Vidros-Veeck” com os dentinhos. Assim, para frustração de nossos planos criminosos, foi nos oferecida a oportunidade para que nos servíssemos, à vontade, na dispensa convencional da cozinha de Dona Elisabeth. Paciência. Vida que segue. O crime perdeu talentos valiosos.

Cortesia de Rodrigo Parissenti

Esta placa em mosaico, moldada com pedras de ametista (garimpadas em Gramado), tacos de madeira, pastilhas de construção, e desenhos, retrata os primeiros trabalhos de Elisabeth, que sempre contou com auxiliares em suas obras. A placa ainda está fixada na parede de um dos prédios em ruínas.
Todos os retratados ali, existiram de fato, e eu sou aquele agachadinho com uma carda de abrir lá, dentro de uma gamela.

Os Artesãos
Eu nunca tinha ouvido a palavra “Artesanato”, até então, assim como também desconhecia a palavra “Atelier”, “Tear” Mosaico”, e até “Doce de Leite”, senão quando passei a frequentar o círculo social e cultural de Elisabeth Rosenfeld.

Mais que fazer arte ou artesanato, Elisabeth motivava as pessoas a que se tornassem hábeis e também criativos. Grande parte da arte que ela trouxe ao mundo, dizia respeito às pessoas. Onde muitos viam pobreza, Elisabeth viu pessoas. Onde muitos viam pessoas, Elisabeth viu talentos. Onde muitos viam talentos, Elisabeth viu um futuro. E as pessoas abriram os olhos e viram oportunidades.

Assim, Elisabeth demonstrava em sua obra, nos desenhos, nos entalhes, nos mosaicos, grafias pictóricas antropomórficas, onde o Homem e o Ambiente se mesclavam. O painel ao lado, ainda existe, colado sobre uma parede de um dos espaços, hoje em ruínas, que mostra o dia a dia de seu trabalho de artesanato, e as pessoas que participavam dele.

O menino agachadinho, cardando lã, era eu. Na bancada, estavam, ela própria, pintando, e nos teares acima, basta saber quem eram as primeiras colaboradoras, que seus nomes estarão ali, e assim com os escultores, os marceneiros, e os fiadores de lã para os teares.

A vida social de Elisabeth e Erich Rosenfeld
Não quero dar "spoiler"! aqui, pois sei que ainda contarei muitas histórias mais sobre estes visionários.

Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Elisabeth era uma excelente amazona, com muitos prêmios de equitação.
Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Elisabeth em sua casa, no Caracol,. anterior à propriedade de Gramado (no Artesanato Gramadense).

Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Elisabeth em seus passeios, desbravando as matas
Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Arte e cavalos. Ah sim, tinha música e literatura também. Sempre elegante, esta era Elisabeth.

Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
ESSA foto ME representa! essa era a Elisabeth que conheci. Gostava de gente do povo. não tinha frescura
Arquivo de família Rosenfeld - Cortesia, Mônica e Ricardo Rosenfeld
Pense num casal elegante, nobre, aristocrático, e de uma simplicidade luxuosa: Elisabeth e Erich Rosenfeld

E agora, a notícia triste
Triste ocaso do descaso
Atualmente o patrimônio do que restou do Artesanato Gramadense, encontra-se, não apenas em ruínas, mas em interminável litígio judicial por conta de uma sequência de gestões desastrosas depois que mudou de mãos, não sei dizer em que período isso aconteceu, exatamente.
 Uma lástima. Eis um tesouro com histórias, que está se desmanchando pela falta de conhecimento.

Fotos: Pacard

Fotos: Pacard
Fotos: Pacard


Fotos: Pacard

Fotos: Pacard

Fotos: Pacard

Fotos: Pacard

Fotos: Pacard

Fotos: Pacard



Fotos: Pacard

Fotos: Pacard

Fotos: Pacard







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Pacard, autor
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AHAVÁ - Ser amado é ordem Bíblica? Não!

Acredito, por ouvir falar, pois não sou psicanalista ou assemelhado, que a frase mais ouvida nestes consultórios seja essa: "Eu não sou...