Saudade é aquele lugarzinho perdido no tempo, onde todos os vazios nos abraçam.
Publiquei, em dois dias, quatro textos, em um desabafo em serie, que descreve meus sentimentos pelo abandono existencial que senti, ao passar duas semanas na minha terra do coração. Foram palavras amargas e cheias de raízes, à volta de um axioma comum, chamado Gramado.
Não deveria ter sido surpresa que, em poucas horas, dezenas de manifestos, de pessoas que tem o mesmo sentimento, indo, algumas delas, às lágrimas, ao ler os textos, por se identificarem neste vazio de almas que sentimos, ao caminharmos pelos trechos, antes ladeados por janelas iluminadas e jardins floridos, hoje, por pedras, vidro, luminosos, e anúncios em inglês, de liquidações ou promoções comerciais.
Não é surpresa saber que há pessoas tímidas que tem medo de manifestar seus vazios, sob pena de represália e constrangimento, como se cuspisse no prato onde come. Não se trata disso. Não se trata de mágoa, ou revolta, mas apenas um vazio, um conjunto de ausências, um grito rouco que ecoa nas lembranças, as mesmas lembranças que produzem saudade, mas que nos passos que damos pelos caminhos que antes nos viram passar, resta apenas o vazio das passadas, ecoando um passado inerte e inexorável.
O Apocalipse, de um lado, é a palavra que prenuncia o fim de um tempo, por outro, traduz-se por "revelação" das coisas que hão de vir, ainda que conectadas com as coisas que já se foram. Da mesma forma, os tempos que deixamos escoar pelos dedos, como se fossem água ou |Mercúrio, são a esteira da vida que nos encaminham para o amanhã incerto, senão pela saudade que sentimos de nós próprios, uma auto comiseração, pena de nós mesmos, e em alguns, revolta.
Não se pode gerar revolta contra coisas, porque coisas são coisas, e ruas, casas, e até jardins, continuam sendo coisas. São, porém, as pessoas, as que largam coisas em nosso caminho, para que tropecemos nelas, e assim, de queda em queda, fortaleçamos nossas pernas, pelos calejados pés do Apocalipse de nossas lembranças.
Onde estão todos, é a pergunta. Eu os encontrei na virtual existência chamada Facebook. Mas continuam sendo figuras planas e sem perfume, senão pelas sensações que promovem ao encontro destas lembranças. Aqui estão todos. Aqui estamos todos. Virtuais, intangíveis, guardando palavras para que outros as repitam após a nossa morte.
O Apocalipse de nossas lembranças está ancorado no Gênesis de nossas esperanças. Um e outro fazem parte de nossa história, de nosso conteúdo, de nosso despertar e de nosso fenecer. O Gênesis de nossa saudade está abraçado com o Apocalipse de nossos sonhos, o entardecer dos prazeres que desacreditamos merecer. O derradeiro toque da trombeta que finaliza nossas alegrias.
Onde estão todos, perguntam os meus amigos. Onde estão vocês, pergunto eu, à eles. Onde estamos todos, que em lugar de levantarmos e caminharmos em direção aos abraços, nos esquivamos dos encontros, fugimos dos prazeres pequenos, como um café coado, um chá com limão, ou uma boa hora de prosa na varanda.
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