AD SENSE

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Sua majestade, a Solidão


O lugar mais cobiçado e temido que existe é a solidão. Mais que uma condição geográfica ou temporal, física ou metafísica, a solidão é o segundo grande mistério do universo. É o lugar onde a ambição e a humildade disputam  para conquistar, e para que não pensem que enlouqueci de vez (porque ninguém enlouquece de vez. Loucura vem em gotas homeopáticas e só percebemos quando a taça se derrama), vou explicar meu raciocínio.
Tudo começou lá no mais elevado dos Céus, quando Satã, cercado de seus anjos, todo o exército dos céus, até aquele momento, volta o olhar em direção ao Trono de Glória do Altíssimo, Único, Onipotente e Glorioso (Bendito Seja),e deseja ali estar, porque entende que solidão é um lugar destinado aos grandes, e sendo ele grande (embora não o suficiente), deduz que o Supremo lugar do universo deva acolhe-lo com toda a sua incontida vaidade. Até ali, a solidão era algo valioso, precioso, impagável. E todos sabem o restante da historia.
Desde então,  movido por ódio e amargura, expulso das Alturas celestiais, o arqui inimigo de D's transforma a ideia de solidão em inferno. Passa a perambular pela terra em busca de quem esteja bem e feliz, e entrega o mapa do labirinto sem fim e solitário da falta de objetivo na vida. E com o mapa, entrega junto uma pequenina chave que abre a porta no fim do labirinto, escuro e estreito, chamada solidão.
Mas não quero ficar no subjetivo espiritual, para que não pensem que estou querendo abrir uma igreja com uma nova teologia. Não estou. Já temos teologias demais e fé de menos (desculpem o cacófato). Quero tratar do presente da condição  humana, política e social neste labirinto confuso onde nos enfiamos cada dia mais.
Quero  falar do poder. da solidão e da ambição do poder. Quero dizer com certa clareza o que a filosofia convencional não permitiria, mas como eu não sou filósofo, e muito menos convencional, abro exceção e vou ao ponto. E o ponto é que o poder é um imã que atrai para si o solitário. E esta atração quase sempre é fatal. É um divisor de limites entre o antes e o agora. Antes, eram os amigos, a liberdade, a desnecessária falta de cuidado com as palavras, com os modos à mesa, com as companhias, e sobretudo com o caráter. Antes, não era necessário preocupar-se com o arroto debochado depois da coca-cola, ou com o traque maroto dentro do elevador enquanto sozinho. Antes, não era necessário manter-se com aparência de ocupado no vazio de tempo entre um afazer e outro. Antes, havia a multidão que nos cercava, mas que ao mesmo tempo cercava também os outros, porquanto  também nós fazíamos parte desta multidão.
Depois, veio a diferença. e a diferença nos torna solitários. Depois veio o vazio de sermos únicos naquilo que fazemos. E a unicidade é o outro  nome da solidão. Depois veio a inveja dos que ainda compõem a multidão, mas junto com a inveja, veio a reverência, a admiração, a paixão e o medo. E por fim, a solidão  se estabeleceu em nós, e nos tornamos solitários, porque a solidão também inebria. A solidão nos diferencia, pelo bem ou pelo mal. Nos abandona à sorte daquilo que nos tornamos.
A solidão é o preço que se paga pelo sucesso, ou pelo fracasso. Em ambas as situações, o resultado será sempre um caminho ou um lugar solitário. É o salário justo pelo que conquistamos, que pode ser um trono dourado, ou uma cela vazia. Pode ser a glória pelo triunfo, ou a pena pelo fracasso. Cedo ou tarde, seremos solitários. Alguns, por algum tempo. Outro, pelo  resto da existência. Percebam que comecei com plural, "alguns", mas termino na forma singular, "outro", porque solidão nunca está no coletivo. É um triunfo individual.
O solitário nunca é medíocre. Se, em ufana condição, será invejado, temido, desejado, odiado, etc. Se em mísero estado, será odiado, temido, desprezado, abandonado e esquecido. Quase análoga situação. detalhes fazem a diferença entre um e outro.
o Ex-Presidente Collor, perguntado pelo repórter, como se sentia ao saber que fora defenestrado pelo  Congresso, respondeu com profunda sinceridade: Solitário. Uma solidão imensurável. Um vazio sem fim. Este vazio é o mesmo. Um vazio que todos querem experimentar, exceto os humildes. Estes não precisam desejar, pois já o possuem: o vazio de espírito. Um vazio de ambição.


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