O início da década de 2000 foi um ano de muitas transformações, muitos acontecimentos, e para mim, especialmente, foi a diferença na minha carreira profissional.
Eu era um típico profissional de interior, que cresceu no interior, cujos amigos, também do interior, enriqueceram, outros nem tanto, uns até foram à bancarrota, mas ainda assim, tudo o que acontece no interior, fica no interior. É a lei do brejo. Não que Gramado fosse um brejo, mas porque haviam limites aceitáveis de prosperidade para quem trabalhasse vendendo aquilo que as pessoas tem vergonha de dizer que tem: Inteligência.

Era uma comédia trágica, ou uma tragédia cômica, do jeito que o leitor preferir, conseguir vender um projeto inovador. Chegava a ser humilhante, às vezes. Encontrava todo tipo de gente no caminho. Certa ocasião, um cliente, a quem eu prestava serviços em Design, disse-me, com claras letras,m enquanto preenchia um cheque de pagamento: "Eu odeio designers! Só contrato porque preciso." Gostei da franqueza, porque assim eu economizo os necessários rapapés e salamaleques para obter meu pagamento por aquilo, cujo autor, ele odiava, isto é. eu!
Outros vinham com a conversa: "Faz um precinho de amigo, porque isso vai te deixar famoso!". Mas o cu dele, que vou fazer baratinho pra esperar que ele me deixe famoso. Não faço mesmo! Nunca vi ninguém ficar famoso por trabalhar de graça, pagar de otário pra malandro.

Mais outro memorável episódio, foi de um desenhista de um polo moveleiro, que, ao mostrar-lhe meu arquivo virtual de projetos, alguns milhares, e exposto em um site antigo, já desativado, disse, com uma franqueza admirável, ao apontar para os produtos expostos: "Estes produtos aí eu copiei para várias indústrias!" (E falou olhando pra mim!!!")
Tudo isso são os espinhos de quem vende ideias. Todos estes e milhares de outros mais, foram os estrepes de sucará fincados nos dedos que tive durante a carreira. Claro, nem tudo é espinho. Teve bons e muitos bons momentos também. Um momento glorioso para um Designer, é quando toma conhecimento que seu produto gera milhares de empregos, assegura salários e mantém famílias.
Jamais ganhei um prêmio por algo que criei, no design. Talvez porque nunca competi, nem deixei que meus trabalhos fossem inscritos em concurso. Não gosto de competição. Gosto de competir comigo mesmo, e apenas comigo mesmo. Gosto de me superar no que faço. Gosto dos desafios.
Fui bem longe, na minha carreira. Atendi mais de setenta empresas, ao longo de 40 anos de carreira, em diversos Estados brasileiros, pólos e indústrias. Fiz coisas grandes e pequenas, mas não lembro de ter feito nada medíocre.
Devo minha carreira à D-s, que não abriu porta pra que eu cursasse alguma faculdade. Sou autodidata. Mas não fiz nada sozinho. Muitas pessoas merecem a minha gratidão, e talvez nunca vou conseguir homenagear à todas, porém o faço à uma delas, porque agradecer é louvável e fortalece a alma.
Certa manhã, entra um elegante cavalheiro, e diz-me que o Sr. André Tissot ofereceu-me um espaço em seu grandioso evento, Compomóvel, para que eu fosse lá vender os meus projetos à moveleiros advindos de todas as partes do país. A resposta foi pronta: "Não tenho café no bule para um evento no então chamado "Sierra Park". O cavalheiro era Telmo de Freitas Gomes, então Diretor do Sierra Park e dos eventos do Sierra Móveis. Telmo retrucou-me: Você é nosso convidado. Daremos à você um estande, do tamanho que precisar, para que você exponha seus trabalhos, e se puder, apresente uma coleção inovadora de produtos, com sua assinatura.
Fiquei pasmo, tenho que dizer, pois nesse tempo, havia certo distanciamento entre o Sierra Móveis, e os demais moveleiros de Gramado, porque no tempo das vacas magras dos proprietários, algumas pessoas mal intencionadas, pisotearam neles, diante das dificuldades pelas quais passavam, e o Ser Humano, não perdoa cheiro de dor, cheiro de sangue. Como eu não tenho o hábito de pisar em quem está com dificuldades, não entrei nessa vala comum da maldade, e sempre tratei o André com respeito, o que continuo a fazer com quem quer que seja, e quem me conhece, sabe disso muito bem.
Assim, montei meu espaço, um fabricante, Rainundo Tomazzi, fabricou a coleção, a Madeireira Unidos, de Cambará do Sul, forneceu-me os paineis de "finger Joint", uma novidade até então, e no dia da abertura da feira, lá estava eu, com meus desenhos expostos, e os produtos em exibição.
Em média, eu vendia cerca de dois a três bons contratos por ano, mas fora de Gramado, e fazia um "pinga-pinga" em Gramado, vendendo projeto por projeto às fábricas da região. Para minha surpresa e alegria, das dez horas da manhã, se não estou enganado, hora de abertura para fabricantes, até às duas horas da tarde, eu já havia vendido doze coleções completas, e grande parte para os mesmos clientes, que antes compravam apenas modelos avulso, mas também para fabricantes de outras partes do país. O próprio André, levava jornalistas e editores de revistas especializadas, ao meu estande, e abriu portas para guindar minha carreira, que nenhum outro empresário havia feito antes. E um detalhe curioso: o próprio Sierra Móveis, nunca foi meu cliente, pois tinha sua própria estrutura de Design, mas foi graças à percepção de um empresário, ainda que desinteressado no meu trabalho, abriu portas e elevou-me ao seleto grupo de Designers brasileiros.
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Assim, penso que externar publicamento meu agradecimento ao cidadão, ao amigo, e ao empresário, é uma forma que tenho de testemunhar aos que encontrarem oportunidade de abrir portas, que o façam, e façam no tempo devido, para que não fiquem engavetadas as ideias de tantos talentos em busca de oportunidade.André fez a diferença para minha carreira. E eu procuro fazer a diferença para outros que buscam seu caminho.
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