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quarta-feira, 2 de setembro de 2020

No dia em que Apolônio Lacerda ideou uma civilização

Pous foi o acontecido, numa terça feira, logo ao raiar do dia, em que Apolônio Lacerda, que tratado pelo populacho de:  "O Taura do Chinaredo", adentrou-se no bolicho do paraguaio pra se defender de um aguaceiro que chegava. Largou a mala de garupa num canto, e  escorou-se no balcão de Granitina, já carcomido, e fez sinal de "dous dedo" pro Carrapicho, o piazote que  Talarico justou pra caixeiro. Indicava isso  que o rapaizote deveria servir-lhe dois dedos bem medidos da pura do alambique.

Deitando um tantico pro "santo", mas lambendo os dedos pra não desperdiçar a pura, ergueu o "martelinho" e deitou goela abaixo, com uma careta própria de quem bebeu coisa forte, mas não se crama porque era abencoada. e só depois disso foi que revirou os zóio pra bombear quem estava ali.

Na ponta do balcão, escorado, de corpo presente, encontrava-se um xirú, com uma "oito baixos" dipindurada no tiracolo, já quaje lambendo o fundo do caneco, de adonde era servida a cerveja gelada. Logoa atrás dele, meio que "incuído num canto, amoitado num cepo de picá cavaco, o Churumela, piazote dus catorze, coisa assim, mascava devagarito um pastel engordurado, que era pra durar bastante. E numa mesa, do outro lado, uns oito ou nove, se largavam no truco, num gritedo que dava gosto de se vê.



Olhou pra todos os lados, virou-se pro bolicheiro, fazendo sinal de interrogação com os zóio, meio que perguntando: "Mas e daí?", o que também talarico devolveu com um "dar de ombros", como que dizendo: Sei lá! 

Acomodou-se noutro cepo, á entrada, para bombear o movimento do entra-e-sai do bolicho. Ninguém interessante pra uma prosa. Ora entrava o Setembrino, fio do Cóta, outra hora a Vicentina, muié do Bastião Zarôio, que ia entregar os ovos e pastéis fritos pra venda, enfim, um entra-e-sai contínuo. A chuvarada (acharam que eu esqueci da chuvarada?) era um aguaceiro de verão, e logo passou. O sol raiou lá fora, mas dentro do bolicho, nada de novo. e ninguém pra assuntar com o Apolônio, que à certa feita, esparramou o bigode, e falando de modo audível ao bolicho e ao mundo, berrou:

- Pous andei contando a parentagem, e sabe que deu gente? Barbaridade! Como hay parente nesse mundão véio, que côsa seria!

- Hay povo, sim senhor - emendou Talarico.

Quem tem tanto parente assim deve ser muito importante - disse Apolônio, olhando cm atenção pro toco de paiêro entre os dedos.

- Pous decerto, respondeu mecanicamente Talarico. E cntinuava a polir as canecas na pia. Só negaceava por cima dos óculos embaçados, virando a cabeça, quando Apolônio falava.


-Lá na familia, semo: Eu, a muié, onze fio, treis cusco, dois gato, umas trinta franga, cinco galo, um tatu mulita que temo criando, um papagaio, a sogra, quatro cunhado... (Apolônio dizia isso, olhando para um mural imaginário, e contando nos dedos de uma só mão, repetindo dedo pra economizar na contagem)... E continuou:

- Mâns chê! Se agregá a bicicréta, o ancinho, a foice, o enxadão, e a patente nos fundos do rancho, isso dá uma civilização, praticamente!

E largou um belo sorriso. Só ele, pois o resto da indiada não entendia nada de civilização, só entendeu a parte do capungo deatrás da casa, e da contagem da familia. Mas deu de ombros, e continuaram, todos, no que faziam de antemão.

- Povo já tem de chega. Falta só um idioma!

Mas credo! Pra que falar tão difícil naquela hora? Nem candidato ele era? Ou era? Não, não era.

Pediu que embruiásse uma rapadura, e uns caramélo pros piá, e saiu porta afora, matutando sobre o que havia ingenhado.

Ao chegar ao rancho, foi logo pendurando a cordeona num toco cravado na parede, e quis se mostrar pra muié, falando no novo idioma da civilização que ele criara. Ergueu o braço, cuspiu no canto da sala, e lascou:

- Xaramanguela tetrubaca, sapopenga xaramunhéca tralalá! (Eu te saúdo, fia da minha sogra! Que alegria1)

Pra sua surpresa, a patroa respondeu no mesmo tom:

- Vai tú, jaguara! Tu e tuas china, cachacêro!

Apolônio achou melhor não perguntar pela tradução. Ajuntou o pala, e saiu de fininho, como assobio de papudo, e foi dormir no paiol, naquela noite.






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