Apolônio Lacerda Bebê, by Pacard
*Atendendo pedidos, publico novamente este texto.
Gosto da verdade, sempre, doa a quem doer, e aqui quero fazer justiça à minha infância, cujas noites escuras eram povoadas de visões assustadoras. Não, não eram alucinações. Eram informações mal resolvidas, passadas pelos adultos, ou mesmo por outras crianças, que as ouviam de adultos, e graciosamente dividiam o conhecimento com outras crianças, fosse por sadismo, ou por companheirismo, só importa saber que pelo menos tínhamos conhecimento das coisas. Torto, mas era conhecimento, e isso nos bastava. Procurei reunir alguns destes conhecimentos aqui e desmistificá-los, para o bem das novas crianças, que, tenho que ser sincero, mas elas próprias contam coisas que ainda me metem medo.
Velho do Saco
Ah, este sim, era um verdadeiro motivo para chegarmos em casa antes que anoitecesse. O Velho do Saco era, segundo nossa imaginação, uma espécie de ogro, que vivia escondido atrás de coisas, andando encurvado, balançando um enorme saco às costas, e recolhendo gurizada arteira, para fazer, sabe-se lá o quê com elas. Há casos verídicos de guris malevas que foram levados e eram obrigados a descascar cebolas e comer sopa de jiló todos os dias, até que aprendessem a ter modos com os mais velhos. Metia medo de verdade.
Comer sementes de melancia
Exatamente o que você leu. Comer sementes de melancia, sim, faz nascer um pé de melancia na barriga. Numa aldeia mexicana, foi descoberta uma família que traficava melancias na barriga, comendo sementes e atravessando a fronteira com a Alemanha, e voltava para o México para abastecer-se a cada trinta dias. O excessivo número de carimbos no passaporte despertou a atenção das autoridades da imigração alemãs, que entraram no Google, e localizou uma plantação de melancias escondida embaixo de uma plantação de maconha. Quando foram presos, revelaram o esquema, que consistia em declarar apenas a maconha ao governo, e esconder as melancias, que produziam sementes para contrabando. Então, quando você encontrar alguém muito pançudo, fique de olho aberto, porque pode ser um traficante de melancias.
Pé de couve no ouvido
Demerval era um sujeito bonachão, que levantava cedo e ia trabalhar todos os dias. Um dia, Demerval começou a perceber que as pessoas não diziam coisas compreensíveis, e começou a se preocupar, quando via todos falando baixinho e não conseguia entender o que diziam. Queixou-se então a um amigo, que o encaminhou a um especialista em tratamento de ouvidos, pois talvez o problema estivesse com ele e não com o modo de falar das pessoas. E era! Nos ouvidos de Demerval, britava um belíssimo canteiro de Couve-Mineira. Ele achou aquilo estranho, pois nunca plantara Couve-Mineira nos ouvidos! Como poderia estar acontecendo aquilo com Demerval?
Já no pronto-atendimento, Demerval ficou sabendo que aquela variedade de couve nasce espontaneamente em ouvidos mal lavados. É um fenômeno, que pode ser explicado pela ciência. Trata-se de uma espécie de bactéria, que está presente na cera dos ouvidos, e que se prolifera na ausência de água com sabão. E não são apenas couves que nascem ali, mas há também casos que relatam pés de jaca, abacateiro, goiabeiras, bananeiras e cebolinha. Esse tipo de profilaxia é mais frequente em pessoas que tem alergia à água com sabão, e a bactéria se prolifera, dando origem ao arvoredo.
Gravidez por selinho
Eu não acreditava que isso pudesse acontecer, até que vi uma vizinha aparecer barriguda, mas enorme mesmo a pança da pessoa, após retornar das férias na praia, onde, segundo ela própria testemunha, ganhou um selinho de uns oito ou nove amigos, que saíam com ela pelos matos para colher frutinhas silvestres. Existe a suspeita que não tenha sido os selinhos, e sim alguma frutinha desconhecida que tivesse comido durante os passeios. Talvez Banana-da-terra, ou algo assim, sem ter bebido água em cima.
A "Chave"
Só de lembrar, começo a tremer, tamanho era o pavor da tal "chave". Os meninos eram prevenidos pelos mais velhos sobre os perigos de encontrar a "Dama da chave", geralmente uma mulher mais fortona, de coxas largas e fartas embalagens de aleitamento, que espreitava meninos impúberes e os atacava com a tal "Chave". Certa ocasião, fomos apresentados a um homem todo retorcido, que jurava ter ficado assim depois de ganhar uma "Chave". Era uma cena horrível, dantesca, assombrosa. Depois disso, sempre procurei me relacionar com senhoritas do tipo "Minhon". Não que eu acreditasse naquelas bobagens que nos contavam, mas não custa prevenir-se para chegar à idade adulta com menores riscos colaterais.
Pegar pomba com sal no rabo
Este truque é perfeito. Nunca vi nada mais eficiente. Você pega um pombo e põe sal no rabo (dele). Ele fica inteiramente à sua mercê. Só não pode soltá-lo, senão ele escapa.
Manga com leite
Sempre arregacei as mangas antes de beber leite. Nunca entendi porque usar camisa ou casaco com manga comprida ou curta poderia trazer prejuízos à saúde. Só depois de adulto pude entender que manga não era nem uma parte da vestimenta, nem o afro goleiro do colorado, que jogava na minha época. De todo modo, só fui conhecer a fruta, manga, depois de adulto. E comi com leite. Funciona mesmo, pois eu morri na hora.
Palma da mão coçando é dinheiro na certa
Verdade! Um conhecido meu teve uma coceira enorme na mão, ocasionada por picada de muitas mutucas em simultâneo. O farmacêutico ganhou uma dinheirama vendendo antialérgicos ao moço.
Maus tratos a passarinhos causa crescimento de cabelos na palma da mão
Mentira! Mentira!
Orelha quente é presságio de fofocas
Sim! Definitivamente isso é verdade verdadeira mesmo. Quando era gurizote, fui escutar as gurias falando de mim, observando respeitosamente através de um pequeno furículo na parede do vestiário feminino da escola. Alguém viu isso e não foi compreensivo com minha curiosidade juvenil, e minha orelha parecia pegar fogo, alguns minutos depois. Acho que eu era uma espécie de profeta. Fiquei orgulhoso por este talento. Acho que é um "dom".
Bater três vezes na madeira da azar
É batata! Dá azar pra valer. Num galpão na casa de minha tia havia uma caixa de madeira, e de dentro dela se ouvia um zumbido estranho. Talvez fosse algum ser interplanetário, algo assim, tentando se conectar com o espaço sideral. Pegamos uns pedaços de pau e batemos com vontade na caixa. Ô falta de sorte a nossa. Não era ET, e sim marimbondos. Como deu azar. E doeu.
Bem, tem muitos outros mistérios de nossa infância, mas o texto está muito longo e tou com sono. (Aquela "chave" não me sai da cabeça).
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