O Superintendente Laerte era um homem amável, e ao mesmo tempo firme. Era um pouco gordo, e caminhava com passos resolutos de quem era acostumado a exercer autoridade onde quer que estivesse. Seu óculos redondo, tipo casco de tartaruga viviam engordurados, o que o fazia constantemente limpá-los com um lenço de seda bordado com suas iniciais: LPR (Larte Perez Ramires). Grossas sobrancelhas emolduravam os olhos, e uma calva adentrava pelo crânio lustroso e branco. Sabia tratar com as pessoas, e as examinava com olhar curioso, sorrindo com o olhar, enquanto rabiscava à lábis em um bloco de papel. Escrevia nomes, anotava palavras, reforçava uma e outra letra ou palavra, e girava na cadeira com envelhecidos estofados de couro.
- Você sabe porque está aqui, não sabe, rapaz?
- Penso que sei, senhor! Recebi uma promoção e devo ser treinado para exercer a nova função. Estou certo, senhor?
Larte riu e olhou sobre os óculos engordurados.
- Passou perto, rapaz. Sim, você recebeu a promoção, e será treinado, mas não apenas para as vendas, como te falaram, e seu treinamento vai muito além disso. Você foi avaliado durante muito tempo, e seu comportamento, principalmente, pesou em seu favor, e você foi um dos selecionados...
- Há mais candidatos, senhor? - Perguntou, surpreso Benício.
-Esta informação deve ser confidencial, rapaz. Sim, há outros, mas não direi mais nada. Contente-se em ser um deles.
- Obrigado, senhor! Não perguntarei mais nada.
- Você será encaminhado à sala de reuniões agora. Vá. Conversaremos mais tarde.
Um corredor mal iluminado serpenteava a planta do pavilhão, com uma sequência de portas de madeira. Em cada porta, havia uma pequena placa indicativa, com apenas números. Ao final, na porta número doze, havia uma placa que dizia: Auditório B. Entraram ali. Era a sala de reuniões. Uma grande mesa retangular estava meticulosamente organizada, com dez cadeiras, sendo quatro cadeiras de cada lado, e uma cadeira em cada ponta da mesa. Em cada lugar, havia um livro com capa de couro aveludado preto, e na capa, uma estampa de um monograma, que se assemelhava ao alfabeto hebraico, a letra "Záin", equivalente à sétima letra em sequencia, Vav", que simboliza a comunicação. Por fim, o livro da ponta oposta, estampava em cor de prata, a letra hebraica Tzadik, que simboliza "Justo".
e que simboliza a "Sétima Dimensão. Era isso que explicava a nota de abertura do livro, logo à primeira página. O livro das pontas tinha a capa semelhante, mas na cor vermelha, e ambos tinham caracteres diferentes estampados. O livro da ponta frontal, em relação ao observador que entra, estampava a letra " Tzadic" - Justo.
Todas as cadeiras eram formais, lisas, sem ornamentos, e estavam cobertas por uma capa de veludo de cor azul intenso, que iam até o chão, como mantos refinados.
Um perfume de Sândalo tomava conta do ambiente, e um silêncio ensurdecia a sala, ouvindo-se apenas o ritmado compasso do coração acelerado de todos os convidados. Benício era um convidado, e embora estivesse preparado para absorver cada palavra do que ali seria ensinado, não era sem uma forte expectativa que procurava o seu lugar à mesa, onde pequeninas placas de metal gravado indicava onde cada um deles deveria assentar-se. Foi bem mais tarde que descobriram que seus lugares à mesa seguiam ordem alfabética e cronológica, Assim, Benício assentava-se ao lado de Alexander, e precedia Daniel, Francis, e assim por diante.
Um pequenino sino de prata anunciava a chegada do Presidente da corporação, ladeado pelo superintendente Laerte, e a assistente Noemi. Naturalmente que conto de maneira coloquial, mas naquele ambiente, eram: Digníssimo Senhor Presidente, Finéas de Albuquerque Medeiros; Senhor Laerte de Alvarenga Peixoto; e Senhorita Noemi Steinberg. Não eram apenas estes que eram tratados por esta formalidade. Também os convidados, eram tratados por: "Senhores", "Mui Dignos", etc.
- Cavalheiros. eminentes convidados, eu vos apresento o Digníssimo Senhor Doutor Finéas de Albuquerque Medeiros, Diretor geral da Corporação "Capello ", que fará a abertura os trabalhos. Todos de pé, por gentileza, para entoarmos o Hino da Pátria.
Nesse instante, entra um quarteto de cordas para tocar o hino, enquanto dos cantam. Benício canta também. Ainda bem que sabia o hino de memória.
Aquilo tudo, aquele ritual, era muito novo para Benício. Era muito novo para todos, devo dizer. E digo ainda que, se não estivesse aquilo acontecendo na sua frente, consigo mesmo, ele não poderia acreditar, se ouvisse contar. Era muito bizarro, às vezes escapulia um pensamento desse tipo, que era logo dissipado pelo senso ético e de gratidão que preenchia sua mente. Mas ele tinha que ser sincero consigo mesmo: Aquilo mais parecia um rito secreto do que uma reunião de treinamento para sua nova função. Parecia uma fraternidade, isso o fazia tremer, porém era um caminho sem volta, e não havia até aqui nenhum motivo para que de fato voltasse atrás, e também porque, parecia isso á ele, que retroceder seria fatal para seu emprego, o emprego de sua esposa, e para a sua permanência naquele lugar.
A sineta toca novamente, e a um gesto e mão de Noemi, todos se assentam. Em seguida, entram os copeiros, elegantemente uniformizados, com bandejas, travessa e taças, e um a um, recebem seus pratos, talheres, copos, e uma refeição à base de vegetais, saborosamente perfumados, começa a ser servida, um a um. O Presidente ergue as mãos, faz uma prece, e deseja bom a petite à todos, que começam a devorar os alimentos comandados pela gula, uma vez que recém levantaram do refeitório, onde tomaram o desjejum, como faziam todos os dias, com exceção da sala onde comeram, que era isolada do grande salão de refeições dos empregados da fábrica. A comida, porém, era a mesma, de boa qualidade.
Apenas Benício não comia nada. Delicadamente tomou um suco de laranja que fora servido, e observava à todos, tentando entender o sentido do que estava acontecendo. Tinha perguntas, que não ousava fazê-las, senão aos seus próprios pensamentos:
- Qual a razão daquele ritual?
- Por que foram convidados a comer uma segunda vez, se haviam saciado a fome poucos minutos antes:
- Quem eram aquelas pessoas, e por que era necessária aquela pompa toda?
Seus pensamentos foram cortados ao meio pela voz de Noemi, que agradece pela presença de todos, e declara encerrada a reunião. Todos foram dispensados para voltarem às suas casas, e retornarem à fábrica no dia seguinte.
- Não esqueçam de apanharem os livros à sua frente, e ao lado há um estojo com uma caneta-tinteiro para cada um. A tarefa será escreverem três páginas no livro, com páginas em branco, e trazê-las consigo no dia seguinte. Sugerimos que caminhem pelos lugares onde se sintam bem, e escrevam suas impressões sobre o que irão encontrar. Bom dia à todos!
Continua.......
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