AD SENSE

sábado, 18 de março de 2017

Nadir, meu Biscuit de Porcelana



Já escrevi e publiquei muitas breves biografias. Nenhuma de desafeto. Desafeto não é para ser lembrado de forma negativa, e caso nada de bom tenha para ser lembrado, melhor deixar que o esquecimento mesmo o guarde em suas lembranças. Então, lembranças devem ser boas e de quem temos admiração.

É mais comum lembrar-nos de quem já não pode mais agradecer pelo que escrevemos. Então,  quero escrever para quem ainda é capaz de sorrir e até se defender de algo que venhamos a dizer pelo involuntário desejo de dourar a realeza mais que o rei. Assim escrevo sobre quem merece minhas boas lembranças: Meu bibelô, meu biscuít de porcelana, minha princesa de olhinhos amendoados, e a minha paixão por apenas trinta e oito anos. "Três-oitão" mesmo, sim senhor. Arma de peso, porque manter uma paixão no mesmo calibre por tanto tempo, é tarefa de profissional no amor.

Não. Não sou piegas, nem douro pílula. Não estou afirmando que durante trinta e oito anos foram pétalas de rosas que alcatifaram nossos caminhos. Não foi assim, Muitos espinhos e desafios a cada dia. A cada dia, novos leões mordendo os ânimos, e a cada dia o problema do dia. Humor, muitas vezes, péssimo, meu e dela.E do mundo contra nós. E mesmo assim, trinta e oito anos, sim senhor, ao lado de minha guerreirinha impoluta, digna, linda, e cheia de opinião.

Eu a conheci num baile de Kerb (festa alemã comemorativa da igreja luterana local). Estava no lado oposto do salão, lotado. Olhando pra mim. E eu pra ela. Falei pro amigo que estava comigo:
-"olha lá a menina com quem eu vou me casar!"
- "Tu é doido?" Respondeu-me rispidamente. Olha o tamanho do alemão ao lado dela! (O cara media 2,05 m, literalmente, era seu primo, que a acompanhava, além da irmã, grávida, e do cunhado. Bem coisa de Kerb mesmo).
- "Já vi, e calculei tudo!" Respondi, gesticulando. "Olha o tamanho da caneca de chopp na frente dele, recém servida. E não é a primeira! Esse cara vai ter que mijar aquele chopp em algum momento!"

Eu estava certo. Pacientemente esperei, sem perdê-la de vista, e percebendo que o mesmo acontecia da parte de lá. Até trocava de lugar para testar se era comigo mesmo. Era! Valia à pena o risco, pois naquele salão eram contumazes as brigas entre gramadenses e os locais. E eu nunca briguei na vida, então, uma cadeirada mal direcionada e seria o meu fim. Mas ela valia à pena até mesmo uma cadeirada mal direcionada. Esperei. E num piscar de olhos, olhei para a mesa dela e, BINGO! O alemão foi mijar o chopp, que à esta altura eu já considerava um aliado na minha estratégia. 

Nem esperei mais nada. Voei para a direção dela, e em um minuto apenas, estávamos dançando, ou melhor dizendo, ela dançava, e eu pisoteava os pés dela e babava em cima do ombro da delicada criaturinha cheirosa. Cinco longo minutos se passaram até que eu tivesse coragem para declarar meu eterno e incondicional amor à ela, e convidá-la a namorar comigo.

- "Sim!" Foi a resposta.
- "Você fala sério?"
- " Sim, falo! E você não fala serio?"
- "Seríssimo! Estamos namorando então?"

- "Estamos!"

Olho respeitosamente e pergunto:
- "A propósito, qual seu nome?"

Vou encurtar, porque vinte dias depois noivamos. Tres meses depois (deste encontro), casamos. E lá se foram trinta e oito anos atrás. Casamos ali, na Sociedade Esportiva e Recreativa Tiro ao Noivo, com toda pompa e circunstância de um saboroso churrasco, que à época ainda era confiável, e o Tony Ramos era apenas um galã de novela, e não de novilha. 

Trinta e oito anos, e tenho que confessar que casei por puro interesse. E continuo interessado. Tive lucro com a pessoa. Lucrei trinta e oito anos de cuidados com minha saúde, bem estar, meu trabalho, mas sobretudo, lucrei três lindos rebentos, que por sua vez me deram de lucro até aqui quatro criaturinhas que me desmoronam de emoção em cada abraço que recebo. Então, escrever uma breve biografia de uma pessoa íntegra e competente, é uma tarefa não apenas prazerosa, quanto necessária, e mesmo que piegas seja, pieguismo é minha ferramenta de demonstrar gratidão.

Por que estou escrevendo isso exatamente hoje, se não é aniversário dela, e nosso aniversário de casamento já passou? Porque para dizer que sou grato, orgulhoso e feliz por ter esperado aquele alemão enorme mijar aquele chopp, não preciso de datas. Sou grato à condição diurética do chopp, isso tenho que reconhecer. Apenas então lembrar o quanto sou amado por esta pessoa tão linda.



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