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quinta-feira, 2 de março de 2017

O Primo Rico e o Primo Pobre



Nos anos 60 e 70 havia um quadro de humor na TV Globo, com os atores Brandão Filho e Paulo Gracindo., onde em situações hilariantes, um primo miserável (Brandão Filho), faz uma visita ao primo milionário (Paulo Gracindo).

O pobre é incisivo em expor sua debilidade, suas necessidades, sua miséria, enquanto o rico, cego pelo brilho da fortuna, só consegue entender aquilo que sua mente tem a oferecer: o deslumbramento.

O que parece uma grosseria, aos olhos do expectador, onde o rico demonstra insensibilidade diante do assédio nada sutil do pobre, na realidade mostra uma inteligente crítica da condição humana diante do hedonismo da glória, onde o conceito de necessidades de um e de outro é distanciado por uma densa espuma de valores, que abafa o som da voz do suplicante miserável, ao atravessar esta cortina, e ao chegar aos ouvidos do deslumbrado primo, soa como um derramamento de elogios à sua própria fortuna e modo de viver.

Interessante como o rico fala de lagosta, e a devora diante do pobre, que saliva e brilha o olhar, mas que no momento derradeiro de satisfazer-lhe a fome, o rico lembra que está de dieta, e impõe ao pobre suplicante aquilo que o impede de devorar a iguaria. E o pobre se resigna à sua condição miserável, enquanto passeia pelo palácio do rico, que também o impede de assentar-se em seus luxuosos sofás, porque suas roupas estão sujas.

Era um quadro de humor, mas que retrata tão bem a Natureza do Ser Humano. Retrata com tanta sabedoria o ângulo de visão de um e  outro diante de suas necessidades pessoais. O primo rico, deslumbra-se em admirar e apresentar ao pobre a sua nova limusine dourada, enquanto o olhar do pobre está atento à geladeira do rico.

(Continua após o comercial)

Nós somos todos os dias Primo Rico e Primo Pobre, quando desnudamos nossas ansiedades em busca de soluções para nossos problemas, nossos desafios, e o fazemos através da humilhante condição de vítimas de nossa pequenez, enquanto focamos na geladeira, em lugar de focarmos na limusine, e isto fazemos, porque damos mais ouvidos para nosso estômago do que para nosso cérebro.

Somos Primo Pobre quando deitamos no Primo Rico a responsabilidade de atender nossos fracassos, enquanto nós próprios não tivemos capacidade de acreditar nos nossos sucessos.

Somos Primo Pobre mendigando ao Primo Rico um pouco da coragem que precisamos para descer um degrau abaixo e nos humilharmos completamente, em lugar de fortalecermos nossas pernas para que os degraus do nosso próprio sucesso sejam propulsores de nossas próprias conquistas.

Somos Primo Pobre quando a autocomiseração, piedade de nós mesmos, excede a autodeterminação, e quando ambas se confundem no compasso trôpego de nossas ansiedades quando fitamos a geladeira, enquanto o Primo Rico se deslumbra com a limusine com cheiro de nova.

Somos também o primo Rico, quando aqueles que nos buscam, e o fazem porque direcionam alguma confiança em nossa capacidade de supri-los, mas ainda assim nosso coração descompassa mais acelerado para nossa limusine, em lugar de ouvir o ronco vazio de seu estômago quando fita nossa geladeira.

Somos Primo Rico que desdenha o primo Pobre quando necessitamos tê-lo ao nosso alcance para que nosso ego não se definhe pela nossa medíocre ambição, mas que nos locupletamos quando seus gemidos ecoam pelo vazio de nosso caráter, que vê na pobreza apenas um espetáculo deprimente, e não uma oportunidade de enaltecermos a razão pela qual nos tornamos ricos.

Diz o Talmude que somos "Fiéis Depositários da fortuna de D's", e que como tal, estamos sujeitos à demissão por justa causa ao menor deslize, e não  pode haver maior deslize a um Fiel Depositário do que não corresponder à confiança nele depositada na guarda dos bens alheios.

O infiel depositário torna-se iníquo quando enrijece seu olhar em direção à limusine, quando ao seu lado há um Primo Pobre ansioso para que abra aquela geladeira e disponha a mesa para uma ceia com um irmão.

Que primo sou eu? Pobre, que sonho com o banquete da geladeira, ou rico, que me farto com a vaidosa paixão pelo brilho da limusine, que nada faz senão levar-me para longe de mim mesmo, e do pobre que me molesta, cobiçando a minha geladeira?


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